Inacreditável! A recente
controvérsia que tomou conta do noticiário é, literalmente, de abismar. A
dimensão que a coisa tomou é desproporcional ao seu conteúdo. Exceção ao CFP
que sabe exatamente o engano que produziu para dar suporte a uma ideologia de
gênero do qual é supremo defensor, os demais, imprensa, militantes gays e
simpatizantes, não tem a menor ideia do que estão falando. Apenas repetem seu
repúdio que nem papagaios e por meio de jargões, entre eles o termo
maldosamente cunhado: “cura gay”.
Neste espaço já postei
vários textos que debatem, creio eu, sem o fanatismo dos militantes ideológicos
de ambos os lados. Duas vezes defendi a Rosângela Justino (vejam aqui e
aqui)
que volta novamente aos holofotes. Não porque concorde com suas ideias no todo,
mas por que nos dois momentos percebi uma clara postura persecutória tanto do
CRP do Rio de Janeiro, como do CFP, incluindo uma arapuca que lhe armou uma
repórter da Folha de São Paulo. Assim também me posicionei em favor do Silas
Malafaia (veja aqui),
ainda que dele discorde em muito mais coisas.
Em outras duas
oportunidades (aqui
e aqui)
discuti neste Blog a famigerada Resolução CFP 1/1999 que determina aos
psicólogos a proibição de atender gays, e de jeito nenhum que este atendimento
se trate de uma suposta cura de sua condição. Naturalmente, um psicólogo que
defenda a Resolução e até trabalhe para que os que estiverem em dúvida se
assumam ou saiam do armário, estes receberão aplauso.
Um esclarecimento. Do
mesmo modo que até hoje não se tem uma causa única da condição gay que é multifatorial
– elas passam da genética à cultura e construções psicoafetivas –, tampouco
existe uma cura médica ou psicológica. A inclinação homoafetiva não é, em si, uma
doença psiquiátrica. Todo psicólogo minimamente instruído deveria sabê-lo. Portanto,
a ideia de reversão parece absurda por qualquer ângulo que se analise. Seja
para negá-la ou afirmá-la. E a razão se deve à enorme complexidade envolvida nesta
manifestação da sexualidade humana.
Um psicólogo que venda a
reversão ou cura, nestes modos, pratica mal a psicologia. Mas um psicólogo
pode, sim, atender um gay, suposto ou assumido, em dúvida ou definido que, nesta
condição e por causa dela, sofra psicologicamente. Onde está a teoria
científica, a norma ética, que obriga o psicólogo a agir apenas em favor da
pessoa se assumir gay? Então se deve subverter uma das mais caras posturas
deste profissional que é ajudar, caminhar junto, prover suporte sem julgamento
ou direcionamento de qualquer natureza quando se tratar de levar alguém a
assumir ser gay? Um gay está reduzido apenas à sua sexualidade ou é um sujeito
marcado pelas experiências familiares, sociais, culturais e religiosas? Ele
pode escolher outra coisa ou, fatalmente, só pode ser gay?
Demonstrei numa análise
do próprio texto da Resolução que ela é falha (ver os textos indicados),
ambígua e atenta contra a liberdade do exercício profissional do psicólogo e da
pessoa que busca ajuda, por ser generalista, limitante e não discriminar as
inúmeras situações que podem ocorrer num consultório. A coisa, a levar ao pé da
letra o que determina a pobre Resolução, fede a puro autoritarismo e atenta
contra os princípios da própria psicologia. Será que todas as pessoas que
procuram um psicólogo são doentes, padecem de algum transtorno mental?
Agora o tema explodiu
num misto de escarcéu e deboche de muitos gays famosos com ampla cobertura – e
põe ampla nisso – da imprensa. Na internet, então, o tema já entrou para os
trends topics. Pessoas famosas têm emprestado sua cara e tirado uma casquinha
do furdunço: artistas diversos e o médico Dráuzio Varella. Mais do que nunca
vivemos um tempo de protagonismos e quando mais se defende a agenda-setting,
mais “likes” se ganha. Não importa se o defensor entende ou não o que está
falando.
Do sentimento de ultraje
da militância gay e simpatizantes de outros momentos, agora a postura é de
desabrida condenação, de ridicularizar e o sarcasmo contra a mais singela
discordância de seus pontos de vista. Ninguém quer sequer entender o que disse
o juiz que, como qualquer pessoa sensata, percebeu as possibilidades nefastas
que a Resolução do CFP cria e efetivamente está acontecendo. Qualquer posição divergente
a ela recebe de seus defensores a condenação e a marginalização para seus
contrários.
O que ocorreu, afinal? Um
juiz federal em Brasília – Waldemar Claudio de Carvalho –, provocado por um
grupo de psicólogos, determinou que estes poderiam, em certas condições,
atender gays para supostos tratamentos de reversão de suas inclinações
homoeróticas. Bom, façamos um ligeiro reparo nesta frase que na liminar está
assim: “Sendo
assim, defiro, em parte, a liminar requerida para, sem suspender os efeitos da
Resolução nº 001/1999, determinar ao Conselho Federal de Psicologia que não a
interprete de modo a impedir os psicólogos de promoverem estudos ou atendimento
profissional, de forma reservada, pertinente à (re) orientação sexual,
garantindo-lhes, assim, a plena liberdade científica acerca da matéria, sem
qualquer censura ou necessidade de licença prévia por parte do C.F.P., em razão
do disposto no art. 5º. inciso IX, da Constituição de 1988”.
Percebam a frase sublinhada. Este é o nó
da questão. Definitivamente pede muitas linhas explicativas que num despacho é
impossível de analisar. Baseados nela, podemos discutir sobre a liberdade tanto
do profissional que atende como do cliente que o procura. Poderíamos debater
sobre o que é realmente esta reorientação sexual. Será que se disse ali, como
cinicamente CFP e imprensa estão espalhando, que reorientar – concordando ou
não com o termo – é o mesmo que igualar ser gay a ser doente?
Ainda naquela pequena frase. Pode-se
questionar se existem graus de gaysismo e até quando uma pessoa reverte ou não?
E ainda. Será que todas as pessoas que percebem a inclinação homoafetiva já vêm
completamente resolvidas? O juiz determina que se cacem gays nas ruas e os
obriguem a mudar?
Um psicólogo é o profissional do
acolhimento. Da compreensão da dor da alma das pessoas. Deve exercitar a
compaixão e a empatia sempre. As regras no Código de Ética Profissional são
mais que suficientes para orientar a prática psicológica e punir aqueles que
dela se desviem, e isso sempre que desrespeite a profissão e/ou seu cliente
seja do jeito que for.
Já a Resoluçãozinha, que o CFP se recusa a
discutir, é um libelo de declaração política. Ela se imiscui na intimidade dos
consultórios e violenta a prática psicológica para determinar às pessoas,
profissionais e clientes, sua ideologia, nada mais, nada menos.
Os
gays brasileiros, ricos e pobres, famosos ou anônimos, merecem respeito porque
são pessoas, tem a dignidade intrínseca de todo ser humano e essa razão é mais que
suficiente para que assim sejam tratados: nenhuma discriminação, nenhuma
violência, nenhuma intolerância, nenhum desrespeito. Mas isso também vale para
aqueles que deles discordam e de seu modo de vida – afinal não se trata apenas
de como fazem sexo –, ou seja pelo que for, desde que, sempre, se mantenham
dentro dos limites do amor ao próximo.