domingo, 14 de setembro de 2014

De como a vida "muderna" é absurda



1. Uma juíza da cidade de Seattle, nos Estados Unidos, determinou que um homem soropositivo pare de contaminar outras pessoas e se trate. O homem, identificado apenas como "AO", infectou outras oito pessoas nos últimos quatro anos.
2. RIO - Um grupo de alunos da unidade de São Cristóvão do Colégio Pedro II saiu em defesa de uma colega transexual. A estudante, que, segundo a instituição, costuma usar o nome de batismo masculino e uniforme para meninos, como as normas da escola exigem, decidiu trocar as calças por uma saia num dos intervalos de aula.
 
Fontes: 1. BBC (12/09/2014); 2. Jornal o Globo (10/09/2014)
O inacreditável está sempre à espreita. Com as mídias sociais, ele saiu da esquina e invadiu todas as frestas da vida comum e banal. Imiscuiu-se no cotidiano disfarçado de hesitação e medo de errarmos com quem quer que seja. Um monte de palavras está quase banida, pois apesar de dizer as coisas como são, causam desconforto para gente excessivamente ciosa de sua especial forma de ser. No lugar das palavras, expressões logorreicas e inodoras. De fato, vive-se a era do ultra politicamente correto. Um desvio de olho, julgado como ofensivo e um sofrerá rajadas de posts nas redes sociais que ameaçarão destruir a vida do desditoso coitado pelo escorregão no linguajar; ou, pior, um ato por absoluta inadequação neste enfatuado mundo novo.
A juíza recebera uma denúncia. O sujeito, talvez por uma compulsão sociopata e meio assassina, tinha fetiche em ter relações desprotegidas, sendo que ele tinha aids. Antes, ele havia sido acompanhado pelo pessoal da saúde e prevenção de doenças sexualmente transmissíveis e mesmo depois de várias sessões de aconselhamento não mudou sua sanha. Recusava a se submeter a tratamentos e seguir qualquer regra protetiva. Era um estilo de vida viciado na vertigem do perigo.
Depois de tanto lutar, o serviço sanitário resolveu denunciá-lo às autoridades. Ele não se fez de rogado. Manteve sua conduta marginal infectando gente por uma regra louca de quem vive numa roleta russa. A equipe, temerosa em ferir a suscetibilidade do transmissor de vírus, enfatizou que não tinha remota intenção de criminalizar seu comportamento sexual. Não queria se meter nisso, apenas desejava proteger a sociedade, mas pela declaração, ele podia continuar pegando quem quisesse o que era, por si, uma aberração lógico-jurídica.
A juíza estava perplexa. Mas também se via acuada. A lei devia ser cumprida. Afinal, o tal usava de ardil infame para lograr seu intento nefasto. Era a plenitude de sua individualidade sendo exercida, carecia de ser respeitada. Então, resolveu dar-lhe um puxão de orelha, embora um tanto receosa: ele devia parar imediatamente de contaminar as pessoas. Um tanto amedrontada, prometeu multa e cadeia. Escapa-nos se se referia a vítimas de um sexo só, de dois, três ou algo entre qualquer coisa e bicho de pena e pelo.
II
Uma pessoa adolescente resolveu ir de saia à escola. Colégio tradicional, destes com farda centenária, chamou-o/a, que seja, a criatura e recomendou voltar a usar a farda regular, pois era a norma. Mas isso virou um imbróglio que abalou a nação. Revoltados, montes de alunos do sexo masculino – daqui a pouco vai ser difícil este tipo de definição – resolveram se solidarizar com a pessoa “discriminada” e usaram saias também como se fossem escoceses tropicais. E ainda posaram como dançarinas de cancan. De novo, ela (a criatura) podia exercer sua individualidade e impô-la ao maior número de pessoas.
Ora, a pessoa que era uma minoria, tornou-se maioria num abrir e fechar d’olhos. Logo, há que se criar nova minoria para que o mundo volte a funcionar em sua torta normalidade. As minorias tem o poder de nos causar vergonha de sermos maioria ou normais como se chamava antigamente. A subversão da norma é o padrão e chegou-se a um estranho quadro: não basta proteger uma minoria como se fosse composta de bichinhos em processo de extinção, deve-se também mimetizar de quantos existam por aí.
Neste tempo líquido – olha o Bauman aí –, fluido e sem referenciais ou, por outra, com trocentos referenciais, tudo vale e nada vale ao mesmo tempo. Mundo quântico, diriam os metafísicos moderninhos, provocaria o Pondé. Curiosamente, existem coisas contra as quais há certa unanimidade para se bater: a religião no topo e qualquer pensamento que era normal até outro dia. Liberdade absoluta para toda minoria. Submissão e vassalagem de todos os demais. Por um modo enviesado, a maioria começa a ganhar cara de bicho perdido, em processo de extinção, mas aí será minoria e ganhará status com suas esquisitices normais.