sábado, 3 de janeiro de 2009

Roubou dez carros

O nome dele não pode aparecer no jornal, nem foto, se muito, as iniciais. Ele tem apenas 12 anos e foi preso dez vezes por roubo de carro. Não consta que tenha matado ou esquartejado alguém e nem que tenha roubado “apenas” dez veículos. A cada roubo, geralmente com outros comparsas “menores” – neste último roubo o colega menor tem 17 anos –  ou adultos, um familiar aparece na delegacia e o leva para “casa” como se fosse um menino traquino que quebrou a vidraça da vizinha.

Este garoto é um símbolo da falência do Estado e todo seu roto aparato de cuidado de menores infratores, do Estatuto da Criança e do Adolescente. Da família dele nem se fala.

É urgentíssimo que se discuta com seriedade a menoridade penal, a reforma do ECA, e que a sociedade cobre do Estado um sistema mais eficaz de recuperação, cuidado, o que seja, dos menores que o eufemismo chama de infratores.

Abaixo a notícia veiculada na Folha, em 03/01/09

Garoto de 12 anos é flagrado pela décima vez com carro furtado em SP

RACHEL AÑÓN
da
 Agência Folha

Um adolescente de 12 anos vai parar pela décima vez na delegacia após ser detido com um carro furtado na avenida Robert Kennedy, região da Capela do Socorro, zona sul de São Paulo.

Acompanhado de outro adolescente de 17 anos, ele estava em um Ford Verona branco, furtado horas antes na esquina das avenidas Interlagos e Nossa Senhora do Sabará, na mesma região.

Após furarem um bloqueio, começou a perseguição policial. Os adolescentes, no entanto, pararam apenas quando o carro colidiu em um veículo da Polícia Militar.

No 102º Distrito Policial, o pai dele, de 63 anos, compareceu e levou o filho pra casa. O colega também foi liberado.


sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

Deus

O texto abaixo é do filósofo Luiz Felipe Pondé que escreve na Folha de São Paulo às segundas-feiras no caderno Ilustrada. Foi publicado dia 29/12/08. A leitura vale a pena.

