O apresentador
Rodrigo Hilbert, que capitaneia o programa “O Tempero de família” está no
centro de uma polêmica. Num de seus programas, ele mostrou desde a escolha até o
abate de um cordeiro para fazer um churrasco. A maior parte das cenas foi
exibida em seu programa com a naturalidade com que as pessoas no campo estão
acostumadas para realizar este tipo de ação. Foi o estopim para um sem número
de pessoas acessarem suas contas em redes sociais e, entre xingamentos e
críticas ferozes, deplorarem as cenas explícitas da morte de um cordeiro.
A questão
ganhou proporções exageradas como costuma acontecer neste mundo de manada de
pessoas excessivamente sensíveis que defendem coisas sem atentar para o
ridículo de suas posições. Ongs diversas, Sociedades protetoras de animais e
toda uma fauna de gente delicada queria mostrar sua indignação. A crítica era
por exibir as cenas cruas da retiradas das entranhas, a decapitação e a separação
do couro do cordeirinho. Sobrou até para sua mulher, a também apresentadora
Fernanda Lima. Os revoltados, impedidos de acessarem com novos posts a conta de
Rodrigo, atacaram os perfis da apresentadora. A sanha por defender “sua causa”
pedia sangue, fosse de quem fosse. Mesmo de quem nada tinha a ver com a
história.
A coisa toda
cheira a uma imposição desrespeitosa e ditatorial que é como essas pessoas
agem. Elas estão certas e quem discorda será execrado em praça pública. Uma
espécie de descarnamento e esquartejamento moral. Elas detêm a verdade. Encarnam
os novos valores da sociedade que, frouxa e louca, perdeu todos os referenciais
e quem mais grita na internete é o que tem o poder de fazer estas suas
imposturas. Os outros seguem, fazem likes.
Está certo que
nem todos estão aptos para ver as cenas. E nada tem que ver com as esdrúxulas
posições do politicamente correto, mas por desgostar e isso não está
ideologizado. Nem por isso recusam um bom churrasco de cordeiro ou deixam de se
alimentar de carne.
A questão aqui
não é, por suposto, as cenas que não se prestam para fazer juízo de valor sobre
a pessoa de Rodrigo, mas que não impediu o apresentador de ser associado a um
sádico ou coisa pior. Mas à imposição de posições ideológicas que devem ser aceitas
por todos. Vivemos a era do constrangimento público – urbi et orbi. É claro que
o apresentador correu para tirar as cenas dantescas de sua conta na rede. É
claro que deve ter ensaiado alguma desculpa ou explicação para aplacar a fúria
das sensibilidades de seus críticos. O programa precisa de audiência. Os
patrocinadores ficariam menos entusiasmados com seu nome associado a um matador
de cordeiros. A hipocrisia está na moda e elevada ao nível do paroxismo nos
comportamentos reais e virtuais.
Há uma lógica
no comportamento de manada. Que o digam os gnus correndo nas planícies do
Serengueti. Evolutivamente faz todo sentido. Nos humanos é que vem o sentimento
de pertença, o sentido de identidade, a segurança. Estes só se percebem como
parte de seus iguais. Mimetizados uns nos outros como espelhos passivos da
reprodução de imagens amordaçadas em ideias que se replicam como vírus.
Parece que
tudo tem agora um tipo de valor moral/social. Ao mesmo tempo, todos os valores
que nortearam esta mesma sociedade, dizendo que isso é certo e aquilo não,
estão corroídos e vistos como, no mínimo, ameaças ao bem comum. Pensar diferente não é mais o exercício da
liberdade, mas a candidatura para sofrer patrulhamento, censura e perseguição
na rede, lugar que oferece certo anonimato e que, por isso, instiga as mais
abjetas intenções e covardias das pessoas.
As muitas
fôrmas (abomino que tenham retirado os acentos diferenciais) são meras camisas
de força. Forjam indivíduos apenas customizados, a essência é a mesma. Em toda
sociedade, sempre houve um modelo aceitável de ser e se apresentar perante os
outros, mas vive-se a robotização em massa. O pensamento único. Uma agenda
determina o que se pode pensar e, claro, falar, sob pena de instantâneo
julgamento. A coisa chegou num nível que já não se espera a cobrança, fazemos
nós mesmos a autocensura. Tornamo-nos capatazes de nossa consciência e não me
refiro ao superego.
Curioso.
Ao mesmo tempo em que é de bom tom defender todo tipo de minoria, parece que
algumas classes podem ser esculachadas e até há um apelo para que se faça. O
cristianismo é um dos clássicos. Mas ser conservador – no sentido de Roger
Scruton ou Theodore Dalrymple – também sofre o dedo em
riste da manada de “modernos”. Toda sociedade precisa de uma Geni. Todo grupo
precisa de seu bode expiatório. A questão é, você que pensa diferente quer se
tornar este zumbi mutante que só pensa numa coisa: devorar o cérebro do outro?