sábado, 21 de março de 2015

A Marcha



Manhã de domingo ensolarada em São Luís. O tempo conspirava a favor.  Ao chegar à Litorânea e ver a multidão – um outro mar, mas este verde e amarelo –, senti meu coração bater mais forte. Revivi em segundos meus verdes anos e histórias de outras marchas em que, no frescor da juventude, acreditava que podia mudar o mundo. Não penso mais assim, por óbvio. Carrego comigo pretensões mais modestas. Modesto não quer dizer indiferença, apatia ou a incapacidade de se indignar. 
Ali estavam famílias inteiras – pais e filhos –, idosos, jovens caminhando num congraçamento poucas vezes visto em São Luís. Por estranho que possa parecer, havia alegria, mesmo para gritar palavras de ordem motivadas pela raiva que produziu o ludíbrio, a mentira deslavada de quem acha que qualquer manobra vale a pena para ganhar uma eleição. Ouso dizer que grande parte dos adultos ali presentes foi outrora, como eu, admiradores de um PT que talvez, de verdade, nunca existiu, posto que camuflado em nosso sonho, escamoteado por palavras como liberdade, democracia que era, nos anos 1980, uma criança que aprendia a andar em nosso país. Chocamos um ovo de serpente.
Espanta-me a tosca tentativa de desconstruir este movimento espontâneo, que colocou tantos nas ruas embalados por seu sagrado direito de manifestação e pela decepção que carregam. Ouço argumentos de bonecos de ventríloquo que dizem: elite branca. Eleitores inconformados. Ricos e cevados no bem-bom, mas também já se esculhamba a classe média. Ouço o som azedo de um tal Sibá que, delírio bolivariano, afirma que as marchas em todo o país tem o dedo da CIA. Um homem torpe e bizarro esse Sibá.
Eu não sou branco. Aceito qualquer resultado das urnas, desde que ganho no voto pela maioria que pensa diferente de mim. Sem enganos, sem mentiras, sem estelionato. Sem cinismo. Sem descaramento. Estou longe de ser rico. Sou classe média. Esta categoria sem direitos, sem bolsa-qualquer-coisa, sem cotas, extorquida por impostos e agora, é de pasmar, também sem direito de manifestação ou opinião, particularmente se discorda de que trapaça em eleição é errado. Se esperneio contra a corrupção que virou, no dizer de um delator, prática institucionalizada nos governos petistas. Se estrilo pela incompetência bruta, associada ao populismo mais tosco. Estão aí as contas de energia que não nos deixam mentir. Sou classe média que compro carro em incontáveis prestações a juros escorchantes. Tenho um teto sobre minha cabeça igualmente suado e com trinta anos para pagar.
Um qualquer diz que não se viu pobre nestas marchas. O curioso é que os pobres que viraram seu domínio exclusivo, mantidos a cabresto curto com as bolsas-miséria, não foram às ruas defender o governo na sua pantomima de sexta-feira. Sim, foram alguns, mas à custa de trocados, tubaína e, em São Paulo, pão com mortadela. Ainda assim reuniram quatro gatos pingados, avermelhados pela doutrina socialista que eles espreitam nos cantos escuros para impingir ao Brasil. Parafraseio seu lema: No pasarán!
Eis um contraste de cores brutal entre os dois momentos. Aquele qualquer um também disse que as pessoas têm que obedecer à ordem e sem violência – referia-se às marchas do domingo –, mesmo dizendo entre dentes a frase maldita em suas bocas: é da democracia. Repetem como psitacídeos enlouquecidos que, naturalmente, não sabem o que recitam. Para constar. Não houve um único incidente. Nem um vidro quebrado. Nem um saque.
As massas mstistas invadem prédios públicos, destroem propriedades privadas, atacam pessoas, se armam de paus e pedras, foices e facões, mas são só pobres requerendo direitos, dizem. Na boca do Lula, o MST é aquilo que só desconfiávamos, mas agora sabemos: uma milícia disposta a tudo e que se sustenta com dinheiro dos nossos impostos.
Eles continuarão negando sua incúria boçal. Eles se mostrarão tenazes em desmentir o mal feito exposto em praça pública. Eles manterão o samba de uma nota só de que quase metade da população, que não votou neles, é gente farta, barrigas-cheias, branca de olhos azuis como disse o apedeuta num xingamento. Tentaram vestir calça de veludo, mas rota, estão com a bunda de fora. Isto é mera reação de quem odeia o contraditório. Que acha que tem a patente de todas as certezas. Continuarão apostando na divisão da nação como celerados que são. Zarolhos, míopes, só veem uma banda que lhes aplaude, como se governassem para uma classe e não um país. 
Às pessoas, qualquer um, que ainda pensam por si mesmos, que querem um país decente, meritório, livre, com oportunidades, escravo da lei, democrático, honesto, meu mais sincero respeito.

domingo, 15 de março de 2015

Xô, vampiros!