NATAL E fim de ano, Deus está no ar, em meio à fúria do consumo e das expectativas.Mas antes de falar coisa séria, uma palavrinha: adoro a inércia do fim de ano. As pessoas ficam preguiçosas, sem pressa. Escorregam lentamente para a praia ou o campo, ou para a cidade que se esvazia. Época de sexo fácil e solidão em grandes quantidades. O que antes era eficácia e ambição perde a forma e vira imprecisão, sono, bebida e comida, horas a fio sem objetivo. Este colunista que vos fala está com o que a sabedoria popular chama de "uma gripe do cão".
A cabeça pesando quilos, febre, tosse, espirros, enfim, com todas as vantagens que uma gripe nos dá: contemplação do teto e das paredes, noites mal dormidas, o direito honradamente adquirido de fazer nada e de demandar tudo da mulher apaixonada pelo doente. Um presente de Natal.
A doença não implica necessariamente incapacidade. Pelo contrário, a desordem fisiológica pode abrir portas para percepções incomuns. As religiões antigas bem o sabem, com seus jejuns, poções "mágicas", mantras, orações intermináveis, música, vigílias no deserto e na solidão. Tudo visando estados alterados de consciência. Há uma dimensão da vida que está distante da banalidade cotidiana, e isso nada tem a ver com essa coisa barata chamada "espiritualidade quântica".
Tem gente que jura que Deus morreu. Tentativas de matar Deus foram feitas, e por gente muito capaz. Nietzsche tentou nos convencer que quem crê em Deus tem medo da vida. Ressentimento é a palavra. O horror cósmico faria de nós covardes. E mais: Deus nos tiraria o Eros, o desejo pela vida. Mas você pode ser um brocha diante da vida e ser ateu. Freud quis provar que crer em Deus revela o retardado assustado que vive no adulto. Mas Freud bem sabia que ateus e crentes retardados desfilam pelas ruas em busca dessa coisa superestimada chamada "felicidade". Marx jurou que ganham dinheiro com a fé em Deus. Mas se ganha dinheiro com tudo, amor, sexo, ódio, arte, basta dar sorte, enganar os outros ou trabalhar com afinco.
Infelizmente, há muita teologia que ajuda a matar Deus. Deus me livre da teologia de vanguarda. Se, na arte, a "vanguarda" serviu pra justificar quem não sabia pintar, escrever ou fazer filmes, na teologia, serviu para fazer de Jesus um personagem de novela das oito. Nada contra a teologia, ao contrário, julgo-a uma disciplina essencial para nos ensinar a ver o invisível. Mas, como disse Heine em relação aos teólogos de sua época, "só se é traído pelos seus".
Fernando Pessoa, em seu desassossego, diz que não aderiu ao culto da Humanidade, essa mania dos modernos, porque sendo ela, a humanidade, nada além do que uma espécie animal, adorá-la é adorar um conjunto de corpos humanos com cabeça de bicho. Portanto, uma reles forma de paganismo. Dizia o poeta que sendo Deus improvável, adorá-lo é sempre menos ridículo.Outro grande escritor português disse recentemente que a Bíblia é um livro ruim e que não deve ser lido. Bobagens desse tipo, cheias de glamour, são repetidas ao sabor da ignorância comum. Mas devemos ter paciência com ele, afinal ninguém precisa entender de tudo.
Mesmo em pessoas inteligentes, Deus se mistura com todo tipo de trauma infantil ou raiva do pai ou da mãe ou do patrão.
Muita gente grande fica com cara de criança brava e mal amada quando se fala de Deus. No fundo é a velha carência humana gritando contra a indiferença cósmica se revelando em "crítica a Deus" e não em "fé em Deus", como diriam os nietzschianos de plantão. Outro erro comum: Deus faz os homens matarem. Mentira: matamos porque gostamos de matar. O século 20 provou de modo cansativo que Deus não é necessário para matarmos milhares de pessoas, basta uma "boa causa".
A teologia feminista diz que "a Deusa" existe para punir o patriarcalismo. A teologia bicha (Queer Theology) se pergunta: por que Jesus viveu entre rapazes, hein? Alguns latino-americanos vêem Nele um primeiro Che, hippies viam um primeiro Lennon, outros, um consultor de sucesso financeiro. Ufólogos espíritas dizem ser Ele um extraterrestre carinhoso.Prefiro o cristianismo antigo (prefiro sempre as religiões velhas). Um Deus que sente dor e morre por amor a quem não merece é um maravilhoso escândalo ético. O Cristo antigo é um clássico. Melhor do que essas invenções da indústria teológica de vanguarda, feitas para o consumo moderno.

quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

Lucidez

É preciso abandonar a lucidez - o tipo de lucidez que o ego busca, o tipo de lucidez que me consola e permite que eu pense que tudo o que realmente sou é aquilo que penso que sou, e isso é tudo o que ela pode produzir.

Trecho do livro "Um vislumbre de Jesus - em busca da cura do ódio a si mesmo" - Brennan Manning

Fazer promessas é fácil, difícil é cumpri-las

O texto abaixo foi publicado na Página Gospel do Jornal Pequeno - 29/12/2008

Sabemos mais ou menos o enredo. Final de ano, fala-se quase sempre em renovação, novos planos, objetivos a serem traçados para o ano seguinte daí a poucos dias. Isso se os muitos rega-bofes de que participamos nos deixam pensar um pouco. Não lembro de quase nada que prometi ano passado. Nem tenho o hábito de prometer.
De fato, a maioria de nós que entra nesta onda de prometer, está fadada a quebrar as promessas. De modo que uma promessa de fim de ano vale tanto quanto um centavo furado. Não porque sejamos descompromissados, mentirosos contumazes, mas porque o fazemos por fazer, nem sequer um balanço do que passou foi feito, como queremos já nos comprometer a construir?

