segunda-feira, 20 de julho de 2015

Podres de Mimados

Theodore Dalrympe é o pseudônimo do médico psiquiatra inglês Anthony Daniels. Guardando-se as proporções devidas, Dalrympe é o Mr. Hyde do dr. Jekyll (Daniels). Ironia e sarcasmo seguem o curso do livro sem qualquer pedido de desculpas ao politicamente correto. Ainda bem. Imagine em certos círculos no Brasil, dominado por uma ralé carregada de ideologia, especialmente em órgãos públicos aparelhados pelo petismo deliquente, alguém dizer a seguinte frase: “… é puro sentimentalismo ver viciados em drogas como vítimas de uma doença.” Ou ainda sobre o mesmo tema: “...eles se tornam viciados em heroína com algo que só pode ser chamado de determinação...”

É evidente que se deve ler o contexto da fala de Dalrympe para não acusá-lo injustamente de insensibilidade e até de ignorância criminosa, posto que drogados fazem parte do público atendido pelos psiquiatras nas atuais formas de tratar o problema.

O livro inteiro é dedicado a explicar porque as sociedades ocidentais deixaram caminhos mais assertivos e meritórios para serem devoradas por um sentimentalismo que subsidia todas as ações de governo e mesmo até media a criação de filhos. 

Dalrympe tem décadas de quilometragem atendendo no sistema de saúde pública inglês e viu as transformações, nem sempre para melhor, que os SUS saxão sofreu ao longo do tempo. Ele admite que definir sentimentalismo não é fácil, mas o tipo de sentimentalismo a que quer chamar atenção não é exatamente aquele que os dicionários definem como excesso de emoção, afetação, superficialidade, que normalmente se refere a uma manifestação no plano pessoal, mas o que este comportamento gera no espaço público.

O autor também trabalhou no sistema penitenciário inglês e desta experiência traz alguns exemplos interessantes. Imagino que enriqueceria uma próxima edição de seu livro a inclusão do que no Brasil se denomina: auxílio-reclusão. Para o marginal sai a jato enquanto a concessão de uma aposentadoria é uma via crucis para o esfolado trabalhador que contribuiu com o sistema por décadas e agora na iminência de ter esse tempo aumentado ainda mais. O que justificaria essa aberração? O sentimentalismo.

Possivelmente, o protagonismo que as redes sociais instigam as pessoas a manifestar, gerou um tipo de competição que pede cada vez mais exagero nas expressões de sentimentos. O sentimentalismo se tornou a nova verdade pessoal, pois sem ele indivíduo não passa veracidade naquilo que manifesta. Estaria aí a moda de jogadores de sucesso posarem ao lado de crianças com câncer? Parece que nesse tempo escorregadio não basta jogar bem, há que justificar os ganhos estratosféricos – quase imorais – ante aqueles que realmente produzem no plano bem prático, serviços à sociedade.

Uma característica peculiar do sentimentalismo é o pouco uso da racionalidade. Bastam as emoções para autenticar um ato, uma demonstração seja do que for. Dalrympe não diz, nem passa perto, mas será que o Estado Islâmico, esta força demoníaca disfarçada de religião, não intuiu que nós ocidentais nos tornamos bebês chorões e então eles carregam as tintas (e imagens) em seus espetáculos freaks de assassinatos requintadamente perversos para impactar o mundo frouxo e desregrado no que o ocidente se tornou?

Se bem entendi, o sentimentalismo substitui as palavras que constituem argumentos. Basta o espetáculo, a aparência das coisas para que sejam justificadas. O sentimentalismo, a seguir o raciocínio de Dalrympe, alimenta a culpa e dela extrai toda sorte de vantagem malandra travestida de justiça social quando diz que nós ainda somos culpados, todos os brasileiros, pela escravatura no país. Que ao pobre dá uma condição especial de merecimento e de proteção que o Estado deve suprir. Daí os montes de bolsas-qualquer-coisa. Particularmente não sou contra a ação do estado em favor dos mais pobres, é que nos Brasil a ação estatal é manipulatória, matem a pobreza, sustenta uma súcia de políticos e partidos. Vicia o pobre, retira sua dignidade e o transforma numa faroleiro manipulador e glutão de benesses.

A pobreza, no sentimentalismo, é virtude. É claro que a se seguir com esta lógica, a sociedade vai se esfacelar em grupos os mais diversos, todos cheios de direitos, inclusive os menores assassinos e ladrões que aprenderam a manipular a lei em seu favor e quando se fala em alterar um sistema com um quarto de século de fracasso quase integral, as vozes sentimentalistas gritam que a solução para o descalabro atual não é boa o bastante. Então o quê?

O sentimentalismo alimenta a cultura do vitimalismo e do coitadismo. Todo mundo é vítima. Quase sempre, diz Dalrympe, em seus próprios termos, pois como exemplifica, a vítima é que diz que é, segundo sua própria concepção. O sistema, de certo modo, atende ao seu clamor pois eles, organizados, paralisam as ruas, avenidas, estradas – isso se tornou comum no Brasil – porque, dizem cheios de razão, estão reivindicando “seus direitos”. É um mundo de gente que só tem direitos e os demais, o estado acima de tudo, corre a atendê-los, pois pareceria vergonhoso e injusto não fazê-lo. O sentimentalismo nos tornou reféns da esperteza. “A desonestidade emocional não conhece fronteiras”

“O desejo ou ânsia de se transformar numa vítima tornou-se tão grande que hoje as pessoas afirmam ser vítimas de seu próprio mau comportamento.” Essa é outra questão que Dalrympe aborda. A vítima nunca é responsável. O coitado também não. O que eles não suportam – o coitado bem mais que a vítima – é que os chamemos pelo nome certo. Vítima nem tanto, pois como a Dilma está careca de fazer publicamente, ainda mais quando acuada, é evocar seu tempo de guerrilheira que foi presa e torturada. Conquanto ninguém em sã consciência admita que torturar é correto, ela correu o risco e pagou por isso. Não foi apenas por defender ideias à época proibidas, mas porque pegou em armas, assaltou bancos. Sua ideologia admitia o sequestro como legítima forma de luta e estes atos são crimes em qualquer lugar do mundo, mesmo em ditaduras. Pela mesma lógica, volto ao nefasto EI, é válido matar, crucificar, queimar pessoas vivas, decapitar, porque sua fé assim admite e pede.

O coitado se espoleta se o chamarmos assim. É que não pega muito bem. O coitado ama 
as vantagens que tem e que os outros, vítimas de suas chantagens, lhes dão, mas odeia que o coloquem neste lugar. Vítima dá status, coitado é xingamento.

Dalrympe é uma leitura mais que necessária para pensarmos fora da caixa ou da camisa-de-força que a atual conjuntura psicossocial impõe como verdade.

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