quinta-feira, 12 de julho de 2012

Para Roma com Amor


“Para Roma com Amor” é o mais novo filme da grife Woody Allen. Suas últimas obras tem se realizado em cidades européias como se fossem elas mesmas as protagonistas. Vicky Cristina Barcelona. Meia Noite em Paris. Três outros filmes foram rodados em Londres, mas sem o nome desta cidade em seus títulos.
Sim, Allen continua colecionando prêmios, beliscando Oscars e ganhando muito dinheiro – “Meia Noite em Paris” faturou mais de 150 milhões de dólares –, mas tenho saudade do Allen de Nova York, cidade onde rodou, para mim, seus melhores filmes. Quando digo melhor, quero dizer aquilo em que este grande autor, diretor, roteirista, escritor mais se destaca: os diálogos entre os personagens. Os tipos tão humanamente parecidos com o homem comum, porém com inteligência e humor embarcados e incrível capacidade de rir de suas próprias misérias.
Para Roma com Amor é, em minha opinião, triste. Porque embora todo ator hollywoodiano queira ter uma participação nos filmes de Allen em seu currículo filmográfico, parece que está cada vez menos atraente sob o ponto de vista da qualidade. Os diálogos são óbvios. As gagues são clichês e alguns atores foram protocolares e artificiais. A fotografia do filme, contudo, é linda porque Roma em si é melhor que qualquer cenário. E só.
As quatro histórias seguem em paralelo e em vários momentos tive a sensação como se estivesse numa sala de cinema e de repente alguém chegasse e dissesse: agora atravesse a rua e entre no cinema em frente para ver o filme que está sendo projetado lá. Talvez o autor quisesse produzir esta sensação, sei lá. Mas com que propósito?
O próprio Allen participa do filme. Mas é uma caricatura daquilo que foi. E não tem nada a ver com velhice – Allen tem 77 anos -, simplesmente a veia criativa parece estar esgotada. Um dos personagens, talvez o mais interessante, mas repete algo do “Meia Noite em Paris”, é o de Alec Baldwin  (John), que encontra a si mesmo no início da carreira – o personagem teria vivido lá – e tenta dizer a si mesmo que evite certos erros antes que estrague tudo. É a futurologia reversa, que é sempre interessante como ponto de partida, mas...
Roberto Benini (Leopoldo), outro personagem – acho que foi uma concessão a um ator de destaque na Itália – continua o mesmo. Ele é aquele tipo de ator que você não sabe quando ele atua ou quando é ele mesmo. Repete-se no filme que lhe rendeu um Oscar de melhor ator em 1999, “A Vida é Bela”.  Allen, com este personagem, critica a produção de subcelebridades instantâneas. É entediante.
Os demais personagens dispensam comentários. Estão lá para compor os outros quadros, afinal são quatro estórias que perambulam em paralelo. Sim, Penélope Cruz (Anna) faz uma prostituta que atua com dois outros atores italianos num triângulo amoroso involuntário e neste imbróglio o filme tem alguns momentos engraçados.   
Mas não quero ser tão rabugento assim, ainda gosto de ver o Woody Allen, só espero que da próxima vez – o próximo projeto dele já está em andamento - volte aos velhos temas que sabe fazer tão bem ou explore uma veia na qual ele foi ótimo: o suspense em “Match Point”, ou ainda o drama comovente em “O Sonho de Cassandra”. O cenário desse próximo filme será em San Francisco, California. Ele mesmo indica que será um drama.
O mais terrível na minha sessão de cinema, a despeito de minha opinião aqui expressa não tão favorável ao filme, foi estar perto por um tempo – claro, eu mudei de assento – de um abestado que dava gargalhadas tão altas que acho que se não for uma pessoa com QI abaixo de 60, devia ser só mais um mal educado.

