Luiz Felipe Pondé (filósofo)
SOU CONTRA o aborto. Não preciso de religião para viver, não acredito em Papai Noel, sou da elite intelectual, sou PhD, pós-doc., falo línguas estrangeiras, escrevo livros "cabeça" e não tenho medo de cara feia.
Prefiro pensar que a vida pertence a Deus. Já vejo a baba escorrer pelo canto da boca do "habitué" de jantares inteligentes, mas detenha seu "apetite" porque não sou uma presa fácil.
Lembre-se: não sou um beato bobo e o niilismo é meu irmão gêmeo. Temo que você seja mais beato do que eu. Mas não se deve discutir teologia em jantares inteligentes, seria como jogar pérolas aos porcos.
Esse mesmo "habitué" que grita a favor do aborto chora por foquinhas fofinhas, estranha inversão...
Não preciso de argumentos teológicos para ser contra o aborto. Sou contra o aborto porque acho que o feto é uma criança. A prova de que meu argumento é sólido é que os que são a favor do aborto trabalham duro para desumanizar o feto humano e fazer com que não o vejamos como bebês. E não quero uma definição "científica" do início da vida porque, assim que a tivermos, compraremos cremes antirrugas "babyskin" com cartão Visa.
Agora o tema é o "retorno" do aborto. O aborto entrou na moda neste segundo turno. É claro que esse retorno é retórico. Desde Platão, sabe-se que a democracia é um regime para sofistas e retóricos.
A relação entre democracia e marketing já era sabida como essencial desde a Grécia Antiga. Por que o espanto quando os candidatos, sabendo que grande parte da população brasileira é contra o aborto (talvez por razões religiosas vagas, talvez por "afeto moral" vago), se lançam numa batalha pelo espólio do "direito à vida"?
O marketing é uma invenção contemporânea, mas a necessidade dele é intrínseca a qualquer técnica que passe pelo convencimento de uma maioria, desde a mais tenra assembleia de neandertais.
A democracia é, na sua face sombria, um regime da mentira de massa. Quando essa mentira de massa é contra nós, reclamamos.
Não há nada de evidentemente justo em termos morais ou de moralmente "avançado" na legalização do aborto. O que há de evidente em termos morais é a desumanização do feto como processo retórico (exemplo: "Feto não é gente") e a defesa de uma forma avançada de "safe sex": "Quero transar com a "reserva de comportamento legal" a meu favor. Se algo der errado, lavo".
E não me venham com "questão de saúde pública". Esgoto é questão de saúde pública. A defesa do aborto nessas bases é apenas porque o aborto legal é mais barato. Resumindo: "Safe sex, cheap babies". E não me digam que o feto "é da mulher". O feto "é dele mesmo". E não me digam que "todo o mundo avançado já legalizou o aborto", porque esse argumento só serve para quem "ama a moda" e teme a solidão.
Não pretendo desqualificar a angústia de quem vive esse drama. Longe de mim! Mas em vez de gastarmos tanta "energia social" na defesa do aborto, por que não usarmos essa energia para recebermos essas crianças indesejadas?
Vem-me à mente dois exemplos, aparentemente de campos "opostos". Deveríamos aprender com a Igreja Católica e seu esforço de criar redes de recepção dessas crianças, aparando as mães em agonia e seus futuros filhos à beira da morte.
Por outro lado, são tantos os casais gays masculinos (os femininos sofrem menos porque dispõem de "útero próprio") que querem adotar crianças e continuamos a julgá-los, equivocadamente, penso eu, incapazes do exercício do amor familiar.
Sou contra a legalização do aborto porque o considero um homicídio. Muita gente não entende essa implicação lógica quando supõe que seriam razoáveis argumentos como: "A legalização do aborto permite a escolha livre. Se sou contra, não faço. Se minha vizinha for a favor, ela faz".
Agora, substitua a palavra "aborto" pela palavra "homicídio", como fica o argumento? Fica assim: "A legalização do homicídio permite a escolha livre. Se sou contra, não faço. Se minha vizinha for a favor, ela faz".
Quem é a favor do aborto não o é por razões "técnicas", mas por "gosto" ideológico.
