“De repente,
não mais que de repente...” Sei, emprego a frase de “Soneto da separação” em
contexto diverso de seu sentido, mas o faço de propósito. Leitor, retome a
frase do Poetinha. Você se dá conta de que faz parte de pelo menos cinco grupos
de whatsapp com os quais se relaciona quase como múmia: não esboça nem um
bocejo sequer, não fala, e não coloca um único e escasso emoji sorridente para
as piadas e/ou imagens esquisitas que as pessoas adoram compartilhar. Não raro,
de mau gosto, pois todo grupo parece ter um espírito de porco. Por indiferença
às postagens cornucópicas, tampouco tecla o famigerado kkkkk para não deixar a
fala de um zinho qualquer no vácuo. Na verdade, você fantasia – e acha ótimo –
a imagem dele(a) se contorcendo por causa do silêncio de todos.
Se você é
daqueles que, sei lá porque razão, não usa o dispositivo “silencioso”, vai
acabar percebendo que está a ponto de ter um surto, pois a cada dois segundos
seu celular emite um som. Saiba, isso também inferniza a vida de quem está por
perto. São as pessoas postando freneticamente. Ao olhar as mensagens nos
grupos, descobre: são centenas de postagens tolas, repetitivas, engraçadinhas
ou brigas, digamos, verbais, pelos motivos mais ridículos e que você não tem a
mínima vontade de apartar: que se matem... verbalmente.
A certa
altura, você tem uma sensação de estranhamento. O que eu tenho de comum com
estas pessoas? Se alucinar um pouco mais, se perguntará: quem são essas
pessoas? Precisa relembrar que foram da escola, são do trabalho, da igreja, do
condomínio... Os grupos escolares viraram moda. São enormes. Vivem numa espiral
nostálgica que abusa como quando se come mel além da conta. Entre os membros,
alguns tentam ressuscitar brincadeiras adolescentes, outros suspiram o tempo
inteiro pelos velhos e incríveis tempos e ali se torna uma bolha que oferece um
parêntese entre os desacertos, os fracassos, os desastres e tudo aquilo que a
vida lhes fez. Pode ser um espelho da rainha má a dizer quão errado deram
aqueles seus planos de ser alguém na vida, já que alguns dos colegas chegaram
lá e você, não.
Algo une todos
esses grupos: você sente uma vontade enorme de sair simplesmente batendo a
porta e pronto. Então, um fenômeno sinistro: desconfia que está preso por teias
invisíveis que lhe impedem de sair. Pensa um pouco e nomeia algumas das
armadilhas, pois são o que são. Vergonha. Culpa. Pensa: o que dirão se eu sair
assim? Falarão mal de mim. E, mais horrendo, pensarão mal de mim. E se corrói
com o dilema: que desculpa dar?
Descobre que
apagar as mensagens e imagens sem lê-las é como uma pequena vingança. Uma forma
de dizer para si mesmo: olha o que faço com vocês e suas tolices rematadas! A
vontade de sair, porém, não acaba. Mas um constrangimento avassalador lhe toma
de assalto, aquele que é seu e o que lhe incutem. Ao final constata: o grupo
virou uma prisão. Sair é mais que ousadia, é uma traição aos demais. Eles se
parecem a uma... Coreia do Norte.
Assim
estava minha amiga que encontrei à porta do elevador. Subimos alguns andares
juntos. Você ainda está no grupo tal? Afirmei que sim, mas que iria sair. Ela
aproveitou: Como tu vai fazer isso? Há tempos quero sair e não consigo! Já
marquei data e tudo e na hora faltou coragem. Respondi: Direi que foi legal,
desejarei algo de bom e tchau. Faça assim, aconselhei. Então, desolada, ela
perguntou: Mas se eles me colocarem de volta no grupo?