O texto abaixo foi publicado na Página Gospel do Jornal Pequeno - 29/12/2008
Sabemos mais ou menos o enredo. Final de ano, fala-se quase sempre em renovação, novos planos, objetivos a serem traçados para o ano seguinte daí a poucos dias. Isso se os muitos rega-bofes de que participamos nos deixam pensar um pouco. Não lembro de quase nada que prometi ano passado. Nem tenho o hábito de prometer.
De fato, a maioria de nós que entra nesta onda de prometer, está fadada a quebrar as promessas. De modo que uma promessa de fim de ano vale tanto quanto um centavo furado. Não porque sejamos descompromissados, mentirosos contumazes, mas porque o fazemos por fazer, nem sequer um balanço do que passou foi feito, como queremos já nos comprometer a construir?
O problema, penso eu, envolve algumas questões. A gente se conhece pouco, ou melhor, até se conhece, sabemos que não faremos aquilo com que nos comprometemos, mas como pega bem, a aprovação dos circunstantes é unânime, então acreditamos, embora lá no fundo você grite pra você mesmo: ei, não quero e não vou fazer nada disso.
Outra questão é que a promessa que começa datada ou postergada, tende a não se realizar. É o nosso caso: faremos isso e aquilo, mas depois das festas que no caso de muitos é lá, depois da sexta-feira da paixão. Certo, promessa refere-se a algo num futuro, em data xis ou mais menos ao seu redor. Concordo. Mas promessa também tem que ter raiz no presente quando é asseverada. Tem que ver com o indivíduo, seu contexto, sua capacidade, suas posses, suas ações naquele momento. Raros são os casos em que, aparentemente, do nada surge uma idéia e nós dizemos: farei isso ano que vem.
Promessa (fala e pensamento) está intimamente ligada ao corpo. Palavra e ato trabalham no sucesso do projeto. Não são arrancados do vazio. É como se cada feito nosso precisasse de uma gestação. Excetuem-se os rompantes diante de um imprevisto. O resto precisa funcionar assim. O falado, conectado com o real, com o conhecimento de si mesmo e de sua realidade, traz à existência aquilo que foi apenas plano. Não é o verbalizar a esmo que faz acontecer, mas um processo que transforma a energia do que foi dito em ação. A idéia transmuda-se em feixes de músculos, em tecidos do coração, em alvéolos do pulmão, em sangue a irrigar cada célula.
A parábola de Jesus sobre construir é útil aqui. Incrível é que ele se refere a segui-Lo, porque até aí há o que dimensionar. Primeiro, que o prêmio não está disponível em moeda sonante. Segundo, possivelmente não há qualquer reconhecimento, às vezes perseguição, e terceiro, os valores pelos quais a pessoa deverá se pautar estarão, na maior parte do tempo, em confronto com o mundo.
Ele disse assim: “De fato, se alguém de vocês quer construir uma torre, será que não vai primeiro sentar-se e calcular os gastos, para ver se tem o suficiente para terminar? Caso contrário, lançará o alicerce e não será capaz de acabar. E todos os que virem isso, começarão a caçoar, dizendo: ‘Esse homem começou a construir e não foi capaz de acabar!’”. (Lc 14.28-31 – EP)
O não cumprimento de promessas leva a um círculo vicioso ao qual muitos se acomodam. É para ser aceito? É para ser aprovado pelos demais? É para se livrar de um problema ou de uma saia justa? Pois digam ao povo que farei. Isso no aspecto externo. No interno leva à lassidão e à frustração, se ainda nos resta algo de brio. O tempo tratará de transformar este comportamento numa fé ao contrário em si mesmo. Um pessimista. Ah, não dá. Não consigo. Já tentei. Eu sou assim.
Nenhuma promessa deve ser derrogada, mesmo aquelas que se referem ao vulgar compromisso de perder uns quilinhos a mais, sempre dito que foram nas festas e não ao longo do ano inteiro que foram acumulados. Mas energia para realizar pede sempre mais que um bom equacionamento psicológico, uma capacidade de planejar, pede fé que pressupõe a ajuda de Deus e isto envolve outra esfera da vida. Não é o caso de delegar a Deus aquilo que se deve fazer, mas pedir que Ele seja o companheiro na sua construção.
Tomo aqui emprestado uma fala de Paulo que em carta aos crentes em Corinto, atribuía seus feitos e falas a Deus: “E é por intermédio de Cristo que temos tal confiança em Deus; não que, por nós mesmos, sejamos capazes de pensar alguma coisa, como se partisse de nós; pelo contrário, a nossa suficiência vem de Deus...” (2 Co 3.4, 5 – ARA)
Ele quer dizer que Deus foi sua força motivadora, sua inspiração. Aqueles que conhecem um pouco a história de seu ministério, sabem que foi como diz em outra passagem entre dores de parto (Gl 4.19) que ele cumpriu sua obra de anunciar o Reino de Deus entre as gentes. Uma promessa descuidada não resistiria a tais provações, como em qualquer outra área, não resistirá à provação do tempo, da perseverança, da derrota. Deus é, portanto, imprescindível.
Jesus complementa a parábola anterior com outra semelhante. Fala de um rei que se prepara para a guerra. Ele percebe que seu exército é menor, então envia embaixadores para negociar a paz. Isso nos fala de que nenhum plano é definitivo. Sempre haverá surpresas. É preciso deixar espaço para o inesperado e admiti-lo como parte do projeto, embora não se saiba o que será, mas só o fato de se estar precavido, ajudará a enfrentá-lo.
A vida não é uma linha reta, nem tem a exatidão matemática que desejamos. É múltipla, cheia de curvas, ora deserto, ora floresta luxuriante, é diversa e é isso, afinal, que faz seu encanto. Faça planos, comprometa-se, há muito o que fazer, mas convide o Senhor Deus para fazer parte da aventura que é viver você. Não se preocupe, nada em você lhe surpreenderá, inclusive uma ou outra tentativa de desistir, pois é exatamente nesse momento que Ele fará diferença na sua vida.
Desejo a todos um ano feliz. Saúde e Paz sob a graça de Deus.
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