“Chega de fiu
fiu” é uma plataforma on line na qual
mulheres podem denunciar assobios e outros rompantes da paquera masculina. As
denúncias vão para um mapa em que ficam registrados os lugares de ocorrência do
assédio. “Stop telling women smile”, outra campanha, é a versão negativa do
“sorria princesa” em inglês. Ordena que os caras não peçam que as mulheres
sorriam de suas gracinhas num país de analfabetos na própria língua.
Desde o ano
passado, o movimento feminista ganhou os jornais e as redes sociais contra a
famosa cantada da rua. Muitas mulheres alegam constrangimento e a ouvem não
como um elogio, mas como agressão. Sentem-se invadidas em seu espaço, dizem. A
coisa ganha um tom raivoso, às vezes. Na Europa, campanha semelhante usou o bom
humor. Numa peça de propaganda do movimento, mulheres agiam como homens e os
paqueravam descaradamente na rua. Provocavam, diziam pilhérias, além de outros
comportamentos, alguns nada elogiosos, como urinar na rua. Os homens apareciam
frágeis, indefesos e, às vezes, correndo para a proteção de sua mulher.
Por aqui, a
coisa vai azedando com o pedido do enquadre dos paqueradores-facínoras no
Código Penal. Talvez criar um Procom anti-fiu fiu. Imagine a balbúrdia. Quero
abrir um BO. Um sujeito, meio alto, magro, o rosto assim, assado, assobiou pra
mim quando passava e ainda, não satisfeito, me chamou de princesa. Pois não,
senhora, senhorita. Onde se encontrava o meliante? Numa obra, perto do mercado.
Minha senhora,
estamos sem pessoal, apenas na internete recebemos 1.453 reclamações e de
inquéritos abertos temos o dobro disso. O efetivo não dá conta nem de registrar,
quanto mais ir atrás dos supostos assediadores. Que São Wando no salve!
Quer dizer que
o senhor chamou a senhorita aqui presente de – desculpe o termo senhorita,
apenas reproduzo a palavra do acusado – “gostosa”? Não lembro, “seu juiz”.
Chamou, esse... esse... Calma senhorita. Meritíssimo, meu cliente não chamou a
parte autora – com o perdão da má palavra, senhorita – “gostosa”, disse que era
a “nora que mamãe pediu a Deus”.
É certo que
alguns homens são inconvenientes e usam palavras que estão mais para a injúria
que elogio, mas fazer um rebu contra toda e qualquer manifestação como se se
cometesse o pior dos crimes ou que dele derivasse todas as inaceitáveis
violências contra as mulheres, é um pouco demais. Reduzir a crime, pior, num
país que mal cumpre as lições elementares de segurança de sua população. Será
que uma paquera, o assobio, ataca o corpo de uma pessoa, sua liberdade, sua
integridade e dignidade pessoal?
Seu delegado, quero
registrar que desde que a lei anti-fiu fiu passou a vigorar nunca mais na vida
recebi um único e miserável lúbrico olhar. Passo na frente da obra, do posto de
gasolina, na roda de vendedores ambulantes e nada. Cadê os homens? Processarei
o estado por desmerecimento. Sinto-me atingida nos meus brios femininos e na
minha autoestima. Outra concluía o contrário. Desemprego, uma separação após
vinte anos por uma sirigaita mais jovem. Mas ao passar pela construção: “Ei
linda! Se eu sou teu príncipe, dá um sorriso.” Nem olhei pra trás, disse com um
sorriso maroto. Nem tudo está perdido, consolou-se.
Há quem diga
que a punição ao dependente químico deve ser igual a uma infração de trânsito.
Não se sabe como isso funcionaria. Digo que se use o bom humor para educar o
troglodita brasileiro, como se educa para que se mantenha a cidade limpa. Será
como mudar a condição protohumana, anterosimiesca, para a sapientidade, duas
vezes (Homo sapiens sapiens), mas não
um acovardado, um afrouxado espécime masculino.
Neste domingão
de maio, um fiu fiu a todas as lindas mães leitoras.