sábado, 11 de janeiro de 2014

Terra do Nunca, nunquinha



Dei-me conta, entre as semanas finais de 2013 e o início do novo ano que vivemos na terra do nunca, nunca ou em tradução literal, “país do nunca jamais”. Como naquele lugar imaginário, também somos uma ilha num lugar que não está no mapa. A direção é em algum ponto a partir da segunda estrela à direita que aparecer no céu noturno e então voar até o amanhecer. É, literalmente, o fim do mundo, em todos os sentidos.
A Ilha do Nunca original está povoada por Peter Pan, Sininho, índios sereias e o abominável Capitão Gancho e seus piratas. Não nos esqueçamos de seu inimigo mortal, o crocodilo que lhe comeu uma das mãos. Upaon Açu também, sendo uma ilha, está povoada pela indinhada do povo, algumas poucas sereias que morreram afogadas em coliformes fecais das praias, os meninos perdidos de Pedrinhas divididos em súcias diversas, o capitão Ganchey e sua família pirata que manda e desmanda na ilha e a bela e iracunda Sinhá Sininho. Falta-nos, por lástima, um Peter Pan em seu sentido heroico, não em sua incapacidade de não querer crescer.
Dizem que o Peter Pan original manda na Ilha e, em sua falta, Sininho quebra o galho. Nosso Pan anda por lugar incerto e não sabido, telegrafa a Sinhá Sininho para que faça isso e aquilo: posar para fotos, falar de cabelo, aviar na quitanda uns mil quilos de patinha de caranguejo, lagosta, latinhas de caviar, champanhes diversos e outros acepipes para lanches da tarde.
Capitão Ganchey e seus piratas, de quem os meninos perdidos de Pedrinhas receberam aulas de etiqueta à mesa, bons modos e urbanidade, é tutor de Sinhá Sininho quando o Pan desaparece por completo, como é caso costumeiro. Mas ela é tinhosa e quase sempre quer fazer as coisas do seu jeito. Dizem até que são aparentados, o que ela renega sempre que pode frente às câmeras.
Por várias vezes, os meninos perdidos de Pedrinhas andaram fazendo artes terríveis. Quando se desentendem, são dados a esquartejar colegas e decapitá-los numa ensandecida forma de controle de população em seu apinhado espaço. Sinhá Sininho, sempre que acontece algo errado, promete mudanças e tal. Por exemplo, determinou que não se venda mais gasolina à retalho aos meninos perdidos ou seus prepostos para que eles nunca mais queimem nada. Um primor de medida.  
Agora os meninos perdidos resolveram exportar para fora das portas de sua latrina os ataques que reservavam para os seus. Tocaram fogo em meio mundo, inclusive em uma garotinha índia, alarmaram a indinhada, ordeira e pacífica quais jabutis e que só se manifestam de vez em quando em carnaval de rua e requebrando ao redor de um boi postiço do qual Sinhá Sininho é entusiasta dançarina e cantora.
Sinhá Sininho, que estava ocupada com as compras de petiscos da culinária ligeira de seu castelo, ante o pandemônio dos meninos perdidos de Pedrinhas, tomou-se de espanto e declarou com a cara atônita: “estou revoltada!”. Depois, para dar mais veracidade a seus sentimentos, disse: “Estou chocada! Como é que pode? Nós na terra do nunca, nunquinha, somos ricos, abastados. Já sei! São os imigrantes das adjacências, é muito menino perdido, tinha que dar em problema.” Com óculos de aro grosso e a cara circunspecta, dedo em riste, para estupefação da indinhada, do subgerente da gerentona do planeta do jamais nestepaiz, que veio lhe dar apoio, arrematou que vai muito bem em sua administração.
O crocodilo comedor de mãos, agora quer comer a Sinhá Sininho inteira e palitar os dentes com o gancho do capitão. Ela está mais que apavorada, e logo pediu ajuda de parte dos índios e dos piratas e do próprio capitão Ganchey que, na surdina, determinou ajuda extra- ilha, o que já está acontecendo. A vinda de uma ave pernalta, enviado pela Rainha de Copas, é prova disso. Sinhá Sininho insiste em fingir que os meninos perdidos nem são da terra do nunca nunquinha. Inventou até que alguns são filhotes do ET que na terra, viraram chupa-cabras horrendos. 
A confusão tem sido tanta que a ilha que ninguém sabe, foi notada mais uma vez pelo mundo externo como se fosse um cometa que passa de século em século. A cada olhada que fazem por telescópio, ficam horrorizados. A indinhada não se dá conta porque está acostumada. Sinhá Sininho continuará tilintando pela ilha soltando purpurina. O Pan local está dado como morto ou, esperto, sumiu porque sabia que a ilha do nunca nunquinha estava prestes a viver seu apocalipse. É um covarde, mas pelo menos não tem sangue de uma inocente nas mãos.

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