quinta-feira, 30 de julho de 2009

Tô nem aí, tô nem aí...


Apontado como o principal motivo do agravamento da crise em torno do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), Henrique Dias Bernardes, 27, namorado da neta do peemedebista, sustenta que não vê ilegalidade na interferência de Sarney em sua contratação na Casa Legislativa.

Nomeado por ato secreto para um cargo na Diretoria Geral, Bernardes foi deslocado para a área administrativa no serviço médico do Senado. Por lá, ele diz que trabalha oito horas diárias e não demonstra constrangimento com a divulgação dos áudios da Polícia Federal que indicariam que o presidente do Senado negociou sua contratação.

Fonte: Folha Online, em Brasília

Jovem remediado, mas atilado, vivia no pau da perua. Dizem que tirava chupa da boca de jumento, mas, esperto, não parecia. Uma malhaçãozinha aqui, outra ali, uma bomba, esculpiu uns bíceps que conquistaram uma mina de sobrenome oligárquico. Foi como acertar a sena. Certo, nem tanto, mas que era uma oportunidade bafejada pela sorte, ninguém podia duvidar. Sabe lá o que é topar com uma chance de subir nas ancas da viúva em grande estilo e sem dar um prego? Assim foi. Eis que um dia, por um azar dos diabos, viu-se tendo que dar explicações por causa da outrora sorte grande. E ainda tinha que aliviar seus benfeitores, porque terminado o namoro, não havia mais motivo para piedade de não lhe jogar aos tubarões? Triste sina.

Não senhores, não posso ser execrado publicamente, como se criminoso fosse. A quem roubei? A quem enganei? Verdade, não sou concursado, mas convenhamos, isso não fui eu quem inventou, isso vem lá da época do descobrimento. Viram lá, o Caminha pedindo emprego para um parente seu ao El Rei? Então? O culpado são os portugueses. É da cultura deles, aprendemos com quem nos descobriu, nada mais natural, portanto, que seguir a regra.

Faço minhas as palavras do ministro das Minas e Energia: “parece até que está se falando de caso de corrupção de bilhões. Ô gente, é apenas uma nomeaçãozinha para um cargo de uma merreca de 2 000 reais. Isso é da cultura do país.” Querem que eu pague o pato? Onde está a justiça?

Sim, já ouvi dizerem que estou neste bom posto por causa de minhas relações amorosas com a filha de um político poderoso, quer dizer, neta. Querem até me acusar de inventar os atos secretos. Ora, eles são tão secretos que nunca vi um na minha vida. Sim, fui nomeado por um deles, fui? Não sabia, não. Mas isso não obsta a minha posição de servidor exemplar, digo aos senhores da imprensa que agora, sem diploma, só querem saber de distorcer os fatos. Nunca vi na minha vida este senhor. Se é autor e criador dos tais atos, não sei dizer. Só sei que fui nomeado nos conforme da casa.

Um colega do entrevistado chega. Pode perguntar para quem quiser, sou um funcionário exemplar. Verdade, disse o outro, não tenho nada que reclamar desse jovem. Não ligue não, rapaz, aqui todo mundo é indicado por alguém. Tascou-lhe um beijo na testa. Estão vendo? Isso prova que para além de qualquer acusação, sou um dedicado servidor público. Com o dedo em riste. Sirvo à nação. As lágrimas debulharam dos olhos ao que o outro que o defendera acorreu com um lencinho.

Recomposto: digo mais. Não estou aqui por causa de indicação apenas, sou preparado. Meu currículo é invejável, faço por merecer. Tenho curso universitário. Sim, senhores, tenho graduação em física. No fim das contas, dou status a este órgão. Sou pós-graduado em economia. Tem tudo a ver com a SAMS (Secretaria de Assistência Médica e Social do Senado), como não? Analiso as conjuminâncias retumbanticas da gravidade na quedas dos políticos. Olhem isso, pode dar até morte, se o pobre do senador é mais fraco. Não dou ponto sem nó. Faço maquiagem contábil. Opero bolsas e contas fantasmas, com especialização em paraísos fiscais. Sem dúvida, habilidades importantíssimas no Senado, quero dizer, na SAMS.

