domingo, 7 de junho de 2015

Bicho também é (quase) gente



Pesquisa do IBGE revela que, no Brasil, o número de famílias que criam cachorros já é maior do que o de famílias que têm crianças. Causas demográficas e econômicas mostram que o fenômeno, similar ao de países ricos, vai se acentuar daqui para a frente.

Fonte: Veja (Cecilia Ritto e Bianca Alvarenga - 04/06/2015)

Eles são fofos. Comem comida gourmet. Vão ao salão pelo menos uma vez por semana. Vestem roupinhas transadas. Ganham brinquedos de aniversário. São levados para passear. Ficam em hotéis especialmente pensados para eles e que tem uma bela programação de entretenimento, com direito a muita brincadeira, piscina e até massagem. Tem planos de saúde. São acarinhados e recebem todo tipo de mimo.
Os cachorros e gatos estão com tudo. O IBGE disse que há mais bichos de estimação – que os metidos adoram chamar de pets – que crianças no Brasil. Que estamos parecidos a países ricos como o Japão. Ninguém fala quão longe estamos da qualidade de vida que os japoneses – gente, não bicho – levam. Já um monte de estudiosos sociais se debruçou a procurar explicações para o fenômeno, pois que é a onda do momento.
Dizem que o povo agora arruma as trouxas muito tarde. Que demoram a sair de casa. Que houve aumento da população idosa e que, sozinhos, adotam bichos, que chamam de bebês. Um desavisado cai facilmente na esparrela de pensar que os petófilos quando falam de certa pessoa – às vezes eles têm nome de gente também – não é de gente mesmo que falam. Até descobrir, meio consternados, que o tal Bob é um desses cachorrinhos da moda. Sim, tem moda de cachorro. Tem época que ter uma raça é o must da vida. Sou do tempo do pequinês. Ainda existem?
Ai de você se, depois que o fulano bicho foi incluído na rede de amizades – isso inclui as redes sociais, por suposto – esquecer o aniversário do – me desculpem – animal. Bem esta falta ainda encontra perdão, mas se não for ao mensário ou festa do aniversário do dito, ganhará um inimigo figadal pela desfeita. Seus pais/donos adoram chamá-los de filhos. Acostume-se.
Mico mesmo é quando se encontra o tal mimado em carne e osso. Aguente firme as lambidas babadas, o sem modos da saudação. É de bom tom passar a mão na cabeça do bicho e caso ele abocanhe sua mão, apenas ria e tente, pedindo desculpa aos pais, retirar a mão da bocarra com jeitinho para que o coitado não tenha um ataque de birra. Tudo isso acontecerá sob o riso condescendente deles. Ele quis fazer sua perna de parque de diversão sexual? Faça piada e não perca a pose. Piada politicamente correta, claro.
Ligou para o amigo ou amiga e, por puro descuido, esqueceu de perguntar como anda o Bob. Vai ouvir em tom de lamúria ou de cobrança: pô, fulano e você nem pergunta pelo Bob? Ah, sim, e o Bob, como está? O pai/mãe todo pimpão: está ótimo. Você não sabe da última. E lá vai deitar falação da inteligência, das traquinagens do Bob. Só falta falar, dizem quase sem se conter. Bizarro! E você lá com cara de nhô zé ouvindo com aquele sorriso amarelo na boca em tom de aprovação, pois não é louco de não dar este sinal corporal.
Quer ser aceito e festejado, minta descaradamente sobre gostar de bichinhos de estimação. Rem3endo. Filhinhos, babies, lindinhos. Defenda status de gente para eles, pois como dizia o filósofo canastrão abestado Magri – procurem no Google – cachorro também é gente. Se não fizer, vai perder emprego, não vai conseguir se reposicionar no mercado. Quer ser da hora? Ponha umas fotos de cachorro no perfil do facebook. De preferência, aquelas típicas de sacos de ração: uma praia ou campo verdejante, você correndo e o bicho morto de feliz ao seu lado. Morto é só figura de linguagem, não me entendam mal, não há qualquer sugestão terrorista implícita.
Pega bem pra caramba ser membro, mesmo que seja fictícia, de uma sociedade protetora, nem que seja das baratas cascudas ou dos coelhos cotós. Quando foi a última vez que você encheu o saco dos passantes para pedir dinheiro para os vira-latas que não sabem balançar o rabo? Erro crasso se quiser ter assunto nas rodas. Uma tardezinha no semáforo já para compensar o desleixo com a causa! 
Criança? Pra que criança? Essa coisa esquisita que só dá trabalho. Você se mata de trabalhar para dar tudo, ainda carrega nove meses na barriga, crescem, abandonam a gente, não dão a mínima. Nunca reconhecem seu sacrifício. Quando aparecem é para pedir e são um posso de mal agradecimento. Eu hein?!!

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