Dei-me conta, entre as semanas
finais de 2013 e o início do novo ano que vivemos na terra do nunca, nunca ou
em tradução literal, “país do nunca jamais”. Como naquele lugar imaginário,
também somos uma ilha num lugar que não está no mapa. A direção é em algum ponto
a partir da segunda estrela à direita que aparecer no céu noturno e então voar
até o amanhecer. É, literalmente, o fim do mundo, em todos os sentidos.
A Ilha do Nunca original está
povoada por Peter Pan, Sininho, índios sereias e o abominável Capitão Gancho e
seus piratas. Não nos esqueçamos de seu inimigo mortal, o crocodilo que lhe
comeu uma das mãos. Upaon Açu também, sendo uma ilha, está povoada pela
indinhada do povo, algumas poucas sereias que morreram afogadas em coliformes
fecais das praias, os meninos perdidos de Pedrinhas divididos em súcias
diversas, o capitão Ganchey e sua família pirata que manda e desmanda na ilha e
a bela e iracunda Sinhá Sininho. Falta-nos, por lástima, um Peter Pan em seu
sentido heroico, não em sua incapacidade de não querer crescer.
Dizem que o Peter Pan original manda
na Ilha e, em sua falta, Sininho quebra o galho. Nosso Pan anda por lugar
incerto e não sabido, telegrafa a Sinhá Sininho para que faça isso e aquilo:
posar para fotos, falar de cabelo, aviar na quitanda uns mil quilos de patinha
de caranguejo, lagosta, latinhas de caviar, champanhes diversos e outros
acepipes para lanches da tarde.
Capitão Ganchey e seus piratas,
de quem os meninos perdidos de Pedrinhas receberam aulas de etiqueta à mesa,
bons modos e urbanidade, é tutor de Sinhá Sininho quando o Pan desaparece por
completo, como é caso costumeiro. Mas ela é tinhosa e quase sempre quer fazer
as coisas do seu jeito. Dizem até que são aparentados, o que ela renega sempre
que pode frente às câmeras.
Por várias vezes, os meninos
perdidos de Pedrinhas andaram fazendo artes terríveis. Quando se desentendem,
são dados a esquartejar colegas e decapitá-los numa ensandecida forma de
controle de população em seu apinhado espaço. Sinhá Sininho, sempre que
acontece algo errado, promete mudanças e tal. Por exemplo, determinou que não
se venda mais gasolina à retalho aos meninos perdidos ou seus prepostos para que
eles nunca mais queimem nada. Um primor de medida.
Agora os meninos perdidos
resolveram exportar para fora das portas de sua latrina os ataques que
reservavam para os seus. Tocaram fogo em meio mundo, inclusive em uma garotinha
índia, alarmaram a indinhada, ordeira e pacífica quais jabutis e que só se
manifestam de vez em quando em carnaval de rua e requebrando ao redor de um boi
postiço do qual Sinhá Sininho é entusiasta dançarina e cantora.
Sinhá Sininho, que estava ocupada
com as compras de petiscos da culinária ligeira de seu castelo, ante o
pandemônio dos meninos perdidos de Pedrinhas, tomou-se de espanto e declarou
com a cara atônita: “estou revoltada!”. Depois, para dar mais veracidade a seus
sentimentos, disse: “Estou chocada! Como é que pode? Nós na terra do nunca,
nunquinha, somos ricos, abastados. Já sei! São os imigrantes das adjacências, é
muito menino perdido, tinha que dar em problema.” Com óculos de aro grosso e a
cara circunspecta, dedo em riste, para estupefação da indinhada, do subgerente
da gerentona do planeta do jamais nestepaiz, que veio lhe dar apoio, arrematou
que vai muito bem em sua administração.
O crocodilo comedor de mãos,
agora quer comer a Sinhá Sininho inteira e palitar os dentes com o gancho do
capitão. Ela está mais que apavorada, e logo pediu ajuda de parte dos índios e
dos piratas e do próprio capitão Ganchey que, na surdina, determinou ajuda
extra- ilha, o que já está acontecendo. A vinda de uma ave pernalta, enviado
pela Rainha de Copas, é prova disso. Sinhá Sininho insiste em fingir que os
meninos perdidos nem são da terra do nunca nunquinha. Inventou até que alguns
são filhotes do ET que na terra, viraram chupa-cabras horrendos.
A confusão tem sido tanta
que a ilha que ninguém sabe, foi notada mais uma vez pelo mundo externo como se
fosse um cometa que passa de século em século. A cada olhada que fazem por
telescópio, ficam horrorizados. A indinhada não se dá conta porque está
acostumada. Sinhá Sininho continuará tilintando pela ilha soltando purpurina. O
Pan local está dado como morto ou, esperto, sumiu porque sabia que a ilha do
nunca nunquinha estava prestes a viver seu apocalipse. É um covarde, mas pelo
menos não tem sangue de uma inocente nas mãos.
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