sábado, 22 de abril de 2017

A Baleia Azul

Eu soube do fenômeno Baleia Azul pelos jornais, mas logo em seguida os grupos dos quais participo no whats foram engolfados – não é uma figura de retórica – numa verdadeira histeria de imagens – algumas terríveis e nem se sabe se são de pessoas ligadas ao problema – e textos que iam do pavor e fala apocalíptica à piada ridícula e sem graça, algumas religiosas. Como se as vítimas dessa horrenda “brincadeira” fossem meros idiotas que não tem o que fazer ou que lhes faltam disciplina e religiosidade.
Acho que chego atrasado. Um jovem youtuber, que tem coisa de 10 milhões de seguidores, postou um vídeo que teve quase 5 milhões de visualizações até o momento em que escrevo este texto – não sei se foi orientado por um profissional – que fala algo quase óbvio: meninos e meninas emocionalmente saudáveis estão vacinados contra essa demência coletiva. Em resumo foi isso que disse.
Mas claro! Pessoas se tornam pessoas quando aprendem a lidar com suas emoções. Este aprendizado quase sempre vem de uma família que, a despeito de suas idiossincrasias – toda família tem –, se importam uns com os outros, se afagam, são afetivamente atuantes, conversam entre si e criam com isso um ambiente propício à liberdade, à tolerância, à empatia.
A nefasta Baleia Azul é um ser parasítico. Quem a conduz e organiza, são seres miseráveis e nefastos, mas não aquele comum cujo maior mal que faz é a si mesmo. É um tipo maligno de mal, aquele que goza com o domínio, o controle, a manipulação emocional e cognitiva dos mais fracos. Os que estão por trás desta Baleia Azul assassina, se alimentam da miséria alheia, são comedores de tristeza e desamparo. Eles são atraídos pela dor e como tubarões famintos são capazes de cheirar sangue a quilômetros de distancia. Eles usam iscas que simulam algo grande, transcendente para almas fracas e abandonadas, estas viciadas em suas próprias dores porque apenas conhecem do mundo – alguns muito cedo – o que há de pior na raça humana. Ou adoeceram, tem anemia emocional, um sistema afetivo imune debilitado.
A Baleia Azul parecerá às pessoas saudáveis um exotismo que não lhes atrairão, pois gostam de luz, não de trevas como os milhões de jovens depressivos, melancólicos, afetivamente abandonados, violados em sua inocência e que não receberam uma gota de aprovação de pessoas que os apreciassem pelo que são. O buraco da grande falta precisa de algo do tamanho de uma Baleia para tapar. Que importa se é uma Baleia-demônio, que importa sua cor, que importa se ao final de uma lista de tarefas está a morte – eles já se percebem mortos em algum grau –, basta que prometa que seu vazio, de alguma maneira insólita, será preenchido. A dor física como caminho que acaba com a angústia nada é, a morte também não.
Dizem que a discussão e os alertas devem ser sobre suicídio, infelizmente um problema que tem aumentado. O aumento de pessoas deprimidas está diretamente relacionado. O Brasil é o terceiro país mais deprimido do mundo, atrás dos EUA e França. Cerca de 5,8% da população brasileira tem depressão. Aqueles que são diagnosticados que, seguramente é uma parcela menor, pois não é raro que a doença castigue alguém por anos até que seja tratada. Entre os deprimidos, ao redor de 15% tentam o suicídio, alguns conseguem. Todo deprimido tem ideação suicida. A morte parece ao deprimido a libertação suprema, pois qualquer coisa é melhor do que o vazio abismal que abriga no peito. Uma pessoa desesperada não tem medo.
Nenhum ser humano é pra baixo por natureza. Nenhuma pessoa é triste sem causa. Ela o será por contingência ou por doença. Mudanças de comportamentos que permanecem por mais de duas semanas, isolamento, desmotivação, semblante permanentemente fechado como um céu que se prepara para uma tempestade, apetite e sono descontrolado – para mais ou para menos –, pessimismo, falta de energia, desprazer em coisas que antes eram prazerosas, são sinais fáceis de perceber. Ajuda especializada deve ser procurada.

A depressão é insidiosa às vezes. Não importa o seu grau, ela causa estragos emocionais, sociais e, se não tratada, produz consequências nefastas. O jogo baleia azul é apenas um carniceiro que se aproveita de uma fragilidade que já existe. O remédio contra ele é o cuidado de nossos jovens.