domingo, 25 de maio de 2014

Post Scriptum sobre o filme Praia do Futuro

A repercussão que o filme Praia do Futuro promove é muito menos por seus méritos – não no aspecto técnico: fotografia, luz, etc –, mas no tocante a ser uma história fascinante que desperte conversas entusiasmadas pelas ideias, lições ou qualquer outro rico ensinamento. Neste sentido, não diz nada de novo ou inteligente. É comum, quase banal. De fato, o filme passaria em brancas nuvens não fosse uma pessoa espezinhar-se com um pequeno incidente num cinema em João Pessoa (PB) que nem de longe questiona o filme propriamente dito e sua mensagem ou o que quer que queira discutir.
Como uma destas sortes que salvam uma lavoura perdida, seu diretor, produtora e personagem principal vivido pelo excelente ator Wagner Moura, se valeram da indignação – exagerada, diga-se – de uma pessoa para transformar o filme naquilo que ele, sozinho, nunca conseguiu: ser relevante.
Wagner chegou a postar uma foto com um cartazinho com os dizeres: “homofobia não é a nossa praia”. Homofobia onde, cara pálida? O fato é que absolutamente nenhuma manifestação que trate do tema gay – exceto o apoio irrestrito à sua causa – é vista com bons olhos. Imediatamente, é rotulado de homofóbico. Não importa se você apenas opinou sobre a cor do paetê do cara.
A produtora, Geórgia Costa Araújo, argumentou: “É claro que escancara (referia-se ao incidente do bilhete de cinema com a palavra “avisado”) a homofobia e o machismo destas pessoas, porque sexo heterossexual e nu feminino tem a rodo no cinema e na TV brasileira e ninguém fica indignado, assim como as cenas brutais de violência que invadem nossas mentes através das imagens de muitos filmes”.
O argumento da tal senhora é primário. Está na linha do despeitado “todo mundo faz, na hora que fazemos, somos criticados”. As relações heterossexuais, que equipara e coloca no mesmo saco, são coisas diferentes. Uma faz parte do natural e a outra se não é antinatural, posto que pessoas a praticam, está longe de ser a norma das relações sexuais, embora se defenda como tal. A relação homossexual sempre existiu e existirá, mas, à exceção de algumas culturas em que é admitida, sempre foi vivenciada num plano paralelo, nunca foi a norma, mesmo nas culturas em que esta vivência é aceita sem problemas.
Comparar às cenas de violência estética ou brutais (será que ela conhece Tarantino?), tampouco se presta para defender seu ponto de vista. Novamente a produtora se vale de uma coisa diferente para justificar seu filme. Mais honesto seria falar dele tal como ela o entende e percebe. Seu valor, digamos, intrínseco, seja lá a mensagem que esperava passar.
Logo em seguida a esta peroração chinfrim da Produtora, ainda em entrevista ao Blogay da Folha de S. Paulo, arrematou com outro argumento que padece de anemia lógica e de convencimento, mas que revela algo inesperado: “A relação do público com um filme é sempre imprevisível, e eu imaginava que poderia ter algum tipo de ação contra as cenas de sexo (que afinal são cenas de amor), mas a reação anti-homofobia foi o mais surpreendente”.
Uma traição à intenção que deveria se manter escondida. As cenas de sexo não são parte de um contexto ou até poderiam ser, mas a cor das tintas foi carregada com um propósito que não poderia ser mostrada em público. Estão lá para provocar algo nos assistentes e, assim, promover o filme de um jeito ou de outro.
O arremate é de uma pobreza argumentativa cavalar: o tal “afinal são cenas de amor”. O reducionismo é brutal. Toda cena de amor só pode ser traduzida desta forma? Cena de amor causa reações de repugna e urticária nas pessoas?
A tais cenas de amor de seu filme é uma licença – nem diria poética – da produtora. Há controvérsias, diria aquele personagem do Milani. Menos ainda taxar o incidente de reação anti-homofobia (queria dizer do tal que abespinhou-se e publicou o bilhete com o “avisado”), simplesmente porque não há nem de longe homofobia no ocorrido. Parece que pessoas como esta senhora padecem do mesmo mal dos esquerdistas: adoram dizer coisas que não ocorrem. Alucinam a suposta ameaça em sua mente tresvariada, intolerante, arrogante e que não admite o contraditório. Pior ainda, vendem o Brasil como se fosse mais grotesco que Uganda – país que recentemente criou uma lei nacional contra o homossexualismo – ou ainda a Rússia que tem uma política velada de perseguição aos gays e ainda mais o Irã que promove fátuas contra gays.
É importantíssimo dizer que o filme no festival de Berlim foi recebido de forma fria, havendo quem tenha saído durante sua exibição por causa das cenas de sexo. Será que os alemães, povo que está entre os mais liberais da Europa – há parques em que as pessoas ficam nuas para tomar sol em várias cidades – se sentiram provocados pelo portento brasileiro?  Questionado naquele momento, Wagner Moura disse que não se importava e descambou para falar asneiras sobre reações homofóbicas.
Quer dizer, lá na Alemanha o filme já foi visto de forma enviesada. Ninguém ousou dizer que os alemães são preconceituosos ou homofóbicos. Silenciaram ou deram de ombros, reação típica de contrariado. Eu entendo a decepção. Esperavam ser vistos como avançados, sofisticados e foram quase ignorados. Não consta que o filme francês “O azul é a cor mais quente” (2013), história lésbica e o “Hoje Eu Quero Voltar Sozinho” (2014) também brasileiro, apresentado no mesmo festival e de temática gay, tenham sofrido reação parecida do público.

Honestidade. É isso que está faltando aos envolvidos no filme. Admitir que o filme é ruim – a bilheteria que o diga – e que tentaram fazer algo bacana do seu ponto de vista, mas não funcionou. 

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