domingo, 13 de janeiro de 2013

O seio de Vênus


Um raio destruiu uma réplica de uma estátua de Vênus de Milo em Yarrawonga, na Austrália, e a única parte que "sobreviveu" intacta ao choque foram os voluptuosos seios da escultura, segundo a emissora de TV "ABC News".

Fonte: G1 (10/01/2013)

Acho que vocês acreditarão nesta história. Num tempo em que milhares de pessoas creem e esperam um rocambolesco fim de mundo de uma lenda pseudocientífica, este relato apenas parece não ter pé nem cabeça. A coisa aconteceu longe daqui, mas, vocês sabem, há quem diga que nós estamos a distância de apenas seis pessoas de qualquer outra da terra. Aos que flutuam, explico. Um sujeito perdido na Ásia conhece alguém que conhece outro e este outro e, seis pessoas depois, alguém que me conhece. Capite? Deixa pra lá!
O fato é que eu conhecia o cara. Saiu do Brasil há muito tempo. Disfarçou-se de gringo e vive como um. Meteu-se a Artista. Adotou o nome de Tom Finley, mas aqui era conhecido por Toim Fila. Sim, de filar os outros. Fez vida no estrangeiro. Deu-se bem, como se diz. Há muito não nos falávamos e o contato deu-se justo por um acidente inusitado. Para ele, digo. Até que contei o que estava por trás de um suposto atentado divino, embora a divindade de quem privo amizade nem de longe conheça a banda podre do islamismo jihadista.
Enfim, vocês sabem que Zeus é tinhoso para tomar múltiplas formas. Pegou muitas virgenzinhas e ninfas incautas que entravam na conversa fiada dele, quando se transmutava de alguma coisa. Para preencher o tédio, ele dizia. Agora é pior, porque nem culto lhes prestam, danados que estão os gregos entre greves sem conta, desemprego e aperto econômico. Ele diz que está melhor assim, pois a situação por lá nem ele resolveria. Se pedissem, ele teria que enrolar, passar para algum deus subalterno. Talvez até o Hades, porque a confusão está mais para seus domínios.
Um parágrafo a mais e ainda não desenrolei a história. Aqui vai: Zeus pedira uma nova cópia da Vênus de Milo para decorar seu apê novo montado num monte aqui pelo Brasil. Disse que quer assistir as Olimpíadas de camarote mais perto. Aluguel ou  a compra de imóvel estarão pela hora da morte.
A Vênus original é uma estátua pra lá de gostosa e sensual, mas que, coitada, está sem os dois braços. Ela remete à perfeição da forma feminina, mas, aqui pra nós, desconfio que o escultor quebrou os braços depois de um arranca rabo com a patroa. A forma está lá, mas impotente, sem defesa. Diz-se que ela, a patroa, quando zangada, dava umas azunhadas no pobre escultor porque dizia que ele não trazia nada pra casa com aquela profissão.
Então, o pedido da cópia – com braços – foi ideia de Zeus. O Toim Fila meteu-se a fazê-la. Preveniu que faria algo com muita liberdade artística com um quê de constestação contra a tirania da magreza e da moda capitalista que impõe modelos impossíveis de serem seguidos, blá, blá, blá... Zeus torceu o nariz para isso, mas como só o Toim se candidatou, resolveu aceitar. Sem grana para ir ver a verdadeira Vênus em Paris e sem inspiração, como um barco a vela numa bruta calmaria, Fila decobriu na Vênus de Willendorf sua musa perfeita. Com 24 mil anos de esculpida, não poderia estar em mellhores condições.
A um só tempo satisfaria sua visão livre da forma de mulher, constestaria como um fanático da Peta o padrão da moda e daria a Zeus uma gostosa para apreciar. Decidiu que não usaria instrumentos de qualquer espécie em sua Vênus, apenas as mãos como um amante que acaricia sua amada. Zeus também não gostou desta quase corneação, mas engoliu. Lembrem-se, o deus anda meio em baixa e aí se submete a engolir cururu desse tipo.
Chegou o dia da entrega da estátua. Zeus quase teve um troço, mas havia que manter as aparências. Dar chilique na frente do Toim, nem pensar. A maior raiva dele é porque queria lembrar sua amada Vênus. Ela inspirou o primeiro escultor. Mandou o pobre para o Hades quando ele quebrou seus braços. Era como uma fotografia querida e valiosa, já que a propriamente dita fugira com um sátiro que foi devidamente fulminado por um raio. Esqueci, junto com a Vênus. Mas Zeus nunca se recuperou do episódio.
A estátua estava coberta. Zeus, entediado, esperava. Toim fez uns rapapés e descobriu de forma teatral a obra. Estava radiante, mas seu riso morreu na boca quando o deus perguntou o que era aquilo. Deixe aí, disse ele, seco. Pegue o cheque. Toim ficou meio desconcertado, mas havia recebido o pagamento. Estava desconfiado de calote que nem o Cordeiro pegou do Tadeu com os pescadores da Litorânea em São Luís.
Zeus olhou aquele estrupício nauseado. A barriga volumosa lembrava  a Bertoleza do Cortiço. Que metesse uma faca ali, como sua colega. Os braços fininhos. Uns culotes imensos e muita, muita celulite. Mas os peitos, hummm. Volumosos. Maciços, mesmo um pouco caídos. Zeus gostava de peitos. Mas o resto nada vale, pensou. Meteu-lhe um raio certeiro que a explodiu inteira, mas conservou os peitos. Na nova casa diria que era obra de um importantíssimo artista modernista. Nesta área, as pessoas acreditam em qualquer coisa. E vindo de Zeus, quem duvida?