O problema, penso eu, envolve algumas questões. A gente se conhece pouco, ou melhor, até se conhece, sabemos que não faremos aquilo com que nos comprometemos, mas como pega bem, a aprovação dos circunstantes é unânime, então acreditamos, embora lá no fundo você grite pra você mesmo: ei, não quero e não vou fazer nada disso.
Outra questão é que a promessa que começa datada ou postergada, tende a não se realizar. É o nosso caso: faremos isso e aquilo, mas depois das festas que no caso de muitos é lá, depois da sexta-feira da paixão. Certo, promessa refere-se a algo num futuro, em data xis ou mais menos ao seu redor. Concordo. Mas promessa também tem que ter raiz no presente quando é asseverada. Tem que ver com o indivíduo, seu contexto, sua capacidade, suas posses, suas ações naquele momento. Raros são os casos em que, aparentemente, do nada surge uma idéia e nós dizemos: farei isso ano que vem.
Promessa (fala e pensamento) está intimamente ligada ao corpo. Palavra e ato trabalham no sucesso do projeto. Não são arrancados do vazio. É como se cada feito nosso precisasse de uma gestação. Excetuem-se os rompantes diante de um imprevisto. O resto precisa funcionar assim. O falado, conectado com o real, com o conhecimento de si mesmo e de sua realidade, traz à existência aquilo que foi apenas plano. Não é o verbalizar a esmo que faz acontecer, mas um processo que transforma a energia do que foi dito em ação. A idéia transmuda-se em feixes de músculos, em tecidos do coração, em alvéolos do pulmão, em sangue a irrigar cada célula.
A parábola de Jesus sobre construir é útil aqui. Incrível é que ele se refere a segui-Lo, porque até aí há o que dimensionar. Primeiro, que o prêmio não está disponível em moeda sonante. Segundo, possivelmente não há qualquer reconhecimento, às vezes perseguição, e terceiro, os valores pelos quais a pessoa deverá se pautar estarão, na maior parte do tempo, em confronto com o mundo.
Ele disse assim: “De
fato, se alguém de vocês quer construir uma torre, será que não vai primeiro sentar-se e calcular os gastos, para ver se tem o suficiente para terminar? Caso contrário, lançará o alicerce e não será capaz de acabar. E todos os que virem isso, começarão a caçoar, dizendo: ‘Esse homem começou a construir e não foi capaz de acabar!’”. (Lc 14.28-31 – EP)
O não cumprimento de promessas leva a um círculo vicioso ao qual muitos se acomodam. É para ser aceito? É para ser aprovado pelos demais? É para se livrar de um problema ou de uma saia justa? Pois digam ao povo que farei. Isso no aspecto externo. No interno leva à lassidão e à frustração, se ainda nos resta algo de brio. O tempo tratará de transformar este comportamento numa fé ao contrário em si mesmo. Um pessimista. Ah, não dá. Não consigo. Já tentei. Eu sou assim.
Nenhuma promessa deve ser derrogada, mesmo aquelas que se referem ao vulgar compromisso de perder uns quilinhos a mais, sempre dito que foram nas festas e não ao longo do ano inteiro que foram acumulados. Mas energia para realizar pede sempre mais que um bom equacionamento psicológico, uma capacidade de planejar, pede fé que pressupõe a ajuda de Deus e isto envolve outra esfera da vida. Não é o caso de delegar a Deus aquilo que se deve fazer, mas pedir que Ele seja o companheiro na sua construção.
Tomo aqui emprestado uma fala de Paulo que em carta aos crentes em Corinto, atribuía seus feitos e falas a Deus: “E é por intermédio de Cristo que temos tal confiança em Deus; não que, por nós mesmos, sejamos capazes de pensar alguma coisa, como se partisse de nós; pelo contrário, a nossa suficiência vem de Deus...” (2 Co 3.4, 5 – ARA)
Ele quer dizer que Deus foi sua força motivadora, sua inspiração. Aqueles que conhecem um pouco a história de seu ministério, sabem que foi como diz em outra passagem entre dores de parto (Gl 4.19) que ele cumpriu sua obra de anunciar o Reino de Deus entre as gentes. Uma promessa descuidada não resistiria a tais provações, como em qualquer outra área, não resistirá à provação do tempo, da perseverança, da derrota. Deus é, portanto, imprescindível.
Jesus complementa a parábola anterior com outra semelhante. Fala de um rei que se prepara para a guerra. Ele percebe que seu exército é menor, então envia embaixadores para negociar a paz. Isso nos fala de que nenhum plano é definitivo. Sempre haverá surpresas. É preciso deixar espaço para o inesperado e admiti-lo como parte do projeto, embora não se saiba o que será, mas só o fato de se estar precavido, ajudará a enfrentá-lo.
A vida não é uma linha reta, nem tem a exatidão matemática que desejamos. É múltipla, cheia de curvas, ora deserto, ora floresta luxuriante, é diversa e é isso, afinal, que faz seu encanto. Faça planos, comprometa-se, há muito o que fazer, mas convide o Senhor Deus para fazer parte da aventura que é viver você. Não se preocupe, nada em você lhe surpreenderá, inclusive uma ou outra tentativa de desistir, pois é exatamente nesse momento que Ele fará diferença na sua vida.

