sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Melancholia


Há histórias e filmes que nos capturam desde o primeiro momento. Na minha opinião, não é o que ocorre a Melancholia. Assisti-lo, de início, igualou-se a um exercício tedioso. À realização de um ato de rotina. Fazer algo porque se tem que fazer. Visto nesta perspectiva, parece que detestei o filme, não é o caso. Mas prefiro filmes que, de algum modo, produzam em mim um tipo de conexão emocional e que por este canal me provoquem a crença e a compreensão das coisas.
Enfim, Melancholia é o sugestivo nome de um planeta gigantesco que saiu de sua rota nos confins do universo e veio trombar com a terra. Justine (Kirsten Dunst, aquela que fez a namorada do Peter Parker/Homem Aranha) e sua irmã, Claire, fazem o núcleo do enredo. Some-se o marido e filho de Claire e os pais de ambas, separados. A mãe, um saco de amargor até o tutano. O pai, um bon vivant sem responsabilidade. Um microuniverso de relações com todas as nuances boas e ruins. Funciona como um espelho de nossas preocupações frugais, maldades, mesquinharias, banalidades que vistos sob a perspectiva dos grandes dramas da vida que se esfacela sobre e ao redor de nós, são insignificantes.
Exceção aos pais, são eles que no filme viverão diante da notícia aterradora: um planeta colidirá com a terra, não antes de uma dança cósmica macabra de aproximação e afastamento como duas bolas de gude que caminham em direção ao fundo de uma bacia depois de alguns giros em sua borda.
Justine, mesmo em dias que simbolizam felicidade e promessa de futuro feliz – ela celebra seu casamento – é como que, aos poucos, infiltrada pela certeza do fim do mundo. Mas ela não sabe o que é. De forma insidiosa a inquietação, o desassossego vão se avolumando, tomando sua alma. A festa, os convidados, o noivo, a programação que sua irmã zelosamente preparou, tornam-se um fardo e algo absurdo. Algumas certezas e verdades, quando um ou poucos sabem, são produtoras de solidões imensas. É nesta consumição que ela busca conforto nos familiares e todos apenas a acham estranha, infeliz no dia da felicidade, distante, mal agradecida. Como comunicar sua dor e desespero?
Enquanto as pessoas se debatem com seus medos ou frouxas esperanças, Justine adoece, entra em profunda depressão. Não há saída. Não há plano B possível. A verdade adoece, mas também cura. E ela sobrevive ao ponto quando se foi tão longe que nada mais nos pode ser tirado. Nenhuma ilusão vingará, nem um consolo, mas nenhuma dor será bastante.
Seu cunhado, um homem riquíssimo, acredita piamente na ciência e seus prognósticos. Em dado momento, ele faz compras contra o que considera pequenos efeitos pela passagem do planeta. A desgraça nos alcançará um dia e nenhuma preparação será suficiente. Ele se consola com sua habilidade, sua verdade científica (que não falha), enconde-se neste saber até que, no momento fatal, diante do inexorável, nada tem a não ser uma brutal desilusão que o sucumbe. Há verdades mais importantes que as científicas? Qual delas devemos manter conosco e que nunca nos abandonará?
A proximidade do fim produz em Justine uma fortaleza emocional, um estado de serenidade. Torna-se ela, há pouco prostrada diante da terrível verdade, agora a que consola e sustenta o sobrinho e a irmã amedrontada e fraca. Para mim, a cena mais tocante do filme, seu resumo, o traço de genial criatividade de Lars Von Triers (diretor), é a construção de uma tosca “cabana” – não mais que alguns galhos em forma de pirâmide, sem paredes ou teto – que Justine chama de “caverna mágica” para o pequeno sobrinho. Enquanto o monstro Melancholia, algumas vezes maior que  a terra se aproxima para o abraço fatal e assoma, tomando conta de todo o horizonte, os três se dão as mãos. O menino, de olhos fechados, é o retrato da inocência e pureza. Ele sabe que está protegido e não tem nenhum medo. Claire, sua mãe, aguenta-se como pode, sofre e, como a mulher de Ló, quer ver a hecatombe sobre seu mundo. Não consegue desapegar-se. Justine, de olhos fechados, tem um leve sorriso, uma paz e tranquilidade de quem alcançou uma espécie de nirvana.
Lars Von Triers, o diretor, não conhece a música “O último dia” do Paulinho Moska que diz: Meu amor o que você faria? / Se só te restasse um dia / Se o mundo fosse acabar / Me diz o que você faria?” A pergunta – ou uma delas – é em quem estamos representados? Em Justine, que sabe da realidade e a aceita tal como é? Em Claire, que se perde ante a catástrofe e se desespera? No marido confiante e tranquilo em sua verdade científica infalível? Nos convidados do casamento que nada percebem e fazem apenas o rebanho de gente que vai para lugar nenhum? No menino que se sente protegido em sua “caverna mágica”?
Agora, depois de escrito este breve relato de minha experiência com o filme, percebo que provocou-me mais do que havia pensado. Talvez fosse o caso de repetir a experiência.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

