Ao assistir
Planeta dos Macacos – O Confronto, pensei várias vezes no conflito entre
israelenses e palestinos que neste momento chega a um de seus muitos momentos
críticos. Imagino que, dentre as várias ideias possíveis para interpretar o
filme, esta não tenha sido a intenção dos produtores e roteiristas.
Neste filme, quinze
anos se passaram desde a fuga dos macacos. No período, uma gripe símia, fruto
de uma experiência genética, dizimou quase toda a população humana. Os macacos
prosperaram numa comunidade inclusiva, cooperativa e pacífica numa floresta nas
proximidades de São Francisco. César, o primeiro macaco a se tornar inteligente
e libertador dos demais, é seu líder inconteste.
Um incidente
coloca os dois grupos em novo confronto. Um humano, por medo e susto, mata um
macaco adolescente. A partir daí operará a lógica que explica tantas disputas e
guerras entre povos hoje. No papel de ressentido, vingativo e desconfiado está
Koba, um chimpanzé que era líder entre os macacos antes da libertação e que foi
suplantado por César. Ele odeia os humanos porque foi vítima de experiências de
laboratório.
Koba,
possivelmente, nunca aceitou uma posição subalterna. A morte do jovem macaco
lhe dá uma razão a mais para questionar a liderança – e isso vai num crescendo
cada vez mais ousado – de César. Ao mesmo tempo, ele instiga os macacos para
atender seu plano de vingança. Ele usará todas as suas artimanhas e ódio para
provocar uma guerra, confronto a que César resiste. Ele argumenta a perda de
vidas, das famílias, de tudo que construíram.
A comunidade
de macacos vive em paz sob a liderança de César, mas regida por uma lei maior
de cooperação e que nenhum macaco deve matar outro macaco e que unidos eles são
fortes. Na luta pelo lugar de supremacia nesta nova ordem, os dois grupos, em
vários momentos usarão argumentos que desconstroem o outro. Quando um humano vê
apenas um macaco, ele o chama de animal, como que a rebaixá-lo a uma condição
em que é válido aniquilá-lo. Quando os macacos julgam todos os humanos como
maus, eles incorrem no mesmo erro.
Desconstruir o
adversário, apelidá-lo, deformá-lo, alegar práticas horrendas para minha
sensibilidade cultural/religiosa é uma forma de distanciamento e de manutenção da
minha própria convicção. Muita gente não deseja perdê-la, sob pena de perder-se
de si mesmo. Resultado: medo, insegurança, violência.
Como grupos
black bloc, Koba usa as leis de livre manifestação para destruir a ordem e para
tentar suplantá-la. Como eles usam o vale-tudo, sempre alegando a defesa de
supostos direitos que julgam lhes ser negados, Koba está disposto a fazer
qualquer coisa para atingir seu objetivo. Quando é questionado, mostra marcas
de seu sofrimento em experiências, acusa César de gostar mais de humanos que de
seus iguais. Os Black Bloc nem sequer isto tem para justificar-se.
O desesperado
Koba é como as minorias radicais – algumas delas muçulmanas. Usam o espaço
democrático para impor seus desejos e planos, mas são incapazes de estender
este valor a outros. Quando pegos em delito, justificam-se pela exclusão que
dizem sofrer ou se escoram em suas leis religiosas e culturais, valores estes
que a sociedade democrática e, particularmente, sob o tacão do politicamente
correto, tem medo de questionar e quando o faz, logo encontram tolos dentro desta
mesma sociedade que criticam esta postura em nome de uma tolerância ou não
discriminação que não encontra lugar em qualquer espaço organizado onde existam
leis e limites. As ditas minorias, os black blocs aprenderam a desfaçatez como
arma, o descaramento como aríete em favor de seus interesses.
César
estabeleceu uma lei que é seguida à risca entre os macacos: macaco não mata
macaco. Koba ultrapassa esta linha num atentado contra César com uma arma
humana. Como Nero, queima a própria casa para acusar aos humanos. No caos, ele
prospera. Na conversa falsa. Na posição de vítima. Com a aparente morte de
César, Koba lidera um ataque contra os humanos. Centenas morrem dos dois lados.
Na primeira oportunidade, ele prende antigos aliados de César e mata o primeiro
que se nega a atendê-lo e o faz como um espetáculo de medo para dominar. Em logo
diz: macacos agora seguir Koba.
César se
recuperará e terá a oportunidade de constatar que eles não são muito diferentes
dos humanos na perfídia. Ele, que julgava os macacos superiores, como se
tivesse lido Voltaire e sua teoria do bom selvagem. Reconhece também que tudo
que aconteceu é sua culpa, pois ele viu quem Koba era e decidiu confiar nele
assim mesmo e não o impediu quando teve chance. Ele foi fiel à sua lei, mas nenhuma
lei é absoluta. Não existe nada absoluto na precariedade humana ou símia. Uma
lei ou norma deverá ser aplicada sempre em seu contexto apropriado, não serve
como panaceia para todas as circunstâncias.
Por fim, César
tem a oportunidade de confrontar o usurpador numa luta feroz pela alma e mando
do grupo. Um sangrento combate entre os dois acontece sob o olhar atônito dos
macacos. Koba, pendurado e prestes a cair, vê seu inimigo César se aproximar e,
para salvar-se, usa a regra de ouro: um macaco não mata outro macaco. Ele tenta
manipular César, criador da lei. Aparentemente César hesita: está diante de uma
decisão terrível e do olhar de todos os demais que poderão julgá-lo. Mas, um
líder uma hora enfrentará decisões difíceis. César chega a segurar a mão de
Koba, então lhe diz: mas você não é um macaco.
Para mim, este
é o ponto alto do filme. Koba quis mais uma vez usar a boa lei contra seu
criador, ele que não acreditava nela, como tantos entre nós que querem a boa
lei para atingir seus objetivos fanáticos, antidemocráticos, ditatoriais.
A história
está muito bem contada. O filme é um primor de efeitos especiais. Vale cada
minuto de projeção.
Nenhum comentário:
Postar um comentário