Volto ao tema
de Orlando. Faço-o motivado pelo desejo de dar um equilíbrio, talvez um pouco
mais que isso, combater ideias estereotipadas, rasas, generalizantes sobre as
razões porque o cara assassinou 49 pessoas e feriu 53.
Contardo Calligaris,
já falei dele aqui,
é um psicanalista de renome e como afirma em seu último texto na Folha de São Paulo
(O responsável de Orlando, 16/06/2016), jornal no qual escreve semanalmente,
tem mais de 30 anos de clínica. É um bocado de experiência! Mas quem disse que
experiência é prova de equilíbrio, ouso dizer, honestidade intelectual?
Como eu
escrevi no post anterior, logo que me dei conta das primeiras informações sobre
as mortes, comecei a desconfiar que o assassino teria razões inconfessáveis
para perpetrar ato tão hediondo. Pois bem, Calligaris – aí, sim, sua
experiência mostra sua validade – fez uma bem fundamentada exposição (do ponto
de vista psicanalítico) das razões psicoemocionais que levaram o sujeito ao ato.
Devo dizer que concordo com Calligaris completamente neste ponto, embora não
partilhe de sua aboradagem.
O psicanalista,
contudo, não poderia negar seus fundamentos ideológicos. Assim, nos três parágrafos
finais, o homem acusa quem de fato, segundo sua lógica torta, são os
verdadeiros culpados. Um contrassenso com o título, como se verá.
A preparação
do arremate do texto é uma temeridade. Diz Calligaris: “Por isso, atrás de cada infeliz que agride o membro de uma minoria
sexual, há outros que são responsáveis e deveriam ser imputáveis tanto quanto o
agressor – se não mais.” Isso equivale a um pequeno surto. Contra todos os
cânones de princípios jurídicos vigentes no mundo ocidental, cristão e
democrático, nosso herói sugere que a culpa por ato tão nefasto seja
socializada. Parece que no mundo calligariano se pode desindividualizar a
culpa. Lembra o PT ou o Lula – o que dá no mesmo – que, pegos nos atos
criminosos, alegam que todo mundo fazia antes deles. Culpados são sempre os
outros.
O psicanalista
registra, por fim, que todos os enrustidos e reprimidos sexuais só o são porque
existe um discurso que sustenta a propaganda política e religiosa, no caso
presente, homofóbica. O argumento deste homem é, no mínimo, solerte.
A se levar a
sério o que diz o articulista da Folha, o mundo deveria se tornar uma ditadura
do pensamento sexual único. Toda a discurseira pró homo não tem mais que umas
décadas, se tomarmos Stonewall como referência. Mas o pensamento
judaico-cristão que, asseguro, NÃO É HOMOFÓBICO, se mede em milênios. Não faço
competição temporal, ou defendo um chocho argumento tradicionalista/conservador.
O tempo aqui tem a representação de algo que foi avaliado, pensado, articulado
em palavras por milhares de pessoas ao longo do tempo. Está curtido de meditação.
Ademais, e é o mais importante, tudo isso está fundado numa Palavra que tem um
valor de fé. São princípios espirituais que se creem terem sido determinados
por Deus. Não querem, por capricho, atazanar os gays. Nem deles se ocupam como
se fossem a coisa mais importante do mundo. Em todas as passagens bíblicas,
esta questão é apenas um item em uma lista de outras coisas.
Ah, tem algo
curioso em que Calligaris reproduz o pensamento do Jean Willys em seus posts
sem noção internet afora. A tara por acusar e incriminar o cristianismo. Ele só
se permite acusar o islamismo de viés, na figura do pai do assassino. Tinha que
ser o pai, né? O homem teria dito ao filho que os gays vão para o inferno.
Calligaris não se faz de rogado e interpreta psicanaliticamente o que esta fala
causou à mente do gay louco. No mundo politicamente correto destes insensatos,
é proibido falar mal dos muçulmanos. Eles são vítimas do ocidente
judaico-cristão. Os Palestinos, então, são as vítimas-coitadas universais. Se alguém
não sabe, a esquerdalha é a grande patrocinadora do coitadismo no mundo. Voltando.
