sábado, 13 de janeiro de 2018

"Fale mesmo se sua voz tremer"

Ammy “Dolly” Everett tinha 14 anos apenas quando tirou a própria vida. Seus pais e amigos a definiam como uma menina sensível e preocupada com os outros, especialmente aqueles que eram mais fracos.

A garota ficou conhecida em toda Austrália por causa de uma campanha publicitária que fez aos 8 anos para uma famosa marca de chapéus e da qual se tornou garota propaganda até o momento em pôs fim a sua vida.

Numa carta, seu pai disse que a causa de ato tão terrível seria resultado de Bullying que ela vinha sofrendo pelas redes sociais. Um desenho de Ammy foi compartilhado pela família. Nele se via uma figura magrinha inclinada para trás que dizia: “fale mesmo se sua voz tremer.”

Apesar de ser um anglicismo que não ganhou tradução na fala em português, a frequente abordagem do tema tornou compreensível a todos.

Deplorar a condição de alguém, apelidar maldosamente, agir de forma preconceituosa, destratar, desmerecer, isolar e ignorar as pessoas, são parte do arsenal de violências psicológicas que se pode fazer contra alguém. Além disso, a agressão física completa a lista de ações que definem o Bullying.

Histórias como a de Ammy ganharam visibilidade e revelaram um mundo até outrora invisível, então é muito bom que se fale sobre isso e se tome todas as medidas necessárias para evitá-lo, mas…

O Bullying é como uma doença e como qualquer doença ela está à espreita em algum lugar. É como um animal predador de emboscada. Ele se disfarça e se esconde. Ele simula desinteresse na presa até que seja tarde demais. Mas se tomarmos estas duas imagens como verdadeiras, por que temos a sensação de que há mais Bullying agora do que antes em nossa infância? É por que não conhecíamos a palavra? É por que havia mais resistência naqueles que sofriam a agressão? Nossos jovens são mais frágeis que a geração anterior?

Retomando as imagens utilizadas antes. Nenhuma presa é passiva diante de seu predador. Cada uma delas tem algum recurso para enfrentar, se disfarçar, fugir… Uma doença é tanto mais forte quanto mais precária for nossa imunidade.

Vivemos em um mundo onde a maldade está em todo lugar. E jamais ele será um espaço de bondade e paz permanente ou ausência de violência. Sim, a luta deve ser sem trégua contra as forças do mal, mas elas sempre existirão e farão vítimas. Então me parece utópico apenas querer impedir o Bullying com medidas que mais castram a liberdade das relações e das brincadeiras que, sim, às vezes são mais agressivas entre jovens, por exemplo, grupo de maior vulnerabilidade.

Não sei detalhes da história de Ammy, mas será que essa garota não ficou tempo demasiado sozinha e sem assistência? Vejam, não culpo os pais. Apenas esta excessiva liberdade nas redes permite uma vida paralela tão exigente e cheia de desafios quanto a vida real e parece que subestimamos isso.

As relações familiares, quando saudáveis, e com saudável quero dizer presença parental, diálogo, ensino sobre princípios da vida, afeto, convivência de qualidade, para mencionar algumas coisas. Estas relações são as grandes provedoras de anticorpos, recursos de defesa contra a violência de toda sorte. Estar preparado não impede de sofrer a violência, mas dá ao agredido um escape, a busca por ajuda e não a miserável tortura e angústia de quem se vê sozinho e acha que este problema é só seu.

Não invento a roda. Sei que existem iniciativas que tentam trabalhar nessa direção do fortalecimento, do conhecimento sobre o chão pantanoso das relações humanas aos quais estamos mais expostos quando mais jovens e inexperientes.

Mais que lei ou regras, os jovens precisam de orientação sólida sobre os limites do abuso. Parece que se defende mais que os jovens saibam mais sobre sexo protegido do que se defender ou buscar ajuda contra as agressões psicológicas que o Bullying produz.


Então pais e mães, é nossa responsabilidade começar agora, talvez com uma conversa de sondagem com seu(s) filho(s) em idade vulnerável. Há sinais em quem sofre. Mas se mal você vê seu filho, como perceberá que há algo diferente em seu comportamento? Paternidade dá trabalho, sim, então vai lá faça seu trabalho!