domingo, 14 de julho de 2013

O Delúbio que deu certo

Lenin Carballido é o novo chefe do poder Executivo de San Agustín Amatengo, pequeno município de 1,4 mil habitantes. Ele ganhou as eleições após fazer uma campanha com o slogan "Unidos pelo Desenvolvimento".
A polícia diz que família de Carballido conseguiu atestado de óbito em seu nome em 2010. Na ocasião, ele era investigado por um estupro ocorrido em 2004.

Fonte: BBC (12/07/2013)

Ah, a América Latina com seus caudilhos mixos, populistas ridículos e nacionalistas baratos! O que seria desta parte do mundo sem estes verdadeiros patrimônios de nosso, diria o velho Nelson Rodrigues, complexo de vira-latas, estes narcisos às avessas que compensam suas tristes existências insuflando cultos de adoração das massas ignaras e – às vezes, tenho rompantes de redundância –, burras, loucas para serem compradas por uma bolsa qualquer coisa.
Não fui contaminado pelo espírito das ruas que até há pouco explodiam aos gritos por direitos e um mundo de outros reclames, quero dizer, não aqui no texto, fui inspirado por um mexicano que resgata a manha daqueles políticos que, por suposto, não existem mais no Brasil. Perguntem onde estão os incendiários brizolas, os carbonários fuleiros e mensaleiros da pátria amada, salve, salve? Perderam a veia, o charme, tem pudores de serem vergonhosos. Que tempos!
O mexicano Lenin Carballido – vejam que inspiração de nome – poderia ser Lula, Fidel, Chavez... Desculpem, devaneio. Em 2004, Lenin lidava com uma ligeira malcriação que cometera, segundo acusação da polícia. Supostamente, teria tido conjunção carnal não consensual com uma jovem. O partido da Revolução Democrática, familiares e amigos, solidários contra tamanha ignomínia, arregimentaram forças para livrar o idealista. Mas como livrá-lo da acusação? Matando-o de mentirinha. Um médico boliviano especialmente contratado emitiu o atestado de óbito. Morte natural por diabetes galopante. Uma perda irreparável. Todos choraram.
Nosso herói levou um passo adiante – e que passo! – em relação a arte da camuflagem política pilantra. O melhor representante da classe no Brasil, Zé Dirceu, além de um nome banal, só fez uma plástica chinfrim e enganou meia dúzia de mulheres com quem conviveu. Coisa de amador.
A artimanha de Lenin e companhia funcionou.  A polícia deu a investigação por encerrada, afinal, o facínora coisador das filhas alheias estava morto. Então, uma campanha para prefeito despertou o que fora defunto para a vida pública. O partido providenciou o registro da candidatura com todos os documentos, inclusive certidão de nascimento, atestado negativo de antecedentes criminais. Candidato pelas causas dos fracos e oprimidos, ganhou disparado.
Conta-se pelos corredores do Congresso brasileiro que alguns mensaleiros contrataram a assessoria de Lenin para as providências de morte e ressuscitação. O Supremo desconfia da malandragem, mas como dorme em cima dos protelatórios da condenação, só se dará conta quando os condenados aparecerem como almas penadas, mas candidatos a alguma coisa.
Alguém – tem sempre um advogado do diabo à espreita – disse que Lenin estava morto, logo não poderia ser eleito, menos ainda governar. Ele mesmo dizia: estou vivo e bulindo, como assim, morto? Estabeleceu-se uma celeuma. Juristas, padres e xamãs foram convidados a opinar. Sugeriram o diabo também, pois havia quem dissesse que o homem só estava vivo por ter feito um pacto com o coisa ruim. Então ele que explicasse como é que o que estivera morto estava vivo? Como os mexicanos celebram a santa muerte, houve uma monção para requisitá-la, mas a assessoria da defuntóloga disse que ela estaria no cabelereiro colocando uma peruca nova, que pedia desculpas, mas não poderia participar do esclarecimento.
Os tabloides pipocaram a notícia. O Partido da Revolução Democrática mostrou-se como marido traído. Que nada sabia. Que fora enganado por documentos forjados. Declarava-se inocente, mas sugeria que o primo de Lenin, um tal Stálin, assumisse a prefeitura, pois este não morrera de nenhuma forma e era do mesmo partido.
A polícia, ridicularizada por um morto que estava vivo e agora prefeito, reabriu as investigações sobre o suposto estupro, não sei se ato libidinoso diverso da conjunção carnal, embora se dissesse até coisa pior. A pretensa vítima, desde o escândalo, alcançou relativa popularidade e fez ponta em novelas – algumas exibidas pelo SBT –, lançou um disco de funk numa favela brasileira e posara para umas quatro revistas soft pornô. Claro que ela iria depor, afinal tivera sua inocência roubada, embora já tenha feito três himenoplastias.
Como a justiça mexicana, igual à brasileira, tarda e falha, ainda não se sabe o resultado do imbróglio. O prefeito segue vivo e morto, mas prefeitando, como João Paulo Cunha e José Genoíno, estes deputados vivos e soltos. Já se fala em conluios, desvios, peculatos diversos, compras superfaturadas e... orgias na prefeitura. Mas isso é coisa para outro processo. Entre os petistas, Lenin virou um Delúbio que deu certo.