sábado, 25 de julho de 2015

Cuecas para colorir

Cuecas com estampas para colorir podem se tornar a nova febre entre homens e mulheres, após o sucesso dos livros com essa temática. A ideia é de uma empresa do setor em Nova Friburgo, na Região Serrana do Rio, e será apresentada durante a Fevest, a Feira de Moda Íntima da cidade, que acontece entre 2 e 4 de agosto e recebe confeccionistas de todo o Brasil.

Fonte: G1, Juliana Scarini (24/07/2015)

Desde “O Jardim Secreto”, desconheço quem ainda não saiba sobre os tais livros para colorir. Sei, sim. Tem uns conhecidos meus que mal sabem o próprio nome, menos ainda estes tipos de novidades modernosas que, suspeito, só amplia a ignorância do brasileiro médio, mas os deixam zen, afirmam. Quisera. Não que as editoras deem atenção, pois não há uma que não tenha em seu catálogo esta nova febre que pouco se importa com o hábito indigente de leitura dos brasileiros.

O fato é que colorir livros invadiu até o campo da psicologia. Não sei bem quais transtornos eles curam ou aliviam, nem qual a posologia indicada, mas a propaganda vende que a capacidade livresca, para pintar, por suposto, abate a consumição, produz paz, calma e, se duvidar, traz o amor perdido, mesmo que ele não queira.

Os descolados fazem até coleções em suas mesas de centro nas salas, onde pilhas de obras com garatujas as mais estranhas descansam à espera de quem queira matar o tempo, fazendo suas pinturas oníricas ou, se preferirem, lisérgicas. A indústria de lápis de cor agradece penhoradamente. É, inclusive, de mal tom dar um livro desses sem uma caixinha de lápis de cor, pois afinal eles são meio inúteis e desenxabidos se não se tiver à mão algo para pintá-los.

No interior do Rio de Janeiro, o dono de uma confecção teve uma ideia escatológica. Está produzindo cuecas de algodão com padronagens para colorir. As canetas para tecido são vendidas separadamente, óbvio. Entre estranhados e curiosos, os consumidores estão aderindo à ideia, ainda que timidamente. Sem querer, acho que o empresário inventou o santo graal contra o tédio nas relações íntimas. Ou nas não relações.

E aí, você topa? Topa o quê? A gente pintar uma cueca juntos. Será que cola como cantada? Pelo menos é inusitada. Não duvidem se inventarem um concurso para premiar a cuequinha-obra mais linda. Hão de ter categorias para as pinturas: abstratas, cubistas, impressionistas e por aí afora. Um sujeito animou-se a dizer que compraria, pois é desestressante. Talvez se sinta pressionado por um desempenho digno de um Casanova. Dá para imaginar a cena: a mulher deitada esperando e o cara pegado na cueca. Peraí, tô quase terminando essa florzinha aqui.

Outro adepto da ideia, pensava em comprar uma meia dúzia – não sei se vendem o conjunto naqueles copinhos ou em pacotes econômicos – para, segundo ele, se divertir com a namorada. Taí uma boa forma de ajudar aquele que se sentia pressionado. Envolver a mulher na pintura, assim ela esquece do sexo e de qualquer cobrança.

As ideias para a vestimenta de baixo se multiplicam, mas ainda não chegou à fase de recomendá-las para problemas masculinos. Mas não duvido que alguém a indique para os que sofrem com ejaculação precoce, por exemplo. A ver.

Tem quem acredite que a cueca pintadinha pode ser útil para apimentar as relações. Tenho cá minhas dúvidas. E se a cueca só conseguir arrancar boas gargalhadas da parceira? Eis uma prova mais dura, suportar o ridículo da aparência.
A verdade é que a tendência apenas começou. Já se fala a boca pequena em avançar na direção das calcinhas e sutians e, barbaridade, camisinhas. Não sei no que isso vai dar, talvez na diminuição da população.

segunda-feira, 20 de julho de 2015

Podres de Mimados

Theodore Dalrympe é o pseudônimo do médico psiquiatra inglês Anthony Daniels. Guardando-se as proporções devidas, Dalrympe é o Mr. Hyde do dr. Jekyll (Daniels). Ironia e sarcasmo seguem o curso do livro sem qualquer pedido de desculpas ao politicamente correto. Ainda bem. Imagine em certos círculos no Brasil, dominado por uma ralé carregada de ideologia, especialmente em órgãos públicos aparelhados pelo petismo deliquente, alguém dizer a seguinte frase: “… é puro sentimentalismo ver viciados em drogas como vítimas de uma doença.” Ou ainda sobre o mesmo tema: “...eles se tornam viciados em heroína com algo que só pode ser chamado de determinação...”

