terça-feira, 19 de setembro de 2017

Cura Gay. Onde está a verdade?

Inacreditável! A recente controvérsia que tomou conta do noticiário é, literalmente, de abismar. A dimensão que a coisa tomou é desproporcional ao seu conteúdo. Exceção ao CFP que sabe exatamente o engano que produziu para dar suporte a uma ideologia de gênero do qual é supremo defensor, os demais, imprensa, militantes gays e simpatizantes, não tem a menor ideia do que estão falando. Apenas repetem seu repúdio que nem papagaios e por meio de jargões, entre eles o termo maldosamente cunhado: “cura gay”.
Neste espaço já postei vários textos que debatem, creio eu, sem o fanatismo dos militantes ideológicos de ambos os lados. Duas vezes defendi a Rosângela Justino (vejam aqui e aqui) que volta novamente aos holofotes. Não porque concorde com suas ideias no todo, mas por que nos dois momentos percebi uma clara postura persecutória tanto do CRP do Rio de Janeiro, como do CFP, incluindo uma arapuca que lhe armou uma repórter da Folha de São Paulo. Assim também me posicionei em favor do Silas Malafaia (veja aqui), ainda que dele discorde em muito mais coisas.
Em outras duas oportunidades (aqui e aqui) discuti neste Blog a famigerada Resolução CFP 1/1999 que determina aos psicólogos a proibição de atender gays, e de jeito nenhum que este atendimento se trate de uma suposta cura de sua condição. Naturalmente, um psicólogo que defenda a Resolução e até trabalhe para que os que estiverem em dúvida se assumam ou saiam do armário, estes receberão aplauso.
Um esclarecimento. Do mesmo modo que até hoje não se tem uma causa única da condição gay que é multifatorial – elas passam da genética à cultura e construções psicoafetivas –, tampouco existe uma cura médica ou psicológica. A inclinação homoafetiva não é, em si, uma doença psiquiátrica. Todo psicólogo minimamente instruído deveria sabê-lo. Portanto, a ideia de reversão parece absurda por qualquer ângulo que se analise. Seja para negá-la ou afirmá-la. E a razão se deve à enorme complexidade envolvida nesta manifestação da sexualidade humana.
Um psicólogo que venda a reversão ou cura, nestes modos, pratica mal a psicologia. Mas um psicólogo pode, sim, atender um gay, suposto ou assumido, em dúvida ou definido que, nesta condição e por causa dela, sofra psicologicamente. Onde está a teoria científica, a norma ética, que obriga o psicólogo a agir apenas em favor da pessoa se assumir gay? Então se deve subverter uma das mais caras posturas deste profissional que é ajudar, caminhar junto, prover suporte sem julgamento ou direcionamento de qualquer natureza quando se tratar de levar alguém a assumir ser gay? Um gay está reduzido apenas à sua sexualidade ou é um sujeito marcado pelas experiências familiares, sociais, culturais e religiosas? Ele pode escolher outra coisa ou, fatalmente, só pode ser gay?
Demonstrei numa análise do próprio texto da Resolução que ela é falha (ver os textos indicados), ambígua e atenta contra a liberdade do exercício profissional do psicólogo e da pessoa que busca ajuda, por ser generalista, limitante e não discriminar as inúmeras situações que podem ocorrer num consultório. A coisa, a levar ao pé da letra o que determina a pobre Resolução, fede a puro autoritarismo e atenta contra os princípios da própria psicologia. Será que todas as pessoas que procuram um psicólogo são doentes, padecem de algum transtorno mental?
Agora o tema explodiu num misto de escarcéu e deboche de muitos gays famosos com ampla cobertura – e põe ampla nisso – da imprensa. Na internet, então, o tema já entrou para os trends topics. Pessoas famosas têm emprestado sua cara e tirado uma casquinha do furdunço: artistas diversos e o médico Dráuzio Varella. Mais do que nunca vivemos um tempo de protagonismos e quando mais se defende a agenda-setting, mais “likes” se ganha. Não importa se o defensor entende ou não o que está falando.
Do sentimento de ultraje da militância gay e simpatizantes de outros momentos, agora a postura é de desabrida condenação, de ridicularizar e o sarcasmo contra a mais singela discordância de seus pontos de vista. Ninguém quer sequer entender o que disse o juiz que, como qualquer pessoa sensata, percebeu as possibilidades nefastas que a Resolução do CFP cria e efetivamente está acontecendo. Qualquer posição divergente a ela recebe de seus defensores a condenação e a marginalização para seus contrários.
O que ocorreu, afinal? Um juiz federal em Brasília – Waldemar Claudio de Carvalho –, provocado por um grupo de psicólogos, determinou que estes poderiam, em certas condições, atender gays para supostos tratamentos de reversão de suas inclinações homoeróticas. Bom, façamos um ligeiro reparo nesta frase que na liminar está assim: “Sendo assim, defiro, em parte, a liminar requerida para, sem suspender os efeitos da Resolução nº 001/1999, determinar ao Conselho Federal de Psicologia que não a interprete de modo a impedir os psicólogos de promoverem estudos ou atendimento profissional, de forma reservada, pertinente à (re) orientação sexual, garantindo-lhes, assim, a plena liberdade científica acerca da matéria, sem qualquer censura ou necessidade de licença prévia por parte do C.F.P., em razão do disposto no art. 5º. inciso IX, da Constituição de 1988”.
Percebam a frase sublinhada. Este é o nó da questão. Definitivamente pede muitas linhas explicativas que num despacho é impossível de analisar. Baseados nela, podemos discutir sobre a liberdade tanto do profissional que atende como do cliente que o procura. Poderíamos debater sobre o que é realmente esta reorientação sexual. Será que se disse ali, como cinicamente CFP e imprensa estão espalhando, que reorientar – concordando ou não com o termo – é o mesmo que igualar ser gay a ser doente?
Ainda naquela pequena frase. Pode-se questionar se existem graus de gaysismo e até quando uma pessoa reverte ou não? E ainda. Será que todas as pessoas que percebem a inclinação homoafetiva já vêm completamente resolvidas? O juiz determina que se cacem gays nas ruas e os obriguem a mudar?
Um psicólogo é o profissional do acolhimento. Da compreensão da dor da alma das pessoas. Deve exercitar a compaixão e a empatia sempre. As regras no Código de Ética Profissional são mais que suficientes para orientar a prática psicológica e punir aqueles que dela se desviem, e isso sempre que desrespeite a profissão e/ou seu cliente seja do jeito que for.
Já a Resoluçãozinha, que o CFP se recusa a discutir, é um libelo de declaração política. Ela se imiscui na intimidade dos consultórios e violenta a prática psicológica para determinar às pessoas, profissionais e clientes, sua ideologia, nada mais, nada menos. 
Os gays brasileiros, ricos e pobres, famosos ou anônimos, merecem respeito porque são pessoas, tem a dignidade intrínseca de todo ser humano e essa razão é mais que suficiente para que assim sejam tratados: nenhuma discriminação, nenhuma violência, nenhuma intolerância, nenhum desrespeito. Mas isso também vale para aqueles que deles discordam e de seu modo de vida – afinal não se trata apenas de como fazem sexo –, ou seja pelo que for, desde que, sempre, se mantenham dentro dos limites do amor ao próximo.