A prefeitura da
cidade espanhola de Zaragoza lançou uma campanha para alertar familiares
inadimplentes que quem não saldar dívidas com cemitérios locais terá os restos
mortais de seus entes exumados.
Aproveitando a chegada do dia de Finados - que
na Espanha é celebrado no dia 1º de novembro - a prefeitura colocou adesivos
nas lápides advertindo que a sepultura está com pagamento vencido e que os
familiares tem 15 dias para saldar suas dívidas, em geral ligadas a taxas de
manutenção dos cemitérios. relacionadas a taxas.
Fonte: Anelise
Infante (De Madri para a BBC Brasil - 28 de outubro, 2011)
A família chegou ao cemitério com
as dores distantes, as lembranças frescas e, por que não dizer, com certa alegria
em, digamos, rever os parentes enterrados no jazigo familiar. As crianças
faziam perguntas inoportunas e enchiam a paciência porque não entendiam a razão
de visitar um cemitério, ainda por cima “ver” pessoas que elas nunca
conheceram.
O pai, empertigado, disse que era
um dever familiar visitar os parentes, afinal, era uma vez só no ano e eles,
coitados, passavam os outros 364 dias sozinhos. Era também um dever cristão,
sem contar que relembravam boas coisas e riam de episódios que só o cemitério
mesmo para fazê-los voltar no tempo.
Estavam ali, quase displicentes
naquela fresca manhã de finados, quando viram de longe, circundando a base da
estrutura, uma faixa que dizia “Jazigo vencido” em letras vermelhas garrafais.
Sobre o túmulo, um estranho amontoado de ossos, formando um quebra cabeça
asqueroso. Ainda estavam em choque, aquilo só poderia ser uma brincadeira de mau
gosto. Não era. O filho mais novo, num segundo, já havia pegado um fêmur e
começou a bater no irmão mais velho que abriu um berreiro. A mãe, atarantada,
tentou impedir que o outro filho fosse nocauteado e acabou derrubando um dos
crânios que rolou rua abaixo com a boca escancarada num sorriso apavorante.
O marido deu um berro de pavor e
indignação e agora, quem era quem? Somente naquela sepultura havia umas três
gerações da família e estavam misturados. Procurou a direção do cemitério,
exigiria explicações. Mais que isso, pediria uma indenização por falta de
respeito com sua família.
O gerente do cemitério disse que
enviou mais de dez correspondências aos mortos cobrando anos de taxas não
pagas. Ou ele pensava que só porque estavam mortos não teriam que pagar para
ficar ali? Aliás, disse ele, a inadimplência havia chegado ao cúmulo que
pensavam até em falir o cemitério. Mas nem todos são salafras, olhe aqui seu
Euzébio, paga direitinho. Mas para cada pagante há dezenas de defuntos
caloteiros.
Ele não sabia o que dizer e falou
o que lhe veio à mente. Quem sabe eles não tivessem recebido a correspondência,
afinal o correio vive em greve. Ele mesmo, em várias conversas com eles, nunca
soube de dívida nenhuma. Como assim, conversas com eles, quis saber o gerente
do cemitério. Só você que é um desalmado que não fala com seus mortos. Mas o
que ele queria saber era como é que iam montar os corpos novamente. Eu não
quero nem pensar no que o vovô vai dizer quando se perceber com uma anca da tia
Gertrudes, logo ele que sempre foi machão. E tia Quina, com a cabeça do primo
Ernesto.
Desculpe, senhor, mas estamos
numa crise severa e o senhor não vai acreditar na quantidade de defunto velhaco
que temos aqui e olha que avisamos com antecedência. A ordem aqui é de despejo
para quem não pagar. Eles se valem de sua condição, querem que tenhamos pena
deles, mas e as taxas atrasadas e os vivos que trabalham, não comem? Não quero
saber de suas razões. Processarei este cemitério, no mínimo, por vilipêndio dos
corpos e covas, quem sabe não cabe aí uma brecha legal no estatuto do idoso.
Ao voltar à cova, o pai
encontra a esposa em estado de choque. Pega um crânio: vovó, é a senhora?
Solta, pega um braço que se esfacela: desculpe tia Quina, é que a senhora está
tão magrinha. Primo Ernesto! Os meninos, já reconciliados, faziam embaixadinhas
com a cabeça do tio para total desespero dos pais.
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