Aqui falo sobre um monte coisas de meu universo de interesse. Filmes, livros, família, política, religião e psicologia. Também reproduzo textos publicados em jornais de São Luís (MA).
segunda-feira, 11 de outubro de 2010
Deus e o diabo (aborto) na terra do sol
Detesto horário eleitoral, disse Madronho. Eu quis saber o porquê. Antes que respondesse, eu, com ar professoral, defendi a necessidade do eleitor assistir ao horário eleitoral para saber das propostas dos candidatos. Madronho ouviu enfastiado, até que respondeu. Olhe, eu sei que o senhor é aí homi de muito conhecimento, cheio de leitura e eu não tenho nem uma coisa nem outra, mas não sou besta. Eu até assistia ao horário eleitoral, mas eles só dizem a mesma coisa. Prometem, prometem e no final das contas cadê o prometido? Eu não podia discordar muito do Madronho e, teimoso, insisti que assim mesmo convinha ouvir, até para saber se algum fala qualquer coisa que faça sentido para que se possa votar. Ele foi respeitoso, mas deu toda a indicação de que não estava nem aí para o meu palavrório.
Olha aí, já está quase na hora. Vamos testar os dois candidatos a presidente agora no segundo turno. É uma boa oportunidade, pelo menos são apenas dois falando abobrinha. Ele concordou, embora preferisse ouvir suas músicas no tocador de mp3 do celular.
Começa a entrada. De acordo com a lei patati, patatá... horário eleitoral... etc e tal. Eu, de soslaio, acompanhava a linguagem corporal de Madronho que mantinha um ar blasé. Entra o primeiro candidato.
Eu sempre fui a favor da vida. Só uma pessoa capaz de colocar a sua vida em risco como eu fiz – toda mãe faz – pelo meu país, pode vir aqui e defender a vida. É uma infâmia o que estão fazendo comigo. Colocam palavras e opiniões na minha boca que eu nunca disse. Eu sou a favor das mulheres que fazem aborto porque é uma injustiça com elas. Os cristãos verdadeiros estão comigo, líderes renomados da cristandade, eles sabem que preciso de seu apoio e terão muito apoio no meu futuro governo, se Deus quiser. Bastará pedir uma estaçãozinha de rádio e tv, claro que para divulgar a mensagem de vida que eu prego também. Neste sentido estamos assim – encostou os dois indicadores em declaração de intimidade. Como não sou a favor da vida? Sou mulher, sou mãe, agora avó (e coruja – fez que segurava uma lágrima) e guerrilheira, desculpem, quis dizer guerreira pela causa da vida, vejam bem. Em off alguém esbravejou por causa da ideia de gênio de fazer a fala ao vivo. A pretensão era dar mais naturalidade à candidata. Eu agradeço a Deus por ter sido a mais votada. Então é com amor no coração, sob a proteção de nossosenhor, que vamos ganhar. Em nome do pai, do filho, espiritosantoamém. Beijou a pontinha dos dedos, indicador e polegar, que chegaram à boca em união contrita.
Madronho me olhou entre estupefato e incrédulo. Eu calei. Que ia dizer? Entra o segundo candidato.
Todos me conhecem. Sou a mesma pessoa desde que nasci. Eu não mudei de opinião. Sempre fui a favor da vida. É convicção. Madronho estourou. Lá vem esse aí também! Eu fiquei murcho no meu canto. E o candidato continuou. Eu não sou como umas e outras que estão por aí querendo o seu voto, que ontem era quase atéia, sei lá, e hoje mostra uma conversão falsa. Eu sou um cristão praticante e, como diria aquele célebre personagem de novela, praticante e juramentado. Sou a favor dos valores da família. Dos valores cristãos. Eu pelo menos rezo todos os dias, perguntem para minha mulher. Aliás, mulher é coisa sagrada pela sua missão de mãe, então, uma pessoa em sã consciência não pode ser a favor do aborto. Eu sou contra e ponto final. Não digo isso aqui só para agradar ao eleitorado. Mostram uma imagem do candidato lendo a Bíblia para uma eleitora. Volta. Estão vendo. Sou leitor fanático da Bíblia. Aquela moça, coitada, estava desencaminhada, acho até que queria fazer um aborto, mas ali, no meio da rua, eu a encaminhei à boa senda. Mas não me arrogo disso não para convencer você, eleitor, você vota no melhor e, casualmente, o melhor sou eu. Que os irmãos fiquem na Paz. Um beijo no coração.
Madronho me fuzilou com os olhos que cobravam uma explicação. Eu me saí com esta. Tá, Madronho, não aconteceu o que eu disse, mas na próxima eleição, quem sabe.
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