Desejo a todos um ano feliz. Saúde e Paz sob a graça de Deus.

terça-feira, 30 de dezembro de 2008

Tempo relativo


Os cientistas deram ao agora moribundo 2008, mais um segundo de vida. Serão, portanto, 366 dias e 1 segundo. O que se faz com ou em um segundo? É menos que uma piscadela que leva 1,2 segundos.
Diante da morte iminente, de que valeria 1 seg a mais? No esporte ele tem utilidade e na física de precisão. Na fórmula 1. Massa perdeu o campeonato pela ninharia de 38 segundos. Quer dizer, ele foi campeão mundial por este tempo. E nas corridas, sejam quais forem, as classificações são por diferença de milissegundos, mas a vida não escorre nos interstícios do tempo.
Os físicos acrescentaram este mísero segundo para coordenar os dois sistemas de medida cronológica que existem hoje; um leva em conta a rotação da Terra; o outro toma como base relógios atômicos. Já imaginou se pudéssemos por ou tirar o tempo das experiências que vivêssemos?
A vida, para nós, que a vemos noutra velocidade, um segundo é pouquíssimo. Somos lentos e precisamos de um tempo macro. Pesado em quilos, talvez toneladas. Só sabemos e percebemos a velocidade do tempo quando envelhecemos, mas fisicamente estaremos ainda mais lentos. Será que a tração gravitacional da morte causa estas torções de percepção?
A vida, diz-se, pode mudar em um segundo. Nada! Leva um tempão para mudar porque é preciso construir. Destruir a vida, sim, leva um segundo.
O tempo, disse Einstein (se não disse, deveria) é também relativo. Depende do que se está vivendo, da posição do vivente . Experiências ruins, estar ao lado de pessoas malas, viagem de ida, a fila em que se está, dão a sensação de um tempo sólido. Não desce redondo de jeito nenhum.
Experiências boas, aquela conversa com aquela pessoa, a fila do lado, viagem de volta. Voam. Um segundo? São mais rápidas.E se um gênio lhe desse um segundo a mais de vida? Você tem um segundo a mais de vida. Quê? Acabou.

segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Você não é nem o que aparenta


Ver um strip está ao alcance de qualquer um onde quer que esteja. Strippers, apenas munidas de um computador, câmera e um acesso banda larga, vendem shows via internete. Algumas chegam a ganhar R$2.500,00 por mês. É só mais um capítulo da transformação das relações neste mundo virtualizado.
A AIDS, dizem, em seu auge, modificou as relações. Sexuais, por suposto. Incentivou o vouyerismo, o fetiche, que explica a substituição do desejo pelo órgão sexual por um objeto. O que se diz, bem longe da moral cristã que resiste como uma curiosidade estranha a este mundo de todas as permissões, é que este tipo de prática, desde que controlada, é normal, até saudável.
Isso lembra algum tipo de dissociação do sujeito em farelos não necessariamente interconectáveis, daí porque alguns conseguem viver vidas paralelas, cada qual com seu personagem que os novos tempos insistem em expor à luz do dia, como novas formas de explorar as multifacetadas possibilidades da existência, mas que no fundo é só um desarranjo do ser.
A internete permitiu a realização destes desejos de forma real, porém, não sólida. Quero dizer, as emoções e sensações por elas produzidas substituem com alguma vantagem a relação física e são vívidas tanto quanto a vida no tempo. Não poucos se perdem neste mundo, presos à fantasia de onipotência. Tornam-se adictos do lugar onde tudo é possível, inclusive eles deixarem de ser eles mesmos.
Um toque num botão e a vida segue, encontra, realiza, morre, mas revive em seguida. Fecha, abre, ama, descarta. Um clique e uma relação termina sem qualquer responsabilidade posterior. Ligar no dia seguinte, por exemplo. Livra a pessoa do trânsito caótico, dos maus humores, das tpms, dos maus dias da pessoa com quem se relacionou. Não há maus cheiros e se houvessem, basta configurar um cheiro de lavanda e pronto.
A questão também nos coloca diante daquilo em que se transforma o ser, enquanto indivíduo. Isso porque, possivelmente, a imagem vista numa tela de MSN ou similar, pode ser – e acontece muito – uma contrafação bem forjada ou um alter ego de alguém que, no mundo dito real, deve ser escondido por vergonha, pela feiúra, pelo status social sofrível. Ou por outra, basta um avatar no Second Life que pelo nome já se vê, é auto-explicativo.
Desta esbórnia surge um sujeito sem identidade, ou ele é sempre precário, num momento, sempre mimetizado em fantasias, agarrado a alguma coisa do mercado ou da moda que é quem, de fato, diz quem ele é.

