sábado, 24 de outubro de 2015

Descubra o bombom da Veridiana



Ganhou repercussão nacional o caso da faxineira de 32 anos e quatro filhos que comeu guloseima do corregedor da Polícia Federal em Roraima e tornou-se alvo de um procedimento. O caso do bombom do delegado Agostinho Cascardo, corregedor da Polícia Federal em Roraima, virou a ‘Operação Sonho de Valsa’ nas redes.

Fonte: G1. Por Julia Affonso e Fausto Macedo (13/10/2015)

Todos os dias, Veridiana entrava na sala do chefe para limpar, retirar o lixo, borrifar perfumador ambiental com o cheiro lavanda. O delegado federal fazia questão. A limpeza no banheiro privativo deveria ser minuciosa, nenhum fio de cabelo ou coisa parecida deveria ser encontrado e o delegado fazia inspeção com lupa e um daqueles óculos para se enxergar no escuro. Às vezes, com tempo, espargia luminol e usava luz ultravioleta para ver material biológico. Veridiana era a sexta “profissional da higienização” que a empresa terceirizada enviava. Todos os outros não tinham o perfil para atender às exigências do delegado.
Uma ordem expressa do delegado federal dizia que o “operário da limpeza” como ele chamava, não deveria, jamais, mudar a ordem dos papeis e outros apetrechos de escritório que ficavam sobre a mesa. Aquilo tudo era material de alta relevância para a resolução de casos, todos muito importantes. Isso era cláusula pétrea. O pano, lenço, o que fosse, deveria arrodear as coisas, quer dizer, limpava apenas a superfície vazia disponível da mesa e havia que fazê-lo com maestria e habilidade de malabarista. Os apetrechos e pastas “top secret” propriamente ditos, no máximo, receberiam uma ligeira espanada com um espanador especial de penas de avestruz. Este instrumento de precisão, o próprio delegado fornecia. Mandou fazê-lo depois de uma operação numa fazenda clandestina de criação de avestruzes de onde, por óbvio, recolheu algumas amostras de penas para a investigação e da sobra foi confeccionado o espanador carnavalesco.
Por azar, Veridiana estava faminta. Havia passado por dez outras salas e a do delegado deixara por último, para poder fazer com mais tempo a assepsia – ele falava assim quando se referia à limpeza de sua sala. Palavra que Veridiana nunca ouvira na vida e com a qual teve ligeira dificuldade como se fosse uma prova pra entrar na Nasa. O delegado não quis explicar. Disse que se ela não sabia do que se tratava, nem iria começar o serviço. Ela intuiu que teria algo a ver com limpeza. Perguntou aos colegas e ninguém sabia de nada. Davam de ombros e espichavam o beiço inferior ante palavra tão estranha.
Naquele dia, Veridiana deparou-se com um objeto novo sobre a mesa. Era uma caixa de chocolates sonho de valsa. Ficou como hipnotizada. A última vez que comera um daqueles fora quando seu ex-marido lhe pedira em casamento e lhe deu um só na ocasião. A caixa estava semiaberta. Tentadora. Sabendo que câmeras monitoravam seu trabalho e sabe lá o que mais, temeu pegar um daqueles. Mas ela tinha suas artimanhas. Limpou a mesa e usou as penas do espanador para cobrir a caixa, enquanto enfiava a mão para pegar um.
Correu para o banheiro e deliciou-se como se tivesse colocado o pé num pedacinho do paraíso. Quando saiu, havia quatro agentes armados com armas na direção da porta e o delegado com um ar de superioridade e um risinho no canto da boca. Teje presa, disse com autoridade. Tomou-a pelo braço e mostrou o vídeo por um ângulo que ela nunca imaginaria. A senhora era muito certinha pro meu gosto. Eu sabia que a senhora escondia uma bandida debaixo dessa máscara de eficiência. Confesse. Veridiana, atarantada, mal abriu a boca. Confessou! Berrou o delegado com olhos injetados de prazer. Veridiana balbuciou algo como: mas foi só um chocolate. É assim que começa, daqui a pouco vamos ter uma lava jato aqui. 
O caso espalhou-se. Denominou-se, talvez por troça: “operação bombom sonho de valsa”. O delegado adorou os holofotes e a “impopularidade” nas redes. Veridiana foi convidada para fazer umas páginas na playboy-antes-que-acabe. Diziam que debaixo da farda desenxabida e depois de quatros filhos, ainda tinha quilometragem para rodar. A seção de fotos já tinha até título: descubra o bombom da Veridiana.