É evidente que se deve ler o contexto da fala de Dalrympe para não acusá-lo injustamente de insensibilidade e até de ignorância criminosa, posto que drogados fazem parte do público atendido pelos psiquiatras nas atuais formas de tratar o problema.

O livro inteiro é dedicado a explicar porque as sociedades ocidentais deixaram caminhos mais assertivos e meritórios para serem devoradas por um sentimentalismo que subsidia todas as ações de governo e mesmo até media a criação de filhos. 

Dalrympe tem décadas de quilometragem atendendo no sistema de saúde pública inglês e viu as transformações, nem sempre para melhor, que os SUS saxão sofreu ao longo do tempo. Ele admite que definir sentimentalismo não é fácil, mas o tipo de sentimentalismo a que quer chamar atenção não é exatamente aquele que os dicionários definem como excesso de emoção, afetação, superficialidade, que normalmente se refere a uma manifestação no plano pessoal, mas o que este comportamento gera no espaço público.

O autor também trabalhou no sistema penitenciário inglês e desta experiência traz alguns exemplos interessantes. Imagino que enriqueceria uma próxima edição de seu livro a inclusão do que no Brasil se denomina: auxílio-reclusão. Para o marginal sai a jato enquanto a concessão de uma aposentadoria é uma via crucis para o esfolado trabalhador que contribuiu com o sistema por décadas e agora na iminência de ter esse tempo aumentado ainda mais. O que justificaria essa aberração? O sentimentalismo.

Possivelmente, o protagonismo que as redes sociais instigam as pessoas a manifestar, gerou um tipo de competição que pede cada vez mais exagero nas expressões de sentimentos. O sentimentalismo se tornou a nova verdade pessoal, pois sem ele indivíduo não passa veracidade naquilo que manifesta. Estaria aí a moda de jogadores de sucesso posarem ao lado de crianças com câncer? Parece que nesse tempo escorregadio não basta jogar bem, há que justificar os ganhos estratosféricos – quase imorais – ante aqueles que realmente produzem no plano bem prático, serviços à sociedade.

Uma característica peculiar do sentimentalismo é o pouco uso da racionalidade. Bastam as emoções para autenticar um ato, uma demonstração seja do que for. Dalrympe não diz, nem passa perto, mas será que o Estado Islâmico, esta força demoníaca disfarçada de religião, não intuiu que nós ocidentais nos tornamos bebês chorões e então eles carregam as tintas (e imagens) em seus espetáculos freaks de assassinatos requintadamente perversos para impactar o mundo frouxo e desregrado no que o ocidente se tornou?

Se bem entendi, o sentimentalismo substitui as palavras que constituem argumentos. Basta o espetáculo, a aparência das coisas para que sejam justificadas. O sentimentalismo, a seguir o raciocínio de Dalrympe, alimenta a culpa e dela extrai toda sorte de vantagem malandra travestida de justiça social quando diz que nós ainda somos culpados, todos os brasileiros, pela escravatura no país. Que ao pobre dá uma condição especial de merecimento e de proteção que o Estado deve suprir. Daí os montes de bolsas-qualquer-coisa. Particularmente não sou contra a ação do estado em favor dos mais pobres, é que nos Brasil a ação estatal é manipulatória, matem a pobreza, sustenta uma súcia de políticos e partidos. Vicia o pobre, retira sua dignidade e o transforma numa faroleiro manipulador e glutão de benesses.

A pobreza, no sentimentalismo, é virtude. É claro que a se seguir com esta lógica, a sociedade vai se esfacelar em grupos os mais diversos, todos cheios de direitos, inclusive os menores assassinos e ladrões que aprenderam a manipular a lei em seu favor e quando se fala em alterar um sistema com um quarto de século de fracasso quase integral, as vozes sentimentalistas gritam que a solução para o descalabro atual não é boa o bastante. Então o quê?

O sentimentalismo alimenta a cultura do vitimalismo e do coitadismo. Todo mundo é vítima. Quase sempre, diz Dalrympe, em seus próprios termos, pois como exemplifica, a vítima é que diz que é, segundo sua própria concepção. O sistema, de certo modo, atende ao seu clamor pois eles, organizados, paralisam as ruas, avenidas, estradas – isso se tornou comum no Brasil – porque, dizem cheios de razão, estão reivindicando “seus direitos”. É um mundo de gente que só tem direitos e os demais, o estado acima de tudo, corre a atendê-los, pois pareceria vergonhoso e injusto não fazê-lo. O sentimentalismo nos tornou reféns da esperteza. “A desonestidade emocional não conhece fronteiras”