A crise da meia(?) idade


Entre mulheres e homens com idades entre 45 e 49 anos, os cientistas perceberam um declínio no raciocínio mental de 3,6%. As conclusões contradizem pesquisas anteriores sugerindo que o declínio cognitivo só começaria depois dos 60.O estudo, publicado na revista científica British Medical Journal, foi conduzido ao longo de dez anos, entre 1997 e 2007.
Os cientistas avaliaram a memória, o vocabulário e as habilidades cognitivas – de percepção ou de compreensão – de quase 5,2 mil homens e 2,2 mil mulheres entre 45 e 70 anos, todos, funcionários públicos britânicos.

Fonte: BBC Brasil (6 de janeiro, 2012)

Até Parece que a pesquisa foi feita comigo, disse Asnovaldo. Para ver como o mundo evolui, se piora ou se melhora, não sei dizer, mas cada dia se descobre um mistério novo. Se bem que crise de meia idade não é mistério nenhum. Que não é nada de meia, está mais para lá do que para cá. O danado é que a gente ainda se enganava esperando os sessenta, para só então se queixar da escuta agravada, da vista cansada e dos esquecimentos de tudo enquanto.
Para mim foi um espanto, sim senhor. Antigamente, em se tratando dos homens do sexo masculino – Asnovaldo gosta de falar assim não por pedantismo é porque, diz: ‘o mundo está escalafobético nesta área havendo homens que não praticam o sexo masculino’. E, ainda segundo diz: é difícil de separar um do outro – o problema era só aquele de falhar na hora agá. Não aquela falha ocasional que quase todos os homens experimentam em algum momento da vida, mas  aquela falha recorrente e persistente da qual jamais se falava. Um compadre meu, coitado, tornou-se um mentiroso desavergonhado nesta questão. Ô homem de ter aventuras calientes!
Aconselhei o pobre umas poucas vezes. Mas ele ora ardia como um amante latino, quase um Rodolfo Valentino, ora mergulhava sorumbático num mutismo comatoso, se tão somente o assunto roçasse a questão sexual. Minha comadre, que era mulher séria, aguentou aquela desdita até não poder mais. Foi inventarem aqueles remedinhos azuis e meu compadre virou a besta fera de assanhado. Mas sem medir presão e fazer checkup do coração a afoiteza virou defunteza. Deus o tenha em bom lugar (benze-se).
Parece, por outro lado, que o risco vale, mesmo sendo arriscoso, havendo mesmo quem defenda a aventura como uma forma de sair de um paraíso e ir a outro, mesmo a despeito das ridículas e vexaminosas circunstâncias em que o pessoal do iml encontra o decujus. Vôte!
Já repararam? A coisa está ali quieta. Não tem nada de defeituoso e você, capengando, vai dando para o gasto. Então, um pesquisador sem ter o que fazer, diz que 45 anos e não 60 é a idade em que a coisa começa a degringolar. Eu que passei um ano depois desta fronteira me quedo descobrindo uma mouquidão que sempre vivi com ela sem fazer vexame, mas que agora precisa de aparelho. A vista sempre foi astigmatizada mesmo. E o esquecimento?! Ah, já estou com medo até de esquecer o próprio nome.
O sujeito está bem. Alguém – isto é coisa de mulher – insiste para fazer uma consulta, olhar os aparelhos, fazer uns ajustes, sei lá mais o quê. Para livrar-se da insistência, vai ao médico e acaba descobrindo que, por pouco, não seria chamado de zumbi. Quer dizer, já estava morto e não sabia. Aí aparece tudo quanto é engriguilho. E eles defendem a má notícia dizendo que é melhor ir porque se descobre precocemente – pessoal da saúde adora esta palavra – e ajeita os pandarecos. Onde já se viu...
É a profecia que se autocumpre. E o sujeito não vivia bem? Eu não posso ouvir estas coisas de pesquisa que me impressiono. Serei, como se diz? Um hipocondríaco! Serei? Não sei. Mas que estou mouco como uma porta é como me sinto. Cego ainda não, mas quase e esquecido... do que que eu estava falando mesmo?