sábado, 3 de dezembro de 2016

Não sois máquina! Homens é o que sois!

Sempre desconfio de quem tem ideias para melhorar a humanidade. Melhorar o design, aperfeiçoar a raça. Sinto um arrepio, pois ouço um eco, não tão longínquo assim, de eugenia a espreitar pelo buraco da fechadura da história.
O fantasma parece muito vivo e mostra a cara sem pudor nas redes, agora nas ruas da Europa e EUA. As razões são parecidas: a imigração descontrolada de refugiados para Europa e a invasão dos latinos nos Estado Unidos. Tudo isso azeitado por um populista que chegou ao poder exaltando o poder branco, muros, misoginia e uma grandiosidade do país que pensa perdida. Ou seria apenas uma retórica oportunista que deu certo?
Talvez seja apenas outra faceta deste admirável mundo novo que a tecnologia promete. Ainda timidamente um movimento começou entre europeus que se dizem transumanos. O que seria esta nova casta de seres trans? São pessoas que acreditam aperfeiçoar e melhorar os seres humanos com o uso da tecnologia. De que forma?  Através de implantes de chips, ímãs, eletrodos que, espalhados pelo corpo, dariam a estas pessoas sentidos mais apurados, sensibilidades fora do comum. No momento, eles acreditam estar coletando dados que comprovam sua controversa teoria.
Uma mulher que adotou a filosofia diz ter implantado mais de cinquenta ímãs em todo o corpo e ponta dos dedos, além de chips, inclusive um que substitui seu cartão de crédito. Alguém sentiu um cheiro de apocalipse? Ainda não é para tanto. A questão parece mais perturbadora do ponto de vista psicológico. Por que alguém quereria superar a dimensão de carne e osso? Que fantasias acalenta uma pessoa que deseja obter uma espécie de transcendência à condição humana com instalações eletrônicas no corpo?
Não é curioso que enquanto pessoas se maquinificam, a literatura e o cinema estão cheio de máquinas que anseiam experimentar nossas humanas emoções? Sugiro a interessante série original da HBO, Westworld.
Suspeito que as pessoas bem resolvidas tem uma admiração e até assombro pelo que somos do ponto de vista psicobiológico. No corpo há um sentido estético. É um instrumento da manifestação da existência. Os transumanistas disfarçam uma insatisfação com a limitação. Seria um tipo de novo de transtorno dismórfico corporal? Uma versão ciborgue da vigorexia? Ou uma anorexia de ser gente?
O avanço da biomecânica associada à eletrônica tem produzido próteses revolucionárias. Mas o propósito é claramente direcionado para dar a alguém a qualidade de vida perdida com uma amputação, por exemplo. O que impede de alguém saudável usar esta tecnologia para se tornar superior? Nada. Mas é de se avaliar se estes homens/mulheres de seis milhões de dólares ou estes Maxsteel são saudáveis emocional e psiquicamente.
A filosofia e a espiritualidade em cinco mil anos de história humana ensinam que a maneira de evoluir é o conhecer a própria alma. O oráculo de Delfos dizia a seus frenquentadores: conhece-te a ti mesmo. Não há maior aventura. A descoberta de nosso universo interior não nos torna superiores, mas humildes. Não nos faz melhores que ninguém, mas irmanados. Resulta também no conhecimento do outro, afinal somos todos do mesmo barro. Transcendemos o humano nos tornando mais humanizados.

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