E se de
repente você descobrisse que é capaz de mover os objetos com o poder de sua fé
(mente)? E se esta descoberta acontecesse numa idade em que fantasia e
realidade se interpenetrem sendo difícil discernir em qual dos lados se está?
Suponha que este grande evento, a descoberta deste “poder”, aconteça em meio à
primeira grande crise de sua história como pessoa. Uma separação de alguém que
você ama e com ela mantém uma belíssima amizade, uma cumplicidade, e que esta
pessoa lhe seja companheira de aventuras imaginárias fantásticas.
Este é o
enredo de Little boy, segundo longa do diretor mexicano Alejandro Monteverde. Pepper
é um garoto de 8 anos cujo pai vai para a guerra. A separação é terrível, mas
ele imediatamente busca uma forma de trazer o pai de volta. Mágica e fé em sua
cabecinha são a mesma coisa. De um lado, seu heroi de quadrinhos, Ben Eagle,
uma espécie de Mandrake. Quem lembra? De outro, o padre e sua homilia sobre
mover montanhas com a fé: se você tiver a fé, mesmo do tamanho de uma semente
de mostarda.
Pepper, o
Little boy, leva as duas ideias ao pé da letra e tem-se uma história sobre fé e
descrença. O diretor simula uma fábula inocente. O lugar é paradisíaco. A vila
O’hare é idílica. Encravada no sopé de um belo monte e à frente a imensidão do
oceano. O colorido das casas, a luz viva do sol sugere um lugar atemporal,
embora a história se desenvolva no período da segunda guerra.
Entre a perseguição de garotos
mais velhos e malvados e sua luta por cumprir as regras ancestrais – uma série
de atos bons que lhe deu o padre, acrescido da missão de tornar-se amigo do
único japonês existente no lugar – aumentaria a fé de Pepper e, em
consequência, ele poderia trazer o pai de volta.
O padre é um
homem bom e acolhedor, mas parece ter uma fé que tem dificuldade de ficar em
pé. Principalmente diante de questionamentos do pequeno Pepper. Hashimoto, o
japonês, é o cérebro, o homem que não tem fé. Mas mantém uma saudável relação
com o padre com quem joga cartas de vez em quando. Chama Deus de “amigo
imaginário” do padre, que nunca se sente ofendido.
A amizade
entre Pepper, o garoto perseguido pelos outros, e um japonês residente nos EUA
durante a segunda guerra, parece improvável, mas ambos são muito próximos na
condição. A região e a casa do japonês, ao contrário das demais, é cinza e não
há jardim. Ele é o inimigo. O mal. Só haverá luz do sol na casa dele no final
do filme. O filme fala, portanto, de tolerância também.
Quanto à fé, o
diretor a desconstrói com as falas do Hashimoto, com as equivocadas
interpretações da comunidade que, pouco a pouco, vai notando em Pepper um
garoto especial. Pepper tem a fé de uma criança. Ele crê de uma forma
absolutamente concreta que se sua fé chegar ao tamanho do grão de mostarda, ele
trará o pai de volta. A prova é mover a montanha logo atrás da cidade. Bem,
este momento chega. A coincidência com um terremoto no momento exato leva a
vila quase inteira a acreditar nos poderes do garoto.
Há incréus
aqui e ali. Diferentes do Hashimoto, são apenas cínicos, confusos, ressentidos.
O amigo do garoto que o aceita em sua infantilidade e que o ajuda a cumprir com
as “regras ancestrais”, o respeita em sua infantilidade. Teme por sua fé mágica
quando sugere ao padre que a decepção de um deus que não responde – não traria
o pai do menino de volta – arrasaria com ele. O padre apenas responde que o “amigo
imaginário” cuidaria dele.
Por
fim, o diretor parece dizer que a fé é algo para gente simples de mente e
crianças que não sabem separar o poder de um mágico e os acontecimentos que a
fé produz. Cegos, tomam uma coincidência por resposta de Deus. Parece
perguntar: para que serve mesmo mover uma montanha e lançá-la ao mar? Mas esta
é apenas uma pergunta que Little boy (Pepper) faria.
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