domingo, 8 de junho de 2014

A rã pocotó




Pesquisadores da UFRN (Universidade Federal do Rio Grande do Norte) descobriram uma nova espécie de anfíbio no bioma da caatinga do Nordeste do Brasil. A rã Pseudopaludicola pocoto é a 19º espécie de sapos bem pequenos que predominam na América do Sul (do norte da Argentina à Venezuela – leste dos Andes) do gênero das Pseudopaludicola.

Fonte: Aliny Gama (Do UOL, em Maceió – 06/06/2014)

Vamos lá, comecemos com um desafio. Repita o mais rápido que puder e bem audível: Pseudopaludicola pocoto. Você desconfia que esta tranqueira de palavras deve ser um nome científico de algum bicho esquisito. Muito bem. Trata-se de uma rã ou sapo – a reportagem não se definiu quanto a isso – recém-descoberta no estado do Rio Grande do Norte.
O anfíbio bizarro não mede mais que alguns milímetros e os machos, ao cantar para atrair as fêmeas, emitem um som parecido com o trote de um cavalo, donde o segundo nome pocotó. Apenas esta espécie canta desse jeito. Outros minúsculos aparentados cantam lá de sua maneira, explicou o pesquisador. Assim, cada qual fala sua própria língua e não há perigo, por parecidos que sejam, de alguém atrair quem não quer.
Pergunto-me se haverá, com um pouco mais de procura – e olha que os caras gastaram dois anos nesta marmotagem de caçar batráquios noite adentro – enfim, indago-me se não haverá ainda escondido entre moitas de muçambês, dormitando em mururus e aguapés, outros bichos igualmente espiclondríficos. Quem sabe uma rã que lata, outra que mie e, por que não, uma que fale, fanha ou gaga, com a língua presa ou que troque letras, tanto faz. Não me admiraria.
A Pseudopaludicola, por evidente, não se confunde com um equino ou asinino, tão comuns naquelas paragens. Basta olhar para a dita cuja. Cabe na ponta do dedo indicador. E não consta que conheça a música (?) eguinha pocotó para nela ter buscado inspiração. Mas se apenas se ouve, abstraindo que o chão não treme com as pocotozadas, ela sugere aquilo que não é. Verdade que é preciso um pouco de imaginação, pois o som é bem agudo. O que importa, no entanto, é a intenção de parecer-se com aquilo que não é, mesmo que seja fácil desmascará-la. Ela parece não se importar, pois no vídeo continua a cantar indiferente à luz e ao intruso humano.
Às vezes, sou sacudido pela desconfiança de que se vive a era de ouro da contrafação pessoal e comunitária. Suspeito que nosso país é assim mesmo, donde, por sermos nós que o fazemos, sermos por extensão, mimetismos ambulantes (que Raulzito me perdoe a triste paráfrase).
Cantamos nosso pocotó de cada dia, acreditando piamente que somos garbosos cavalos, mas assim como o cabelo da mulata não negava, por que era mulata na cor, nossa cara batráquia também não. Nem nossos agudos coachados, ainda que não nos importemos que nos vejam, atrás da sombra, chamando quem nos convém. A magia há de se quebrar uma hora, pois haverá um espírito de porco para nos chamar pelo nosso verdadeiro nome: Pseudoqualquercoisa.
Bom, vai ser meio difícil olhar no espelho de novo. A pele úmida, o olhar esbugalhado e uma louca vontade de comer a primeira mosca que esvoace à luz de nosso olhar vidrado, denunciará nossa natureza. O príncipe ou princesa propriamente ditos serão infinitamente menos atraentes e se perderá o doce sonho de que a um beijo, o sapinho se transforme desencantando. Antes o autoengano, agora a negação. Maldito intrometido pesquisador.

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