1. Uma juíza da cidade de Seattle, nos Estados
Unidos, determinou que um homem soropositivo pare de contaminar outras pessoas
e se trate. O homem, identificado apenas como "AO", infectou
outras oito pessoas nos últimos quatro anos.
2. RIO - Um grupo de alunos da unidade de
São Cristóvão do Colégio Pedro II saiu em defesa de uma colega transexual. A
estudante, que, segundo a instituição, costuma usar o nome de batismo masculino
e uniforme para meninos, como as normas da escola exigem, decidiu trocar as
calças por uma saia num dos intervalos de aula.
Fontes: 1. BBC (12/09/2014); 2. Jornal
o Globo (10/09/2014)
O inacreditável está sempre à espreita. Com as mídias sociais, ele saiu
da esquina e invadiu todas as frestas da vida comum e banal. Imiscuiu-se no
cotidiano disfarçado de hesitação e medo de errarmos com quem quer que seja. Um
monte de palavras está quase banida, pois apesar de dizer as coisas como são,
causam desconforto para gente excessivamente ciosa de sua especial forma de
ser. No lugar das palavras, expressões logorreicas e inodoras. De fato, vive-se
a era do ultra politicamente correto. Um desvio de olho, julgado como ofensivo
e um sofrerá rajadas de posts nas redes sociais que ameaçarão destruir a vida
do desditoso coitado pelo escorregão no linguajar; ou, pior, um ato por
absoluta inadequação neste enfatuado mundo novo.
A juíza recebera uma denúncia. O sujeito, talvez por uma compulsão
sociopata e meio assassina, tinha fetiche em ter relações desprotegidas, sendo
que ele tinha aids. Antes, ele havia sido acompanhado pelo pessoal da saúde e
prevenção de doenças sexualmente transmissíveis e mesmo depois de várias
sessões de aconselhamento não mudou sua sanha. Recusava a se submeter a
tratamentos e seguir qualquer regra protetiva. Era um estilo de vida viciado na
vertigem do perigo.
Depois de tanto lutar, o serviço sanitário resolveu denunciá-lo às
autoridades. Ele não se fez de rogado. Manteve sua conduta marginal infectando
gente por uma regra louca de quem vive numa roleta russa. A equipe, temerosa em
ferir a suscetibilidade do transmissor de vírus, enfatizou que não tinha remota
intenção de criminalizar seu comportamento sexual. Não queria se meter nisso,
apenas desejava proteger a sociedade, mas pela declaração, ele podia continuar pegando
quem quisesse o que era, por si, uma aberração lógico-jurídica.
A juíza estava perplexa. Mas também se via acuada. A lei devia ser
cumprida. Afinal, o tal usava de ardil infame para lograr seu intento nefasto.
Era a plenitude de sua individualidade sendo exercida, carecia de ser
respeitada. Então, resolveu dar-lhe um puxão de orelha, embora um tanto
receosa: ele devia parar imediatamente de contaminar as pessoas. Um tanto
amedrontada, prometeu multa e cadeia. Escapa-nos se se referia a vítimas de um
sexo só, de dois, três ou algo entre qualquer coisa e bicho de pena e pelo.
II
Uma pessoa adolescente resolveu ir de saia à escola. Colégio
tradicional, destes com farda centenária, chamou-o/a, que seja, a criatura e
recomendou voltar a usar a farda regular, pois era a norma. Mas isso virou um
imbróglio que abalou a nação. Revoltados, montes de alunos do sexo masculino –
daqui a pouco vai ser difícil este tipo de definição – resolveram se
solidarizar com a pessoa “discriminada” e usaram saias também como se fossem
escoceses tropicais. E ainda posaram como dançarinas de cancan. De novo, ela (a
criatura) podia exercer sua individualidade e impô-la ao maior número de
pessoas.
Ora, a pessoa que era uma minoria, tornou-se maioria num abrir e fechar
d’olhos. Logo, há que se criar nova minoria para que o mundo volte a funcionar em
sua torta normalidade. As minorias tem o poder de nos causar vergonha de sermos
maioria ou normais como se chamava antigamente. A subversão da norma é o padrão
e chegou-se a um estranho quadro: não basta proteger uma minoria como se fosse
composta de bichinhos em processo de extinção, deve-se também mimetizar de
quantos existam por aí.
Neste tempo líquido – olha o Bauman aí –, fluido e sem referenciais ou,
por outra, com trocentos referenciais, tudo vale e nada vale ao mesmo tempo.
Mundo quântico, diriam os metafísicos moderninhos, provocaria o Pondé.
Curiosamente, existem coisas contra as quais há certa unanimidade para se
bater: a religião no topo e qualquer pensamento que era normal até outro dia.
Liberdade absoluta para toda minoria. Submissão e vassalagem de todos os
demais. Por um modo enviesado, a maioria começa a ganhar cara de bicho perdido,
em processo de extinção, mas aí será minoria e ganhará status com suas
esquisitices normais.