O país de
Calligaris, a Itália, agachou-se na visita diplomático-comercial do presidente
iraniano e até encaixotar obras da Renascença – porque estavam nuas – eles
fizeram. Não queriam ferir os sacrossantos olhos do religioso xiita. O ridículo
foi tanto que uma foto oficial entre presidentes, que tinha uma estátua
equestre de um César ao fundo, foi cancelada porque aparecia o colhão do
cavalo. A França que recebeu a mesma comitiva iraniana recusou-se a transigir
com seus valores. Cancelou um almoço porque os fanáticos queriam determinar o
cardápio, inclusive proibir vinho à mesa. E olha que os franceses queriam
vender também, e venderam.
É fato
inconteste, porém, que pessoas que se dizem cristãs, por exemplo – não me ocupo
dos muçulmanos aqui –, estão eivadas de preconceitos, falsas compreensões,
interpretações equivocadas, tudo fruto de teologias doentes e, mais que tudo,
desconhecem o Espírito da Palavra que é misericórdia, justiça, amor, etc, etc. Agora
mesmo, um pobre coitado conseguiu seus quinze minutos de fama nos EUA. Pastor, Roger
Jimenez se disse triste porque o tresloucado não acabou o serviço na boate
Pulse. Que gostaria que o governo colocasse os gays num paredão e explodisse
suas cabeças. Ele também fez aquilo que Calligaris faz no penúltimo parágrafo
de seu texto: generalizou. Atribuiu a todos os gays um comportamento pedófilo e
os chamou de predadores e abusadores. Isso é cristão? Afirmo categoricamente:
NÃO! A fé cristã sofre pelos mortos e chora com seus familiares.
Calligaris nos
brinda com essa pérola: “São os que
contribuem para que esse infeliz não consiga tolerar seu próprio desejo: o
bêbado do boteco que faz piada de veado e traveco, os pastores e os padres que
querem curar homossexuais...” É proposital o que faz este senhor: bêbados
de boteco, pastores e padres... Por sua régua, todos em pé de igualdade. Acho
que Calligaris bateria palmas se Costinha fosse exumado e seu corpo
vilipendiado em praça pública. Na Escolinha do Professor Raimundo, sua única
função era contar piadas de “bichinha” como ele chamava os gays. Ainda está no
ar no canal Viva da Globo. Taí uma sugestão Calligaris: encabece uma petição
virtual para cancelar a repetição do programa.
É evidente que
vender a ideia de cura de homossexuais é errada. Nem sei se as pessoas fazem
isso de forma tão direta como o fazia o finado Projeto Exodus e este mesmo se
limitava a ofertar seus “serviços”. Mas é verdade também que muitos gays
praticantes atormentados sozinhos por suas incongruências de alma, buscam na espiritualidade
cristã uma forma de se resolver. E o fazem de livre e espontânea vontade. Não
consta que igrejas, mesmo as mais destrambelhadas, cacem gays nas ruas para obrigá-los
a se curar. Algo parecido com o que foi feito com os dependentes de crack em
algumas capitais brasileiras.
Como o
psicanalista sabe muito bem, há inúmeras outras coisas que as pessoas carregam
em si e rejeitam. É possível que não tenha o peso de uma identidade ou desejo
sexual, mas a estrutura do problema é o basicamente igual. Será que o diagnóstico
do doutor está fundado também em discursos impróprios dos outros que, por
loucos que sejam, existem e não são crimes na sociedade plural em que vivemos?
Calligaris
está com raiva. Transparece no texto. Está cheio de certezas fanáticas,
diversas de um Jimenez apenas porque despidas do elemento de fé. Sofisticado,
não teria coragem de verbalizar as aberrações do pastor, mas, no fundo, é um fanático
também.
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