O
assunto já está frio, eu sei. Há quase um mês a festa do Oscar premiou filmes e
atores. Meu atraso se dá porque somente agora pude assistir ao filme “Amor”.
Queria vê-lo antes de julgar se a bela e talentosa atriz Jennifer Lawrence, 22,
mereceu ganhar o prêmio da academia americana de cinema em 2013. Jennifer
confirmou que é uma excelente atriz, mas ficou aquela sensação de puro
bairrismo americano.
A
mesma coisa aconteceu entre a Fernanda Montenegro e a atriz americana Gwyneth Paltrow.
A primeira concorreu por “Central do Brasil” e a segunda por “Shakespeare
Apaixonado”. Gwyneth é insossa, sem
profundidade, num papel fácil, o que ela continua fazendo até hoje. O que essa
atriz realmente fez para merecê-lo? Nasceu em solo americano. O que ela fez
depois disso? Bem, é namorada do homem de ferro.
Sou fã da Jennifer, mas acho que o prêmio podia esperar
diante da monumental atuação da atriz francesa Emanuelle Riva de 86 anos. Nada
a ver com idade, ela simplesmente arrasa no papel de Anne, uma professora
aposentada de música. “Amor” é para corações fortes. Eu diria: é preciso
estômago, pois ao final da projeção a sensação é de que se levou um soco no abdômen.
“O lado bom da vida” é muito bom, os atores se saem bem, comédia e drama, mas
não é extraordinário.
Amor não faz concessões de qualquer
espécie. É cru, profundo, desesperado, doce e amargo. A dupla Anne e Georges (Jean-Louis
Trintignant, outro octogenário, 82 anos) faz um casal
que, neste ocaso da vida, se amam, fazem companhia um ao outro, vivem
confortavelmente e apreciam as artes, especialmente a música que ocupou sua
vida profissional na juventude. Os dois atores são premiadíssimos e são capazes
de usar o orbiculari oculi, ativar
movimentos corporais tão convincentes que é impossível não se envolver com sua
atuação.
Um dia Anne sofre um AVC. Todas as nossas visões românticas do
amor ou aquelas idealizadas serão postas à prova a partir de então. Numa época
em que quase tudo é descartável e o amor se tornou apenas uma palavra vazia e
vinculada a sexo, talvez seja o momento de revisitá-la por uma perspectiva
muito particular, quando uma relação é submetida a uma dura prova de
resistência, paciência e realidade.
Penso que o amor é realista. Em certas circunstâncias, talvez
exija mais do que somos capazes de dar. Talvez haja um limite em nós para amar,
especialmente se o amor deve se manifestar em meio à dor, perda, solidão e
fragilidade, da velhice, por exemplo.
Uma frase no livro bíblico de Cânticos me ocorre. No versículo 6
do capítulo 8 o poeta diz na fala da noiva: “O amor é forte como a morte.” A
comparação é esquisita aos nossos ouvidos ocidentais que pasteurizamos o amor e
o infantilizamos – basta ver os tipos de presentinhos do dia dos namorados no
Brasil ou no valentines day.
Não sei se o diretor Michael Haneke pensava naquela
frase atribuída a Salomão. Mas ao amor, que é sempre radical, não há muitos
paralelos. Talvez o poder da morte como algo limite, definitivo e imutável se
iguale ao amor crescido, maduro e em total entrega, não ao outro, mas a ele
mesmo, o amor. Creio que a comparação não é absurda.
Vocês lembram daquelas figurinhas de sua adolescência
“amar é...”? Logo depois das reticências vinha uma frase tola tipo, sei lá, “escrever
uma carta romântica”. Esqueça. Com “Amor”, é hora de crescer.