O sujeito de hoje é um narciso que varia ao sabor das ondulações do espelho, mas a filosofia corrente estimula esta indentidade personalizada que, para ser, entre tantos iguais, necessita alcançar novos níveis de estranheza no corpo, porque a mente continua a mesma, com sede de ser. Este novo homem e mulher é sempre experimental, customiza-se sob demanda, que nunca é sua, é de um outro, fantasmagórico pai ou mãe a quem eles nunca conseguem satisfazer.

Criação e evolução



Por volta dos 12 anos, eu ainda não tinha feito minha decisão por Jesus. Ia à igreja, que era um peso para mim. Não que não cresse, estava descobrindo mil coisas novas e a igreja, ao que parecia, condenava todas elas sob o rótulo de “coisas do mundo”. Ser cristão ou evangélico, protestante, era igual a NÃO fazer isso nem aquilo. A não ir a praticamente nenhum lugar. Praia estava definitivamente vetada. Era lugar de concupiscência dos olhos, diziam. Esporte também era pecado porque mexia com as emoções e as pessoas tendiam a radicalizar, dizer palavrões e ademais, melhor, segundo Paulo, era dedicar-se às coisas do espírito, pois o esporte para nada aproveita. A coroa ou prêmio ou taça do esporte é corruptível, o crente busca a incorruptível (1 Co 9.25). Quer dizer, para um zumbi, os convertidos estavam muito bem.
Na escola, o que aprendia em biologia, se não ia de encontro da Bíblia, tampouco ajudava, menos ainda quando um professor de escola bíblica dizia que todos os fósseis eram uma mentira inventada pelos inimigos do cristianismo. Protestei, disse que havia provas em todos os lugares do mundo. Os dinossauros existiram mesmo asseverei para espanto dos colegas e do professor que ficou numa sinuca. Como conciliar com o Gênesis que apenas mencionava animais “modernos”? Ele se recusou a aceitar e encerrou a conversa com uma censura velada a mim.

Admitir os dinossauros, para aquele professor, seria negar a Bíblia, ou quem sabe, algo ainda pior, negar Deus. O que tem Deus a ver com os dinossauros? A rigor, nada, e tem tudo a ver. A ciência não sabe responder e está muito longe de fazê-lo, se é que algum dia o fará: de onde veio a matéria? Antes do ponto minúsculo inicial, um nada, o que era? A Bíblia afirma que antes do princípio era Deus e que Ele é Deus que vivifica os mortos e chama à existência as coisas que não existem. (Rm 417) O problema é que os literalistas têm dificuldade no processo porque a linguagem bíblica não é suficientemente clara e nem tinha a pretensão de sê-lo, afinal seu objetivo é contar uma história em que Deus é o protagonista, o homem, coadjuvante, e a terra o cenário.

Tomar a Bíblia ao pé da letra sem dela nada ou pouco conhecer é um perigo e uma insensatez. Do mesmo modo, afirmar a suprema verdade da ciência contra tudo o mais, diante de tantas perguntas sem resposta, é uma temeridade.

Cada macaco no seu galho, mas nem a ciência honesta nega ou agride a Bíblia e nem esta nega aquela. Elas falam de suas áreas de interesse em linguagem que lhes são peculiares, harmonizá-las pode ser uma idéia, mas com muito respeito.

Exploro o tema criacionismo versus evolução não por cisma, mas inspirado na entrevista do pastor Tim Keller, de Nova York, dada à revista Cristianismo Hoje.

domingo, 28 de dezembro de 2008

Mosquito X9


A polícia da Finlândia acredita ter encontrado o ladrão de um carro graças a uma amostra de DNA coletada de um mosquito que estava dentro do veículo.
Segundo a agência de notícias France Presse, o carro foi roubado em junho passado em Lapua, a cerca de 380 km ao norte de Helsinki, e encontrado pouco depois a 25 km de distância, perto de uma estação ferroviária na cidade de Seinaejoki.
Ao examinar o carro, os policias acharam o mosquito e concluíram que ele havia picado alguém pouco antes. O DNA encontrado correspondia a uma amostra registrada nos arquivos da polícia.

