domingo, 23 de março de 2014

Meta o nariz onde não é chamado

NEW YORK (EUA) - Uma nova pesquisa comprovou que o nariz humano pode distinguir mais de um trilhão de combinações diferentes de cheiros - muitos mais do que os pesquisadores pensavam. Esse foi o resultado de um novo estudo realizado no “Laboratory of Neurogenetics and Behavior”, da “Rockefeller University”, nos Estados Unidos, liderado pelo cientista Andreas Keller.
Fonte: Globo Saúde (20/03/2014)
O número soa astronômico. Um seguido de doze zeros. Parece medir distâncias estelares ou dar dimensões de astros, borrifos de plasma do sol, velocidades estonteantes da luz. Mas revela apenas o que está literalmente diante de seu nariz. Melhor, dentro. As terminações nervosas aí enraizadas são capazes de perceber cerca de um trilhão de cheiros. Nada mal para um pedacinho tão pequeno do corpo.
A pergunta é: porque mesmo preciso saber que meu nariz, este mesmo um tanto avantajado, é capaz de cheirar tantas coisas? A pesquisa, pelo menos as versões dos releases em vários jornalões Brasil afora, não diz. Ao ler a reportagem, senti cheiro de certa inutilidade. Um pesquisador dizia que a mensagem era que nosso sentido de olfato é muito mais poderoso do que imaginava nossa vã filosofia. A pesquisa também se prestou para um tira-teima. Dizia-se por aí que se distinguia no máximo 10 mil cheiros. Ridículo, convenhamos. Tem gente que, sozinha, carrega muito mais do que isso, nem todos bons.
Fora algumas cirurgias desastradas – a Anita que o diga –, ou narizes-personagens como o do Pinóquio ou do Cyrano de Bergerac, esta não é uma parte do corpo muito destacada, especialmente nesta época de mulheres-fruta, cavalas e cachorras de tudo quanto é jeito. Se digo mulheres, não as discrimino, é que, parece, nos homens - até mesmo narizes de boxeadores ou mais modernamente, de brutos do vale-tudo - tem lá seu charme ou bolso cheio, sei lá. Enfim, pouco se fala que o sujeito é desacorçoado na beleza só por causa do nariz.
Quando se trata de sentidos, o olfato, em que pese sua enorme importância, a verdade é que é pouco decantado. Fora o esfregaço no nariz dados pelos esquimós entre si, como símbolo de afeto, ninguém sai beijando nariz por aí. Sim, fazem-se brincadeiras com crianças. Dizem até que um beijo no nariz é símbolo de traição. Essa é nova para mim. Judas nem pestanejou e beijou o rosto de Cristo para traí-lo de maneira infame.
A pesquisa, afinal, coloca o nariz noutro patamar entre os sentidos perceptivos básicos. O pesquisador faz comparações para provar: distinguimos no máximo 7,5 milhões de cores. Ouvimos até 340 mil tipos de sons. Calou-se justo sobre o paladar. Mas fui ao oráculo Google e descobri que há cinco sabores básicos: azedo, salgado, ácido, amargo e umami. Este último, prezado leitor, sugiro que você vá de novo ao esclarecedor de ignorância. E o paladar, muito mais decantado, depende do olfato. Retire-se o nariz do sujeito e acabou-se com ele o paladar. A experiência da gripe já ensinou isso a todo mundo.
A pesquisa sugere que ainda estamos bem em termos bem – evolutivamente – em termos de nariz. Mas alerta: estamos usando o nariz bem menos do que sua capacidade agora provada. Eis um desafio à imaginação. Formas de usar este potencial de cheiros. Ocorre-me campeonatos como o guitar air. Espalha-se o cheiro e quem acertar mais... Carteira de identidade pelo cheiro. Cartão de crédito com cheiro. Maquininha lê o cheiro para identificar o dono da conta. Só não vai botar dinheiro lá.
Que tal escolas para aprender a cheirar e desenvolver esta espécie de inteligência? No campo da criminalidade, de repente, como uma frenologia rediviva, se usaria o cheiro para identificar patifes e marginais em geral. Aposto que eles têm um odor característico. Relacionamentos. Só se começa uma relação depois de uma experiência odorífera. A pessoa captura o aroma e envia em porções como aquela de perfumes de amostra. Outras ciências ajudariam. Perfil psicológico a partir do eflúvio do ou da tal. No trabalho, haveria uma classificação de olores compatíveis para trabalhar na mesma área. Nem brigas, nem desavenças, só produtividade.

O que sei é que depois dessa pesquisa, tenho tido certo orgulho do meu nariz. Acho que o problema de Narciso foi o nariz. 

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