Shame


Todos nós estamos familiarizados com as terminologias técnicas de algumas doenças mentais que, nestes tempos estranhos, dão a desconfortante sensação de que cada um guarda um mal em si, pronto para se manifestar no primeiro deslize. Talvez porque haja uma verdadeira sanha de patologizar tudo que é apenas humano, talvez porque dar nomes a doenças seja uma forma de dominá-las, circunscrevê-las  a um campo passível de intervenção medicalizante na maior parte das vezes.
Shame (2012), filme que causou certo impacto entre o público cinéfilo, explora uma destas facetas do comportamento humano, a sexualidade, porém, sem dar nome ao que chamaríamos de compulsão sexual (ou seria um transtorno obsessivo compulsivo com característica sexual?). O personagem vivido pelo excelente Michael Fassbender, Brandon, é um sujeito que chegou ao topo da carreira, vive numa metrópole e tem um lado oculto na vida que nenhum dos amigos consegue sequer imaginar.
Sem explicações de qualquer natureza, o diretor expõe este personagem de forma crua, sem limites, num enquadre temporal onde a única referência ao passado é sua irmã Sissy (Carey Muligan), atriz que fez outro filme muito elogiado, Drive, que estreou também este ano. Assim como não há passado, também não se vislumbra qualquer futuro. Não no sentido das aspirações típicas do que se convencionou chamar, mas já é um termo velho, sociedade pequeno-burguesa cujo sonho é ter três carros, propriedades e uma conta recheada que permita ser um alegre consumidor de badulaques de luxo.
À medida que a história avança, Brandon - que já vive numa roda viva de sexo com prostitutas e qualquer outra mulher disponível - vai perdendo completamente o controle. Sites, revistas, filmes, encontros e masturbação nos intervalos. Tudo isso começa a expô-lo perigosamente.
A chegada da irmã repentinamente agrava o frágil equilíbrio que ele ainda mantinha, se é que se pode chamar assim. Sissy é uma clássica loser que manipula os outros emocionalmente com uma dependência e carência quase mórbida de qualquer um que dela se aproxime.
Em certo momento, ele está à caça num bar. Sua postura é completamente suicida e não está disposto a fazer qualquer concessão, até porque todos os limites que conhecia não existem mais. Esta guinada enlouquecida resulta numa surra com a expulsão do bar e a volta às ruas. Noutra virada pendular, aproxima-se de uma colega de trabalho com quem ensaia toda a clássica postura da corte, jantar, conversas e, só então, sexo. Nem precisa dizer que esta tentativa de normalidade dá em nada. Aliás, uma leitura possível é dizer que o personagem é o que é e nada mudará sua desgraçada existência.
Em paralelo, a presença de sua irmã lhe tira toda a liberdade em sua casa onde ela se instalou e de onde não tem a menor intenção de sair. Numa das conversas entre si, os personagens reservam duras palavras de parte a parte. Eles são miseravelmente iguais e diferentes ao mesmo tempo. Mas não há salvação para nenhum dos dois. Estão condenados a serem fúteis, escravos das paixões, inconsequentes e perdidos dentro de si mesmos, pois não há nestas vidas quaisquer pontes emocionais que lhes permitam tão somente contatar outros sem precisar trocar fluidos corporais de qualquer natureza.

terça-feira, 10 de julho de 2012

Não há sugismundo que aguente


Contendo óleo ungido pela Igreja Mundial do Poder de Deus, o uso deste sabonete proporciona unção de milagre em todos os campos da vida. seja na saúde, no relacionamento familiar, no crescimento financeiro,
enfim em todos os setores da vida.