Não me envergonho de ter este emprego. Trabalho 8 horas todos os dias, mereço o que ganho. Concurso é necessário, mas não aqui, pois quem aqui manda não são pessoas comuns, merecem tratamento diferente, ou vocês não ouviram o presidente? Cuidado, analisem a biografia antes de falar.

Como não? Repito nosso presidente. “É preciso saber o tamanho do crime. Uma coisa é você matar, outra é roubar, outra é pedir emprego, outra coisa é relação de influência, outra é lobby”. Que história é essa de sair por aí aumentando as coisas? Quer saber? Vão aprender a classificar os crimes depois venham falar comigo, pois se tem uma coisa que aprendi neste lugar, que é uma escola, é que tô me lixando para a opinião pública, nem a de vocês. Vão se catar!

domingo, 26 de julho de 2009

Mas como me livrar do humano?

Mas como me livrar do humano? Pergunta Adélia porque tinha vergonha de pedir a Deus alguma coisa que ela, assim entendi, julgava uma bobagem – o não pedir e o pedir ao mesmo tempo. Pudores que nos matizam, paciência. Não lembro de ter pedido bobagem, algo como reclama o meio irmão de Jesus, Tiago: pedis e não recebeis porque pedis mal, para esbanjardes com vossos prazeres. Mesquinhos, acrescento.

Fraquejo, duvido e confesso. Não, não o faço de forma debochada, como a provocar, desafiar alguém de quem penso não ter poder para fazer aquilo que afirma ter poder para fazer. É irrefreável em mim o trazer à memória negativas outras. Brigo comigo. É justo pedir? Se não há qualquer merecimento em mim – que fiz que merecesse qualquer recompensa? –, dependo da boa vontade dEle, de quem Tiago diz vir toda boa dádiva e todo dom perfeito e a quem chama de Pai das Luzes, aquele em quem não há mudança, nem sombra de variação.

Mas eu sou vário, estou e não estou, desfaço-me e logo me recomponho noutro diferente de mim. Cambaleio como bêbado, tentando andar em linha reta. Me alegraria sobremaneira ser um, pelo menos uma vez. Mas esqueço minha face, segundos depois de me ver e se olho o fundo do poço que carrego, a água turbulenta não me deixa ver nunca a face verdadeira, ela se distorce pela ebulição constante. O olho aparece na boca e a boca na orelha.

Tiago reclama que quem duvida é homem de ânimo dobre, dividido, nem suponha que alcançará nada do Senhor. Haverá um meio termo nessa dura classificação? Quer o Senhor que eu não pense? Que me esqueça de tantas vezes o pedido negado e o silêncio como resposta? Quererá uma fé cega que não relacione um histórico de negativas que, por óbvio, não atino nem de longe? Nisso ele não toca.

Ah, o tempo. Me escapa o futuro e o passado me registra como tatuagens de histórias que não esqueço e voltam em golfadas de lembranças de outros nãos. Como prosseguir a pedir? De outro lado estou paralisado, moro no fundo do vale, não subi a montanha donde se pode ver a terra prometida. Capto visões de outros olhos. Será metediço querer ver com os próprios olhos? Nego-o por esta curiosa necessidade? Não diviso horizontes, carrego antolhos, só minha fala é conspícua, não conhece limites porque para o bem e para o mal, é o único que tenho.

É meu humano, barro do qual sou feito. Devo vencê-lo calando minhas perguntas e vivendo pelo exemplo alheio que diz que clamou assim e assim e milagrosamente foi ouvido? Exatamente como pediu e até melhor, arrematam sem se caber em si. Vai ver endereço o pedido para destino errado. Quem sabe?

Ouço o pedi, pedi, mas lá não está escrito, nem nos arredores, o manual das condições. Quero ler a letras miúdas no rodapé dos escritos. Que não me venham com pecados encobertos, desrespeitos secretos, males do pensamento, incúria com guardar os ritos, dias santos, comidas e o jejum em honra dEle. Negocio, porventura? Ofereço algo que já não tenha?