sábado, 26 de maio de 2012

O contador de moscas


Os banheiros públicos de Pequim poderão ter somente duas moscas cada, de acordo com novas regras aprovadas pela prefeitura da capital da China.
A regra curiosa faz parte de um novo esforço do governo local para melhorar as condições de limpeza das instalações que, embora estejam presentes em grande número, são alvo de críticas pelas más condições de higiene.
Fonte: BBC Brasil (23 de maio de 2012)

Tudo começou quando li uma oferta de trabalho nos classificados, doutor. Pensei: o emprego é moleza. Me diga: o que pode ser mais simples que contar moscas? O emprego seguia um modelo chinês que, por suposto, pedia paciência oriental. Os chineses inventaram um monte de coisas, estiveram em baixa, mas agora estão com tudo. Foram eles, inclusive, que inventaram a arte de pegar moscas em pleno ar com aqueles pauzinhos de comer. Não, não precisa comer a mosca.
Eu deveria fazer uma ronda nos banheiros públicos e averiguar se havia moscas ou não na quantidade determinada. Mais que duas, eu capturaria o excesso com os tais pauzinhos. Ah, com um treino especial que recebi, deveria classificar os odores e marcar numa tabuleta com cores que ia do branco ao roxo. Não é tão ruim quanto parece. Digamos que me tornei, a exemplo dos enólogos, provadores de café e charutos, um avaliador de cheiros. Um perfumista ao contrário.
Uma equipe passava depois de mim e, pela marcação na tabuleta, eles colocariam odorizador na quantidade adequada para anular o mau cheiro. É verdade que o sucesso de tal trabalho depende de uma sincronia perfeita entre os contadores de moscas e avaliadores de cheiro e a equipe de desifecção odorífera. Com o tempo um se acostuma, eu só não sabia que perderia meu olfato. Doutor, aquilo é corrosivo, abriu um buraco na minha mucosa nasal, ó.
O salário? Eu achei que era justo no começo, até que me deparei com alguns problemas do negócio. Tenho assombrações até hoje. Há coisas que se encontra num vaso sanitário que custa acreditar que um ser humano o fez. Hoje acredito piamente que temos ets entre nós. Como resultado, visões me assaltam mesmo acordado, chego a sentir um choque que corre pela espinha.
E a disciplina militar da contagem? Nisto penei, doutor. As moscas, como o senhor sabe, são insetos rápidos como um raio. Eu contava uma, duas e logo elas se misturavam e eu já não sabia que aquela que porventura pousava, já havia sido contada ou não. Começava outra vez e logo elas se embaralhavam, hoje eu sei, de propósito, riam de mim, pousavam em meu nariz de galhofa. Teve uma mais ousada que entrou em minha boca, só que fui rápido e dei uma dentada na patife. O gosto não é bom, não senhor.
Como dizia. Até fiquei bom em capturar mosca com os palitos. Mas isto exige extrema destreza e concentração. Confesso que burlei meu trabalho, só às vezes, deixei mais de duas moscas por banheiro. Não foi por mal, era a pressão do trabalho. Depois eu não sabia qual delas deixar. A gente se apega. Sabendo que sou coração mole, algumas pousavam no meu ombro e como minipapagaios, limpavam as patinhas, roçavam a cabeça e me fitavam com aqueles milhões de olhinhos suplicantes. Mas havia aquelas que se amotinaram contra mim. Brigavam, entregavam umas as outras dizendo que a mosca tal vivia em mais de um banheiro. São traiçoeiras entre si, doutor, pior do que gente.
Ouvir a discussão delas era insuportável. Me pesava ter que decidir, especialmente depois de confuso com a contagem. Tentei estimar a quantidade, assim eu me livrava do problema, mas quem disse que deu certo. Eles, meus supervisores, por artes não sei como, sabiam que eu pegava este pequeno atalho. Eu sei que comprometia a qualidade do trabalho. Perguntei uma vez: por que não simplesmente matar as moscas com um veneno qualquer? Suprema ofensa. Eu estava atrapalhando a geração de empregos e ainda por cima poluindo o meio ambiente. E aqueles animais que usavam os banheiros e deixavam para trás aquelas monstruosidades inclassificáveis, eram o quê?
Hoje não posso ver moscas, que sinto uma compulsão para contá-las, perco horas nisso. Este vício já me levou a lixões – o senhor sabia que acabei encontrando amigas dos tempos do trabalho por lá – só para contar moscas. E os odores? Opa, doutor o senhor passou por um daqueles banheiros, reconheci agora. Desculpe. Doutor, eu tenho cura?

terça-feira, 22 de maio de 2012

Quando eu crescer eu quero ser pastor

"Tenho pastores que ganham entre R$ 4 mil e R$ 22 mil". (Silas Malafaia, em entrevista ao portal IG)
Reproduzo abaixo excelente charge do cartunista Alpino - Site Yahoo