terça-feira, 19 de março de 2013

Amor


O assunto já está frio, eu sei. Há quase um mês a festa do Oscar premiou filmes e atores. Meu atraso se dá porque somente agora pude assistir ao filme “Amor”. Queria vê-lo antes de julgar se a bela e talentosa atriz Jennifer Lawrence, 22, mereceu ganhar o prêmio da academia americana de cinema em 2013. Jennifer confirmou que é uma excelente atriz, mas ficou aquela sensação de puro bairrismo americano.
A mesma coisa aconteceu entre a Fernanda Montenegro e a atriz americana Gwyneth Paltrow. A primeira concorreu por “Central do Brasil” e a segunda por “Shakespeare Apaixonado”.  Gwyneth é insossa, sem profundidade, num papel fácil, o que ela continua fazendo até hoje. O que essa atriz realmente fez para merecê-lo? Nasceu em solo americano. O que ela fez depois disso? Bem, é namorada do homem de ferro.
        Sou fã da Jennifer, mas acho que o prêmio podia esperar diante da monumental atuação da atriz francesa Emanuelle Riva de 86 anos. Nada a ver com idade, ela simplesmente arrasa no papel de Anne, uma professora aposentada de música. “Amor” é para corações fortes. Eu diria: é preciso estômago, pois ao final da projeção a sensação é de que se levou um soco no abdômen. “O lado bom da vida” é muito bom, os atores se saem bem, comédia e drama, mas não é extraordinário.
Amor não faz concessões de qualquer espécie. É cru, profundo, desesperado, doce e amargo. A dupla Anne e Georges (Jean-Louis Trintignant, outro octogenário, 82 anos) faz um casal que, neste ocaso da vida, se amam, fazem companhia um ao outro, vivem confortavelmente e apreciam as artes, especialmente a música que ocupou sua vida profissional na juventude. Os dois atores são premiadíssimos e são capazes de usar o orbiculari oculi, ativar movimentos corporais tão convincentes que é impossível não se envolver com sua atuação.
Um dia Anne sofre um AVC. Todas as nossas visões românticas do amor ou aquelas idealizadas serão postas à prova a partir de então. Numa época em que quase tudo é descartável e o amor se tornou apenas uma palavra vazia e vinculada a sexo, talvez seja o momento de revisitá-la por uma perspectiva muito particular, quando uma relação é submetida a uma dura prova de resistência, paciência e realidade.
Penso que o amor é realista. Em certas circunstâncias, talvez exija mais do que somos capazes de dar. Talvez haja um limite em nós para amar, especialmente se o amor deve se manifestar em meio à dor, perda, solidão e fragilidade, da velhice, por exemplo.
Uma frase no livro bíblico de Cânticos me ocorre. No versículo 6 do capítulo 8 o poeta diz na fala da noiva: “O amor é forte como a morte.” A comparação é esquisita aos nossos ouvidos ocidentais que pasteurizamos o amor e o infantilizamos – basta ver os tipos de presentinhos do dia dos namorados no Brasil ou no valentines day.
Não sei se o diretor Michael Haneke pensava naquela frase atribuída a Salomão. Mas ao amor, que é sempre radical, não há muitos paralelos. Talvez o poder da morte como algo limite, definitivo e imutável se iguale ao amor crescido, maduro e em total entrega, não ao outro, mas a ele mesmo, o amor. Creio que a comparação não é absurda.
Vocês lembram daquelas figurinhas de sua adolescência “amar é...”? Logo depois das reticências vinha uma frase tola tipo, sei lá, “escrever uma carta romântica”. Esqueça. Com “Amor”, é hora de crescer.

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