As escolas primárias da rede pública e privada da província de Buenos
Aires – a mais populosa da Argentina, mas que não inclui a capital de mesmo
nome –, vão eliminar as notas baixas a partir de 2015, segundo confirmou à BBC
Brasil, nesta quinta, a Secretaria de Educação do governo provincial.
Fonte:
BBC Brasil (Leonardo Soares/UOL – 19/09/2014)
Deixa ver se
entendi bem. Uma escola argentina resolveu, à moda do exterminador do futuro,
exterminar as notas entre 0 e 4? Descobriram que o aluno ficava com a
autoestima nanica quando era presenteado com notas, digamos, em tons
avermelhados?
Ainda não foi
inventada uma forma de avaliar aluno sem um tipo qualquer de prova e uma
consequente nota, letra, conceito, ou algo que o valha. Por estas plagas verde-amarelas
já houve experiências em que se decretou que aluno nenhum seria reprovado. Ainda
vigora no ensino público. Um primor de conhecimento sobre a motivação humana.
Mas vejam que
genialidade de los hermanos. Não sei por que sinto cheiro daquele raciocínio do
cara que joga o sofá fora porque pegou sua digníssima em conjunção carnal no
próprio com um estranho – para ele, claro. E se a moda sobe Brasil acima, que
nem as frentes frias vindas da Patagônia? Que não se duvide, é capaz de amanhã
aparecer um oportunista deputado querendo propor uma lei nacional de expurgo
dos nesfastos 0, 1, 2, 3 e 4 em defesa da autoestima dos alunos incompetentes,
na verdade, para mascarar os desastres das estatísticas e resultados pífios em
competições internacionais em que sempre ficamos com os últimos lugares.
Sugiro que nas
competições mencionadas, haja uma lei obrigando que se leia, sempre, a lista de
cabeça para baixo, no que nos coloca em excelente posição. Será mais fácil.
Suspeito que propor que nos coloquem em posições mais para o topo, a despeito
de nossa indigência escolar, não será aceito, mesmo que seja pelo bem de nossa
autoestima ferida.
De fato, a mensagem passada e facilmente
entendida pelos alunos que não tiram menos que 5 ou que seguirão para o ano
seguinte independente da aprovação, ensina que o esforço não vale a pena.
Fortalece a preguiça dos professores que sabem que, se pouco fizerem, nada
acontecerá. As estatísticas educacionais serão infladas, os políticos venderão
números falsos na propaganda institucional e na eleição.
A lógica é
insana. Por causa de um aluno ou outro que ficará abatido e minimizado, segundo
dizem, desestimulado, afirmam outros, conduzem-no ao autoengano. O sujeito põe
o nome na prova e entrega. Nota: 5. Mas ele sabe que burlou o sistema. Cria-se
um cínico, o professor um mentiroso e o diretor, um hipócrita.
Como as coisas
andam na Argentina com fedor bolivariano, a ideia de jerico tem aquela típica
pretensão de estado totalitário que não apenas oferta serviços de baixa
qualidade, ele quer dizer o que é melhor para as pessoas, mesmo que elas não
queiram ou nem saibam que aquilo é bom para elas. Lembra minha mãe me obrigando
a comer jerimum que dava ânsia de vômito e ela dizendo: come menino, que é bom
pra saúde!
Acabar com o
bom e redondo zero e seus vizinhos até o quatro carrega outra lógica entordadora
da psique. Retira-se do indivíduo o exercício da responsabilidade. Poder-se-ia
criar monitorias, reforços, provas substitutivas: o arsenal é grande, mas dá
trabalho para o sistema. Que nem os professores municipais de São Luís que
passam metade do ano (todo ano) em greve, a despeito da ilegalidade de sua ação
– decretada em todas as instâncias – e quando são forçados a voltar, impõem que
ficarão muito cansados para repor tanta aula perdida.
Por fim, passar o aluno de
ano ou – ousadia! – decretar o fim dos zeros, retira do aluno com autoestima
abalada (tadinho!) a possibilidade de lidar com os revezes da vida. Mostra que
haverá sempre uma saída sem suor. Catequiza que não existe causa e consequência
nos atos ou omissões. Deseduca que o sofrimento pela perda, quando somos
culpados, nunca é nossa, mas de outro(s). Que não se deve nunca fazer autoavaliação
para reconhecer fracassos, sob pena de ficar com a autoestima dodói e não se
tornar aquele vencedor mixuruca que só é real nas redes sociais virtuais