Fonte: Blog do Pavarini (texto copiado do site do sabonete “Sê tua uma bênção” – http://www.sabonetesetuumabencao.com.br/ - 4/07/2012)
Então o senhor gostaria de um plano de marketing e negócios para incrementar a sua igreja que está, digamos, andando devagar? Alguém o recomendou? Como o senhor ficou sabendo de nossos serviços especializados? Não importa, o senhor veio ao lugar certo. Estamos no mercado há vários anos e podemos apresentar nosso portfólio com vários cases de sucesso.
Este nicho de mercado cresce mais de 20% ao ano. Não à toa o IBGE registrou um aumento considerável de adesão aos serviços de igrejas com características muito particulares. Vou lhe dizer três características simples para bombar: 1. Não sobrecarregue o cliente com obrigações de qualquer qualidade;2. Enfoque no indivíduo e os ganhos que ele  poderá obter, caso se filie ao seu negócio, quero dizer, igreja. Ou nem tanto, basta participar com alguma regularidade em seus serviços; 3. Tenha planos claros de arrecadação, é preciso maximizar lucros porque ainda que o investimento até seja modesto em alguns casos, se não entrar tutu você entrará para a triste estatística de negócios que fecham. A propósito, temos vários planos de acordo com as necessidades e capacidade de pagamento do interessado. Só para finalizar este item, uma dica importante: pedir dinheiro é uma furada. Você deve sempre dar algo para o cliente. Nem que seja um clips, desde que ele tenha sido ungido de algum modo e você encontre uma ideia criativa para simbolizá-lo. O público adora este tipo de coisa.
        Temos aqui um plano padrão que apenas você deverá adequar uma ou outra coisinha. O nome da igreja é fundamental. É bom nome comprido. Não esquecer as palavras internacional, mundial, cósmica – hoje esta já se aceita melhor. O nome que você vai se dar. Pastor é algo totalmente demodé. Até Bispo, que outrora impressionava, já está ficando ralado. Apóstolo ainda pega bem. Agora, coisa fresquinha, quase ninguém está usando é Potestade. Diácono Celestial. Este é legal. Tem a ideia da humildade e ao mesmo tempo de algo pomposo. Aliás, misturar nomes é a tendência. Não se preocupe que nós oferecemos a justificativa argumentativa teológica para aqueles mais exigentes.
        Definido o nome, passa-se ao tipo de ação. Esta franchising vai ser para cura de enfermos, riqueza, causas emocionais, curas espirituais (inclui expulsão de demônios)?. Se você não tiver estômago, a gente arruma uns atores que imitam um endemoninhado que é uma beleza. Aviso. Às vezes aparece gente possessa de verdade e aí a coisa pega. É de bom alvitre ter uns marombados para auxiliar o trabalho. Ainda tem gente tentando vender de tudo num combo. Não funciona. Alguns cresceram dessa forma, mas agora melhor especializar. Tem menos gente, mas dependendo do período e do público focado, não falta cliente.
        Linha de produtos. Este é o grande filão. É, hoje, a melhor forma de arrecadação. Não se deve deixar de correr a sacolinha, por que sempre pinga alguma coisa. Tem um pessoal que foi cliente nosso, que a gente deu umas poucas dicas e eles usaram a criatividade e estão vendendo barbaridade. Mas tem que dar o toque espiritual na coisa. Olha que fantástico! Um apóstolo aí está vendendo sabonete ungido. Meu amigo, olha que sacada genial. Sabonete sugere limpeza. Imagine um troço desse ungido com óleo sacrossanto, vindo de Israel que só para consagrá-lo o cara subiu três morros e passou 77 dias em jejum? 
        Livros, cds, dvds, isto é de praxe. Contrate alguém que tenha boa escrita para ser seu ghost writer... Como? Não sabe o que é? Não se preocupe, está no pacote. Enfim, vender estas quinquilharias. Se forem bem produzidos, tem mercado cativo. A vantagem é que o povo compra não pelo preço real, mas pelo que ele supõe que o recurso arrecadado servirá. Isso permite aumentar o preço. Então, não esqueça. Cada cd sustentará, no mínimo, duas crianças órfãs. Um livro ajuda um pobre missionário perdido na caixa prego da África. Registre. É sempre bom ter alguém se acabando na África para salvar aquele continente perdido nas trevas da ignorância espiritual.
        Uma última dica que precisa de arte e esperteza para usar. O livro sagrado tem que estar presente, mas não muito. É bom usar como mote, uma desculpa para justificar uma ideia mirabolante, mas daí em diante fica por sua conta e capacidade de fazer bem a firula. Fique tranquilo, ninguém se importa em checar nada, desde que o show produza bom espetáculo e mantenha o cliente na eterna expectativa de ganhar tudo que é dele porque sei lá quem disse que ele é príncipe e merece tudo de melhor.