É quase certo que, a poucos metros de você, existe um vampiro se alimentando. Ele pega a vítima, perfura sua pele e suga todos os seus fluidos corporais. E esse processo leva apenas alguns minutos.

Fonte: Da BBC Earth, Michael Marshall. (05/11/2014)

Faz tempo que vampiros não assustam. Ao contrário, se tornaram pop. A overdose de filmes, séries e livros transformaram estes seres sedentos de sangue em heróis adolescentes com milhares de espectadores e leitores. O medo mesmo, por mais maldosos que os representem, acabou. Porque eles têm até, divagam alguns, um sex appeal. Transbordam sensualidade, ainda que frios, desalmados e mortais.
Desconheço a origem do mito. Não é, certamente, em Drácula de Bram Stoker. Desconfio que a ideia tenha nascido dos vampiros reais que a natureza produziu. Sanquessugas não somente são nojentas, como medicinais. Desde tempos imemoriais elas ajudam com a sangria. Muriçocas fêmeas continuam atormentando o mundo tropical e agora, acusam estudos, invadem latitudes ao norte do planeta por culpa de um suspeito aquecimento global.
Morcegos, possivelmente, são a verdadeira fonte do mito vampiresco. Monstros alados de dentes afiados e cortantes como navalhas. Uma baba anestesiante que cumpre o papel de não deixar o sangue coagular. Igual às suas colegas muriçocas. Eles, de quebra, ainda podem transmitir o vírus da raiva que é mortal em quase cem por cento das vítimas.
Amedrontador mesmo é o inacreditável candiru. Peixe brasileiro que, normalmente, ataca seus parentes vertebrados aquáticos, mas se homem ou mulher invadem águas infestadas deles, eles alegremente penetrarão por qualquer orifício disponível, quero dizer descoberto, e dali sugará o sangue da vítima infeliz. Os homens o temem mais que as piranhas, sem trocadilho, parece que eles tem predileção pelo canal uretral. Argh!
Eis que descubro que existe uma turma de amebas, já velhas conhecidas dos cientistas, às quais deram o simpático nome de Vampyrellidae. Por óbvio, está sugerido como as parasitas se alimentam. O que choca é que são capazes de atacar seres muito maiores que elas e sugar todo seu líquido interno, não necessariamente sangue. Admira a rapidez e voracidade das mimosas criaturinhas. Se uma não consegue ou está em estado famélico, funde-se em tal abraço com uma sua colega que se tornam uma e vão para cima do alvo.
Desando. Aula sobre vampiros não é exatamente o que vocês esperam num domingo nesta coluna. Mas é que, de repente, me dei conta da incrível metáfora que eles oferecem. Aliás, sobre a politicanalha praticada nestes confins, cabe qualquer coisa que seja repugnante, da moral e bons costumes à folha corrida da polícia. Alguns minimizam e sugerem que eles apenas reproduzem aqueles que representam. Como se fossem uma amostra permanente do entorno populacional. Eu diria da índole mesma do brasileiro médio.
É fácil dizer: o governo nos vampiriza, ainda que seja uma verdade inconteste. Mas este, pelo menos, se disfarça de que, ao arrancar nosso couro com impostos, aplicará nos serviços do país. Vá lá, que temos os piores serviços do mundo pelo preço que pagamos. Agora, porém, os sacripantas têm insuspeitas caras de executivos. Os sevandijas imitam as admiráveis amebas, juntam-se em conluio e nos consomem. Seres muitos maiores que eles, como a Petrobras.
Os sabujos governam auxiliados por seus pareceiros lacaios, mas que se chamam orgulhosamente de partidos aliados. Instrumentalizam as instituições para sua colmeia maligna. Absorvem até o ar que respiramos ou o empesteiam. Vendem-se, os encostados, como defensores de uma abstração, o povo. Essa palavra que se presta para as maiores sevícias na boca de patifes como os petistas e a ralé que os auxilia.
Estes vampiros das forças e energias produtivas tem predileção por qualquer um que tenha sangue, mas a classe média, por sua peculiar situação – não é pobre, portanto não tem direitos sociais. Não é rica, por isso não consegue se amasiar com o poder nem se defender dos impostos – são mais suscetíveis à virulenta ação desses bandalhos.
Hoje, quer as ruas se encham ou não com os indignados, é uma data para se comemorar. Não a democracia que os samexungas adoram falar, mas o direito de sacudir a exploração que estes bernes, tapurus infelizes de nossas costas doídas.