Fonte: BBC Brasil

Essas coisas só acontecem comigo, lastimava-se, enquanto se escorava num canto da cela entulhada de gente. O cheiro azedo de vômito dormido do ambiente impregnava até o tutano, sem contar as olhadas sinistras que lhe davam os companheiros indesejados. A história porque Adrovaldo foi parar na cadeia começa longe, do outro lado mundo, na fria Escandinávia. Um incidente de um roubo de carro levou a polícia de lá à descoberta do autor pela análise do sangue no estômago de um pernilongo que se alojara discretamente entre o estofado e que, faminto, resolveu refestelar-se no azarado ladrão. Yes, na Finlândia tem ladrões e mosquitos, embora a polícia passe mais tempo coçando as partes íntimas, pois o país é figurinha carimbada no campeonato mundial de honestidade no ranking da organização Transparency International.
Nosso belo país, como é sabido, naquele campeonato internacional de honestidade, é o equivalente a um time boliviano de terceira de divisão ou um Vasco, se você preferir. Mas as forças públicas de repressão, aos trancos e barrancos, ensaiam combater esta característica, digamos, filogenética do brasileiro médio. Taí a escapulida de alguns voluntários em Santa Catarina que não me deixa mentir.
Um dirigente policial verde-e-amarelo, mais abnegado que o costume, descobriu que a Finlândia desenvolvera uma técnica de extrair DNA do sangue deglutido por muriçocas como forma de identificar criminosos. Imagine se isso não é o sumo da tecnologia, de ter tempo para pensar em coisas inusitadas de uma polícia dessas? Pois bem, nosso policial entrou em contato com este país de características co-irmãs dos brasileiros pensando lá consigo que isso seria a descoberta da roda. Vejam se não tinha razão. O que será que tem em qualquer lugar deste país, provoca verdadeiras orgias de cama, abala regiões inteiras e no verão está sempre protagonizando o noticiário? Sua eminência, o mosquito, ou carapanã, ou muriçoca, inseto díptero da majestosa família dos culicídeos.
Os filandeses prontamente repassaram a técnica à polícia brasileira que em entrevista espetacular, dizia que esta seria mais uma arma no arsenal de combate à bandidagem. Mas nestas coisas tem sempre um advogado do diabo ou um repórter espertinho, um estraga prazeres que gosta de fazer perguntas cabulosas. O brioso policial, perguntado como é que saberia que um mosquito específico teria sugado o sangue de um acusado, se saiu com esta. Antes mesmo do contato com os agentes nórdicos, brasileiros já haviam descoberto, inclusive foram premiados pelo Ignobel, linhagens de mosquitos que tinham preferência por bandidos, no que os transformavam em policiais em miniatura, embora a maioria das espécies, destaque para os Culex, Aedes, Anopheles, sejam iguais a mafiosos da Cosa Nostra, tal o mau caráter deles. Alguns chegavam, descobriram, a vomitar para não entregar seu mal feito e o malfeitor. Enfim, bastava escolher o mosquito com aquelas características e pronto, uma rápida punção e o meliante iria para a cadeia. Inclusive esta técnica, aceleraria processos engaiolando os malandros rapidamente. É tipo DNA paterno, finalizou o empertigado policial, descobriu, acabou-se, é sustentar o bruguelo, acrescentou para diversão dos presentes.
E o acusado preso, delegado? Não há dúvida, o resultado é cem por cento, ele estava no local do crime. Nossa testemunha, o mosquito, não mente, quero dizer, o estômago dele não pode mentir. Obrigado. Saiu.Mas voltemos a Adrovaldo. Ali, preso, teve tempo para especular. E se eu dissesse que apenas peguei carona no carro? A idéia cresceu e ele pediu para falar com o delegado. Doutor, é muito simples, sou inocente. Eu apenas peguei carona no carro, que não sabia ser roubado. Pois bem, quem lhe deu carona. O Cruzanildo. Sim, mas não há sangue dele no mosquito, só o seu. Como é que o senhor explica isso? Ah, seu delegado, desde pequenininho eu tenho o sangue doce.

Texto publicado na Coluna Eudes Alencar - Jornal Pequeno - 28/12/2008