segunda-feira, 6 de julho de 2009

O sujo não fala do mal lavado


A frase é um primor de desfaçatez, cito-a para que o leitor julgue por si. "O mais puro ali tem 4 mil pecados". Autor: sua sumidade que nunca recebeu um voto, sua exsselenssia, mais puro representante da abjeta figura do senador suplente, Wellington Salgado (PMDB-MG).

Referia-se o “senador” a seus colegas e à presente situação da casa mais suja que pau de galinheiro chamada Senado Federal. Esqueceu-se de nos esclarecer se faz parte desta nobre casta dos “mais puros”, com apenas 4 mil pecados. Tampouco sabemos como calculou o montante, quem sabe com algum pecadômetro. Certamente, sem nada para fazer, ocupou-se desta incrível arte. Reconheçamos, é preciso a tenacidade de um obsessivo compulsivo para tal feito.

Aliás, sua principal participação no senado, desde que lá aportou por obra e graça da sanha pemedebista por garfar cargos, o titular é o ministro das Comunicações. Anda também muito ocupado em nada fazer, julgue-se a atuação da TV digital, a agencia de comunicação, etc. Pois bem, o cabeludo gosta mesmo é de defender o indenfensável, é quase uma tara. Um senador, por descuido, recebe dinheiro sem que dele seja merecedor, chame-se o Salgado para defendê-lo. O colega recebeu caraminguás por baixo dos panos, ative-se o Salgado. O homem é o super defensor dos esquecidos, dos enganados, dos erros técnicos que ora abundam naquela terra de ninguém.

O indigitado “senador”, porém, apenas representa, ao paroxismo, a atitude mais desavergonhada – aqui entenda-se a arte de não ter vergonha quando for pego no mal feito – que se vê na maioria absoluta dos membros do legislativo nacional. A mesma lógica dos assassinos de milhões de judeus, magistralmente representado no filme “O leitor”: Eu só fazia o que todos faziam, diz a personagem principal em dado momento de seu julgamento. E fala, a infeliz mulher, com uma candidez que dá pena. Ela realmente cria no que falava.

Nisso diferem os senadores. Eles não acreditam no que dizem, é apenas um ato espontâneo de um caráter distorcido. Se um deles ousa mencionar ou se indignar – quase todos atacados por algum tipo de amnésia de si – são imediatamente atacados pelos acusados: você tem o rabo preso. Sabemos de coisas a seu respeito, ameaçam. E, pressurosos, laçam-se à cata das traquinagens cometidas pelos acusadores e acham. Quer dizer, mesmo que seja verdade o que diz o travestido paladino, é desmoralizado, donde se crê que sua acusação, pelo menos para a opinião pública, nenhum valor tem.

É de impressionar. Os sujos de plantão, pelo menos naquele momento, tratam de impingir as sujeiras aos demais: somos todos iguais, colega. Por que é que não acreditamos nisso?

A fábula de um deus morto


A polícia no sul da Índia está procurando dois homens que atacaram um "homem santo" hindu, cortando sua perna direita e fugindo com ela. Yanadi Kondaiah, de 80 anos, dizia ter poderes curativos na perna. 

Fonte: BBC Brasil

Rabdovairus estava com 80 anos. Desde jovem sentia-se destinado. Seria grande. De fato, como dizia um jogador com ego inversamente proporcional ao seu tamanho, costumava dizer em versão erudita as palavras de Deus a seu respeito - coisa da qual não tinha a menor dúvida -, afinal ele era um homem refinado: Ecce homo! O jogador dizia: esse é o cara. Mas no fim e ao cabo, dava no mesmo. Relato aqui para que o leitor se familiarize.

Cultivou com extrema dedicação sua formação, de tudo um pouco sabia responder. Conheceu segredos mágicos, embrenhou-se na mística da qual retirava obscuras sentenças enigmáticas, com o fito de impressionar aos circunstantes de suas laudatórias asseverações sobre si mesmo. Logo percebeu que no mundo de toscos em que vivia chamava a atenção e se destacava. Eram os auspícios da profecia sobre si.

As massas o atraíam e ele a elas, sedentas que estavam de um pequeno messias que satisfizesse seus sonhos merrecas de grandeza. Ora, ele era o grande, sentia mesmo que aquilo que tocava virava ouro e tudo corria como se os céus lhe abrissem todas as portas. Não que ele não tratasse de satisfazer aos caprichos dos deuses, afinal, eles eram zelosos em cobrar os favores que ofertavam.

Nada havia à frente de Rabdovairus. Tornou-se líder daquela arraia-miúda que lhe via como a um santo. A um abençoava com seus favores, a outro castigava com rigor minucioso e dedicado. Mas sentia que um destino maior lhe puxava como a força de uma maré de sizígia. Era nos altos salões que deveria estar. Delirava entre o poder e o sagrado. Um homem predestinado deve fazer de tudo para que nada impeça a sina, definida deste antes que os mundos existissem. Mas quanto cobrarão os deuses, pensava?

Os anos voaram e galgou todos os mandos que lhe foram possíveis. Sentia uma sede descomunal, uma gana devoradora por poder, mas adquiriu uma máscara plácida que ocultava as ondas revoltosas de sua alma. Com a destreza de um ourives espalhou seus eflúvios aziagos sobre a pobre ralé que lhe pariu e afinal, sobre todo o reino.

Dizia, como que a aplacar sua fúria por mando: sou santo. Citava santos em seu nome, movia-se como que em câmera lenta, não pela idade, mas como a passar sua presença que a tudo, pensava, ocupava. Ganhou a certeza de que tudo que tinha era seu por direito. Ele era um enviado, bastava sua presença para impor respeito e não havia mais que ajoelhar-se ante sua numinosa pessoa.

Nas entranhas, porém, de seus iguais, todos secos pela mesma glória, hienas à busca de carniça, e ainda um pouco do povoléu anestesiados pela canga, contudo famintos, viram um dia, um leve tremor em suas mãos, um tique no olho, outrora altivo, que piscou fora do tom. Mas se ele é santo se o comermos ficaremos saciados e tal como é, pois de que nos serve sua santidade?

Cresceu o burburinho: Rabdovairus pode ser devorado. Uma noite, deitado em seu leito esplêndido, dormiu seguro e embriagado por reverências que, pouco antes, a escumalha lhe dedicou. Sentia-se novamente no topo, tudo voltara ao normal. Nada à sua frente. Sem sentir, acordou na manhã seguinte sem os braços e pernas, embora uma ilusão lhe fizesse ainda vê-los. Vingança dos deuses por sua ousadia. Em frente ao palácio, restos de uma fogueira fumegante denunciavam o festim em que a mundiça que o glorificou comeu seu deus e roubou-lhe o poder.