As razões da escolha


O que uma pesquisa de psicologia realizada em Praga (Rep. Theca) tem a ver com um sequestro de uma família no interior do Paraná? Nada, seria a resposta com mais chance de estar correta. Com razão. Dois mundos distantes e muito diferentes. O tema da pesquisa não é exatamente novo, pois há outras muito similares. Tampouco é incomum atitudes tresloucadas de homens sequestrarem ex-mulheres, com filhos incluídos, como expressão de rancor e frustração por uma separação.
A pesquisa expôs imagens de 40 homens e 40 mulheres que foram submetidas a 105 voluntários. Estes deveriam escolher quais daqueles rostos seriam mais confiáveis. A princípio, pensou-se que os olhos castanhos seria a razão da escolha. Descobriu-se, depois de apurar melhor, que o conjunto dos traços do rosto era a verdadeira razão da escolha. Isso ocorreu mesmo depois de mudarem a cor dos olhos, especialmente nos traços masculinos.
A psicologia evolutiva costuma explicar, em correlação com o comportamento animal, que os traços ou formatos de rosto e corpo, no caso de relacionamento, indicam saúde, vigor, virilidade, fertilidade e, em consequência, uma prole saudável e a perpetuação da espécie. Seriam programas automáticos de escolha, inconcientes, portanto, instalados em nossos genes. Obviamente, estes tais programas não dão conta de valores, integridade e caráter do escolhido(a), no caso humano.
A sabedoria nordestina cunhou uma frase: beleza não põe mesa. E este é um traço que normalmente aquela programação não dá conta também, posto que é subvertida pela cultura de cada canto, embora, hoje, em função da indústria da moda/cosmética se tenha forjado um padrão de beleza pasteurizado, comum aqui e no Afeganistão.
A pesquisa fala de escolha e o sequestro também é resultado da mesma coisa. Não o ato em si, exposto e acompanhado pela polícia e tv, mas muito antes, o que mediou a escolha mútua do casal. Guiamo-nos pelos atributos visíveis, mas o que dá vida longa a uma relação não tem nada a ver com isso. De fato, nossos olhos se acostumam, a forma é frugal e logo o olhar cansado procura outra forma para se deleitar. Queremos novidade o tempo inteiro e a lógica capitalista sabe disso. O produto é o mesmo, muda-se a cor e um penduricalho qualquer e lá nos vamos seduzidos pelo novo.
A forma, na maior parte das vezes, suplanta a função, no caso dos relacionamentos, o cuidado da vida comum e a necessária resiliência para enfrentá-la. É claro que se pode analisar o caso do sequestro por outro ângulo. O sequestrador é um homem perturbado, não por amar demais – o casal estava separado há três anos – mas por outros fatos como sentimento de posse – resultado de um ciúme doentio –, desvalor, baixíssima autoestima, etc.
Todo mundo enfrentou em algum momento da vida a dúvida da escolha. Primeiro. Por quais valores devo escolher? Segundo. Como saber se aquela pessoa é a certa? À primeira pergunta existe uma solução, para a segunda não há, mas pode-se ter um mínimo de garantia se aqueles valores do primeiro passo forem adequados. A beleza aqui é só um pequeno acessório, infelizmente supervalorizado. Defendo os feios? Não. Há feios maus caráteres. Apenas que se conheça a pessoa mesma. Sim, este é um desafio para a vida inteira, bem sei. Mas as qualidades permanentes estão lá, na maioria dos casos, bem óbvias já no início. Exceto nos sociopatas.
O amor não pode ser estúpido. Mais da metade da humanidade não fez as escolhas de suas vidas pelo outro. As famílias o fizeram. À parte de conluios econômicos e de poder, a experiência e a vivência, além dos efeitos coercitivos de sociedades com regras bem claras, produziu, sim, muitas relações boas. A voz da experiência de alguém próximo, sua própria sensibilidade e um pouco de realismo são ajudas muito importantes que podem minimizar o dar com os burros n’água. Paciência.
O velho e genial Cartola dizia em “Ciúme doentio”: “Todo mundo dizia que Ana Maria era muito legal / Eu me apaixonei e com ela casei este foi o meu mal / Brigas permanente um ciume doente nunca vi coisa assim / Se eu voltar em Mangueira sei que a turma inteira vai zombar de mim.”