“O desejo ou ânsia de se transformar numa vítima tornou-se tão grande que hoje as pessoas afirmam ser vítimas de seu próprio mau comportamento.” Essa é outra questão que Dalrympe aborda. A vítima nunca é responsável. O coitado também não. O que eles não suportam – o coitado bem mais que a vítima – é que os chamemos pelo nome certo. Vítima nem tanto, pois como a Dilma está careca de fazer publicamente, ainda mais quando acuada, é evocar seu tempo de guerrilheira que foi presa e torturada. Conquanto ninguém em sã consciência admita que torturar é correto, ela correu o risco e pagou por isso. Não foi apenas por defender ideias à época proibidas, mas porque pegou em armas, assaltou bancos. Sua ideologia admitia o sequestro como legítima forma de luta e estes atos são crimes em qualquer lugar do mundo, mesmo em ditaduras. Pela mesma lógica, volto ao nefasto EI, é válido matar, crucificar, queimar pessoas vivas, decapitar, porque sua fé assim admite e pede.

O coitado se espoleta se o chamarmos assim. É que não pega muito bem. O coitado ama 
as vantagens que tem e que os outros, vítimas de suas chantagens, lhes dão, mas odeia que o coloquem neste lugar. Vítima dá status, coitado é xingamento.

Dalrympe é uma leitura mais que necessária para pensarmos fora da caixa ou da camisa-de-força que a atual conjuntura psicossocial impõe como verdade.

domingo, 19 de julho de 2015

Quem vê cara…

Imagine crescer com um irmão gêmeo não idêntico. Vocês teriam a mesma educação, a mesma escolarização, os mesmos interesses. Os dois seriam igualmente aventureiros e interessantes. Iriam à mesma academia e comeriam o mesmo tipo de comida. Espiritualmente e mentalmente, vocês seriam sósias. Mas teriam apenas uma diferença: o rosto.
Fonte: David Robson Da BBC Future (14/07/2015)
A expressão cara-de-pau não tem origem esclarecida em português. Os entendidos dizem que tanto cá como na terrinha, o sentido é o mesmo. Talvez porque o significado seja tão velho quanto o homem. Descaramento, desfaçatez, cinismo, cara lisa, caradura, são palavras que traduzem bem o cara-de-pau, bicho que no Brasil abunda e não corre o risco de chegar nem perto da extinção. Os mensalões, petrolões e afins, além da escumalha política, são pródigos nestes espécimens.
Enfim, leio que a cara, melhor, para ficar de acordo com a pesquisa, o rosto, define o futuro de quem o tem. Vale até para gêmeos idênticos, pois apesar de assim percebermos, eles têm sutis diferenças no rosto e isso, atestam os pesquisadores, definiria o destino de cada um.
Uma pessoa precisa de míseros 40 milésimos de segundo para julgar um rosto. O que vem depois daí vai depender de uma miríade de coisas, desde seus maus-bofes até a cara do indivíduo com suas microexpressões que, sabe-se lá, captamos e ali, sem maiores lero-leros, tomamos decisões, até mesmo de votar no dito. Já falo disso.
Para o bem e para o mal esta, digamos, capacidade, nos faz achar que alguém é honesto, por exemplo. Imagine. Olhamos e dizemos com nossos botões: tem cara de honesto. Como dizem, o diabo está nos detalhes, este dispositivo quase sobrenatural nem sempre acerta, donde podemos incorrer no que os pesquisadores denominaram em “preconceito facial”. Só faltava essa! Já se vive num mundo em que há mais merecidos que merecedores e ainda inventam esta marmota.
E ainda. Os cientistas atestam que este nosso radar erra muito, tanto quanto uma toupeira enxerga. E, absurdo, engana-nos, pois um indivíduo está disposto a deixar de lado o que sabe em favor do que vê.
Um rosto confiável tende a se dar bem até quando está num julgamento num tribunal. As pessoas caem até na esparrela de emprestar dinheiro apenas com aquela precária avaliação visual. Voluntários na pesquisa olharam vários rostos e, por este julgamento que dura menos que uma piscada de olho, diziam em quem votariam e costumavam acertar naqueles que, posteriormente se constatou, foram eleitos. Não sei se a politicalha brasileira descobriu a manha ou os milhões com que as empreiteiras irrigam suas campanhas permitem além do photoshop nos cartazes de parede contratar marqueteiros que subvertem até a gravidade para parecê-los tragáveis.
A coisa toda não tem nada a ver com beleza, esclareça-se, pois convenhamos, já se tentou de tudo com a Dilma e ela continua um canhão. Nem falo no andar delicado de tanque de guerra. Será que foram os dentes de coelho que a fazem fofinha? O topete, talvez isso. Falha-me o juízo para explicar e a pesquisa não trata da peculiaridade brasileira.
Uma cara com certos traços particulares pode definir, por exemplo, o sucesso entre assaltantes. Uma cara mais assustadora e aí não sei definir como seria, tende a ser menos violento, pasmem, e assim faturar mais porque infunde medo. É preciso ter cara até para ser assaltante ou não entre no negócio. Diferente dos gatunos políticos e seus coleguinhas que não precisam de cara nenhuma, só a cara-de-pau mesmo para mentir ainda quando pegos atolados até o pescoço em traquinagens as mais escalafobéticas.
Talvez tudo isso junto explique porque, sempre eles, os políticos brasileiros voltem mandato pós mandato: a acuidade visual do povo é tão boa quanto a de um daltônico, seu sensor está avariado e os velhacos sabem fazer uma cara honesta, com um sorriso enganador e nós caímos porque estamos, talvez evolutivamente, presos a esta habilidade que espero que os mais aptos a percam nas próximas quinhentas gerações.

