Síndrome de Takotsubo e
síndrome do coração partido são a mesma coisa. É um fenômeno cardíaco. Esse
velho coração e suas surpresas. Cito
textualmente a reportagem: “A doença é caracterizada por uma
fraqueza temporária dos músculos do coração que leva a uma deformação do
ventrículo esquerdo e provoca dores no peito, perda de fôlego e, até mesmo,
morte.” Como se poderia suspeitar, isso acontece, em mais
de 90% das vezes, em momento de tristeza extrema. Perdas irreparáveis.
Amargores dilacerantes que nos espreitam na vida. Faz sentido, não é?
A pesquisa
publicada no European Heart Journal revela, porém, uma surpresa. Cerca de 4% dos quase dois mil
pesquisados tiveram o coração estraçalhado por alegrias. Felicidades
incontidas. Felicidades, quase êxtases. A conclusão é que nosso cérebro
significa coisas diferentes por mecanismos muito parecidos, se não iguais em
sua fisiologia. É assim quando sentimos certos prazeres. O circuito de
recompensa é o mesmo. O neurotransmissor é o mesmo, quase sempre a dopamina. O
cérebro não separa o que provoca esta efervescência. Para ele, tanto faz se é
uma pedra de crack, sexo ou uma comida divina.
As mulheres parecem ter ligeira desvantagem em relação aos homens. Isso
parece reforçar aquilo que se fala popularmente: as mulheres são mais coração e
os homens, cérebro. Mulheres de coração partido. Isso soa familiar? A idade
mais provecta parece também contribuir para que a síndrome se manifeste. Ora
vejam, nossos corações se exaurem de tanta emoção. Ressoar os sons da alma tem
limite.
A reportagem tinha um título sensacionalista: “Felicidade extrema pode
fazer mal ao coração”. Lembrei que quase todos buscamos este estado de alma.
Exceto os doentes, coitados, que ficaram viciados em tristeza e dissabores. Por
estranho que pareça, tem gente assim aos montes. Mas eles mesmos, talvez,
apenas suspeitem de sua entortadura emocional.
Aristóteles chama a alma enlevada de eudaimonia, que literalmente
significa o estado de ter um bom espírito residente, um bom gênio. É mais
traduzida por felicidade, que resulta desta boa condição do espírito ou
plenitude. Parece que a diversidade de vivências e o comedimento são os
caminhos para se alcançar este estado, ensina o filósofo. Mas vivemos um tempo
de exageros. Urgências. Instantaneidades. Mesmo a religião cristã em sua versão
protestante (palavra que ficou fora de moda e nem mais corresponderia ao
sentido original) viver a fé é ter direito à felicidade, aqui e agora, e esta
pode ser comprada porque a prosperidade financeira a que o fiel tem direito e,
consequentemente, material, favorecerá sua manifestação.
Um pequeno país encravado no Himalaia, Butão, determinou por decreto
real a busca da felicidade como um valor semelhante ao PIB. Seria o FIB. O
âmago desta política é que bem-estar é mais importante que desenvolvimento e
dinheiro. O rei ainda está às voltas com essa missão impossível. Parece que nossas
vidas teimam em descarrilhar por motivos mínimos. Sentimos inveja e culpa por
não sermos felizes como os outros, na concepção de que todos os outros o sejam.
Quase sempre é esta a nossa percepção.
Aristóteles ou Jesus (não os coloco em pé de
igualdade), Gandhi ou Martim Luther King, ou quem você quiser, nunca deram
formuletas de felicidade. Todos eles entenderam que a felicidade não é sequer
um ideal a ser alcançado, porque aquelas dos contos de fada, que mimam nossas
vãs aspirações, são uma aberração à vida. São infantis. Tolas. Miragens. Haverá
quem defenda que temos que sonhar e essa é uma das frases mais bobas que
existe. Quando sugere este sentido equivalente a viver bem. Não temos que
sonhar. Temos que viver. Viver, diz o poeta, é melhor que sonhar (Belchior). E
viver, os experimentados ensinam desde remotos tempos: “viver é a coisa mais
rara do mundo. A maioria das pessoas apenas existe” (Oscar Wilde).