quarta-feira, 19 de outubro de 2016

High Five

“Hoje é o dia mais orgulhoso da minha vida. Eu consegui tirar uma foto me cumprimentando.” Não fosse a segunda parte da frase, qualquer um juraria que o autor estivesse falando da descoberta da cura da Aids, por exemplo. Ao ler a segunda metade, ficamos confusos até vermos a foto que ilustra o tweet do gênio. Um cara faz um “high five” em si mesmo enquanto seu celular flutua no ar. O sujeito inaugurou um novo tipo de selfie.
Imediatamente o ato genial começou a ser replicado e outras selfies foram aparecendo na rede. Não se sabe o destino dos celulares que, possivelmente, se espatifaram no chão se o copiador não colocou um anteparo macio para aparar o celular que era atraído para o chão a 10m/s2.
Ao mesmo tempo, uma onda de palhaços aterrorizantes mostravam suas caras horrendas por vários países. Algo que começou, de novo, nos EUA e não se sabe dizer com que propósito. Câmeras de segurança passaram a registrar estas criaturas, alguns com armas na mão, o que gerou uma reação, pois hordas de caçadores de palhaços se formou em igual velocidade.
Este fenômeno bizarro é só um dos que a comunicação instantânea está produzindo no mundo. Imitar é uma das formas básicas de aprendizado. Assim as crianças desenvolvem suas habilidades em seus primeiros anos de vida. O Benchmarking é outra forma positiva de uso da imitação. Mas que dizer daquele tipo de comportamento  desse homo virtualis?
Uma característica do fenômeno, especialmente nas redes sociais, é que ele é inócuo, estranho e inútil. Nem tanto. Outra moda, tirar selfies em lugares perigosos, matou alguns de seus praticantes. Quem o faz pela primeira vez, busca de forma desesperada destacar-se de alguma maneira da grande massa amorfa de gente. Anseia por algum tipo de reconhecimento. Não importa se seu “grande” feito não tem qualquer contribuição positiva para a humanidade. Que se reduza a mera curiosidade que será imediatamente substituída por outra excentricidade.
No fundo, o desejo de ser diferente da manada por meio de um feito extraordinário leva as pessoas a este tipo de postura. A fala hiperlativa do jovem no início desse texto dá uma ideia. A repetição dos demais depende do sucesso alcançado. Se falta criatividade para muitos, pode-se sempre conseguir um pouco da glória de outro, quais rêmoras amalucadas.
As redes são a grande vitrine. É o palco do narcisismo que em todos habita em menor ou maior grau. Um ato replicado nos mais longínquos lugares do mundo confere a seu idealizador um status de grandeza, ainda que efêmero, que dará por momento um significado a sua vida reles. Não a vida da pessoa, mas como esta se manifesta no cotidiano repetitivo e com pouca emoção, única maneira de como muitos se sentem vivos.
Pessoas melhor resolvidas passam ao largo dessa corrente de atos insignificantes. Não porque sejam pretensiosas, alheias ou enfatuadas, quando não, luditas. Mas porque tem o que fazer com aspectos mais transcendentes. São aqueles que estão mais tempo no mundo real das relações, da troca afetiva, da experiência visceral. Não usam a tecnologia como fuga, um espaço da fantasia, da simulação de um eu idealizado, mas como um meio...
Estas ondas passarão tão rápido quanto apareceram. Outras virão, cada qual com sua estranheza, mas no fundo são só pessoas desejando desesperadamente um pouco de aceitação, um bocadinho de reconhecimento, alimento que almas carentes precisam para se autenticar.