domingo, 12 de abril de 2015

Vaca e roedores



Enquanto o tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, entrava na sala da CPI escoltado por mais de dez deputados correligionários para demonstrar força, um servidor da Casa causou tumulto, correrias e criou uma cena inusitada ao abrir uma caixa e soltar cinco pequenos roedores: dois hamsters e três esquilos da mongólia.

Fonte: DE BRASÍLIA (Folha, 10/04/2015)

Estavam todos compenetrados, circunspectos, austeros, conspícuos e invento, circunstanciosos, com o grave momento em que um sujeito, tesoureiro, que tem vaca no nome, deporia sobre traquinagens financeiras que, por hora, lhe custa – a nós, melhor dizendo – a hospedagem em um presídio.
A cena é teatral no sentido em que Bárbara Heliodora deplorava. Uma (es)quadrilha de deputados entra antecipando o depoente que vem ladeado por seu defensor – não público, mas dono de uma big banca advocatícia em São Paulo – que, ironia, tem urso no nome. Simularam a entrada num ringue de luta livre ou algo que o valha. Ao dito interrogado faltou o hobby com capuz típicos dos lutadores, mas a barba veneranda lhe fazia as vezes da indumentária.
Eis que reles servidor da Câmara, um tal Oliveira, solta meia dúzia de ratos que trataram de se espalhar entre os pés ensapatados de suas magnificências. Foi como abrir uma caixinha de Pandora. De alguns dos circunstantes, se ouviram gritinhos de susto denunciadores de outras opções, mas, maldade à parte, era mero pânico dos roedores. Não há que se polemizar com tal medinho, pois pode atacar a uns e outros indistintamente. Pois devaneio, perdão. De qualquer forma um ambiente que já pedia intervenção do Ibama devido a animália recém chegada, tornou-se caso de atentado à nobre missão de suas louçanias esclarecerem as reinações de uma vaca – que ainda não foi para o brejo – e seu partido.
Ratos, como se sabe, são bichos extremamente adaptáveis. Perseguem a história da civilização não exatamente como companheiros, que nem os cães, mas como ferozes concorrentes. De tão decantada capacidade, diz-se até que, numa provável guerra atômica, sobreviveriam ratos e baratas. Foge-me da mente a fonte de tal informação. E a mídia, na pressa, alardeou: ratos foram soltos durante a CPI. Eis que não eram ratos, embora roedores. Um deputado enciclopédico, taxonomista nas horas vagas, esclareceu que se tratavam de inofensivos hamsters e esquilos da Mongólia. Estes últimos, provavelmente, contrabandeados por súcias chinesas.
A balbúrdia instalada: deputados de quatro à cata dos bichos, outros subiram nas poltronas, até que foram salvos pela polícia legislativa que, apesar do nome, é composta de brucutus de terno por bem das aparências, acostumados a enfrentar guabirus. Enquanto uns catavam os animais, outros tratavam de argoelar o terrorista Oliveira e o recambiaram para depoimento reservado. Sua eminência, presidente da casa, tratou de exonerá-lo incontinenti. O terrorista, em sua defesa, imitando a quem servia horas antes, a saber: suas subdivindades, os deputados, apenas disse que era vítima de um equívoco.
Havia que dar conta da barafunda, assim suas culminâncias se dividiram salomonicamente. Enquanto uns ouviam as parolagens da vaca, outros deliberariam sobre os roedores. E logo ouve amarga divisão entre estes últimos, pois uma banda defendia encaminhá-los para laboratórios e a outra sugeria dá-los ou soltá-los – não necessariamente nesta ordem. 
A vaca mugiu azedumes contra outros partidos professoralmente e com direito a data show e, à moda petista, disse que todo mundo fazia assim, enquanto asseverava pela enésima vez que era tudo legal, embora “legal”, no Brasil, sempre inspire suspeitas, especialmente se um político fala. Terminou a audiência e, não fosse o atentado do desmiolado Oliveira, teria passado em quase brancas nuvens.