O mal que em nós habita

Em 1962, em Jerusalém, ocorreu um dos mais importantes julgamentos dos que tiveram como alvos criminosos nazistas. Adolf Eichmann, executor da “solução final”, foi levado ao tribunal pelos crimes de guerra e genocídio contra a humanidade que cometera. Hannah Arendt, judia, filósofa, ela mesma vítima das atrocidades perpetradas pelo nazismo, foi enviada pelo jornal The New Yorker para fazer a cobertura do julgamento e escrever um ensaio a respeito.
No livro “Eichmann em Jerusalém”, Arendt faz uma análise minuciosa do personagem nazista e discute a normalidade com que executou de forma metódica e precisa o extermínio de milhões de pessoas. Eichmann nunca admitiu culpa, pois sentia apenas que cumprira fielmente sua obrigação para com o estado alemão, do que tinha orgulho. Suas ações não foram feitas por ódio aos judeus, por tara ou sadismo: era seu dever. É nesse contexto que Arendt cria a expressão “banalidade do mal”.
A “banalidade do mal” se realiza num ambiente em que as pessoas abdicam de pensar, de empregar qualquer valor ético ou moral e, por conseguinte, de sentir culpa. Por este ângulo, se pode explicar os frequentes linchamentos e, em particular, o realizado há poucos dias em que um homem foi amarrado a um poste, despido e espancado até a morte aqui mesmo em São Luís.
Mas, cabe a pergunta: o que leva as pessoas a descerem a tal nível de barbárie? Freud, um pessimista com a natureza humana, comenta em “O mal-estar da civilização” que, em virtude de nossa tendência para a agressão, a sociedade civilizada está permanentemente ameaçada de desintegração. Reconhecia esta condição humana em seu construto teórico, ao qual denominou pulsão de morte.
Será que, ainda que seja compreensível, mas não justificável, as pessoas que assassinaram o homem – mesmo um marginal – foram movidas pela frustração, medo, sensação de desamparo, percepção de insegurança e descrença na justiça que tarda e falha, não poucas vezes, gerando, como subproduto nefasto, a certeza da impunidade daqueles que causam mal à sociedade?
Ainda que tudo isso seja verdade, parece insuficiente para, sozinho, explicar o comportamento violento das pessoas. A psicologia oferece várias teorias, entre elas a da frustração-agressão (final dos anos 1930) que, entre outras, concluem que não se encaixam em casos nos quais a violência se manifesta sem conexão aparente com uma força malévola que lhe justifique.
Tanto em Eichmann quanto em uma turba acontece um processo de desindividuação. Ele se diluiu numa máquina burocrática assassina, as pessoas que mataram Cledenilson se desconstituíram como indivíduos, mimetizados no povaréu, possessos de ira e, como um organismo selvagem sem freios, não se reconhecem culpados, nem carregam culpa.
A violência é inevitável? Estamos fadados a, num átimo, degringolar em selvageria por nos sentirmos com raiva ainda que, em certas condições, justificada? Tanto mais alheia e descrente nos valores ou estes relativizados, mais maquinal em seu comportamento a sociedade de consumo. Pessoas sujeitadas a processos em que são meras peças de uma engrenagem, desconstituídas do exercício da vontade, que abdicam da autodeterminação e cuidado de si em favor de um sistema árido e indiferente, mais propensos estarão a agir como se falidos em sua humanidade.
Educação, valoração de princípios que alimentem a prática da misericórdia, do respeito ao outro, do cuidado consigo mesmo. O fortalecimento das instituições que garantam o cumprimento das leis, da efetiva punição dos que maculam a organização social. A garantia de direitos, demonstram sociedades mais evoluídas, são caminhos que domam a fera que em nós habita. Acima de tudo, indicam inúmeras pesquisas no campo da psicologia social: o exercício da espiritualidade pode muito ajudar no convívio pacífico entre as pessoas. Especialmente aquele que tenha como base o fundamento ensinado por Jesus: amar ao próximo como a si mesmo.