quarta-feira, 27 de julho de 2016

Os caçadores de Pokemon

Todas as palavras sobre o Pokemon Go são superlativas. Brasileiros aficionados a jogos não veem a hora de se sair por aí catando, melhor dizendo, caçando os bichinhos virtuais esquisitos. Considerando que as pessoas nas ruas e ao volante dos carros já andam que nem autistas, alheios ao mundo com a cara enfiada nas telas dos celulares, o que não acontecerá com a operação definitiva dos servidores da Nintendo, que já estão em teste no país?
Talvez eu seja apenas um old fashion. Quem sabe, por razões um tanto desconhecidas para mim, tenha feito uma viagem no tempo, apenas me deixando ficar no século passado e este que aqui está não passa de um holograma que vê estas coisas com curiosidade, quase cientificamente interessado nos comportamentos estranhos que eventos como esse despertam nas pessoas.
A vantagem é que, parece, os bichos podem ser caçados e não correm o risco de extinção. As reportagens mostram magotes de pessoas reunidas, mas não necessariamente em contato entre si, em praças e parques ou mesmo nas ruas, realizando movimentos estereotipados, rindo sozinhos com a captura ou demonstrando frustração porque o bicho ladino escapou. E se fazem algum contato visual com um alienígena transeunte, demonstram constrangimento pela derrota.
Em meio à onda pokemoniana, há quem se ofereça para segurar o cachorro que foi levado para passear, para que seu dono possa caçar os animalitos tranquilo. Outros se oferecem, por módica quantia, para dirigir enquanto o dono do carro se torna um caçador virtual. Um irlandês não quis saber, entrou na contramão e por pouco não causou um acidente. Multado e repreendido pela autoridade de trânsito, explicou cândido que um Pokemon havia entrado na rua de mão proibida.
Eis mais uma forma de se anestesiar, de se deixar absorver e consumir. O mundo real é aborrecido e parece ter uma propensão especial para negar nossos doces sonhos. Que mais dá se a nova moda, com seu efeito manada, propõe caçar seres virtuais, contanto que se consiga inundar o cérebro de dopamina, não importa. Ademais, se pode “conhecer” outros caçadores e, quais homens primitivos, sentar ao redor da fogueira e contar em tons épicos as muitas aventuras de caçadas na selva urbana.
Que sensação de vitória e realização convidar alguns inexperientes caçadores para visitar a sala de jantar e lhes mostrar, entre orgulhoso e encantado consigo mesmo e cheio de autocongratulação, a parede de troféus, com suas indefectíveis cabeças empalhadas dos mais exóticos animais que se tem notícia. Quem sabe, num arroubo culinário, explicar em detalhes de fazer inveja ao Master Chef, os acepipes e formas sofisticadas de comê-los. Não inteiros, mas partes específicas como fígados de ganso engordados com manteiga.
Não se admire se encontrar pessoas desfilando nas ruas com peles-imitação dos bichos caçados, ou ainda colares feitos com dentes ou chifres mágicos, anéis com olhos envidrados como símbolo de um desses novos e fugazes status: caçador de Pokemon.