segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

Até que o teste conjugal nos separe


Um exercício que demora apenas 21 minutos por ano é o bastante para evitar a queda da felicidade conjugal. Essa é a proposta de um estudo realizado pela Universidade Northwestern, nos Estados Unidos, que será publicado em breve no periódico Psychological Science. De acordo com a pesquisa, um simples exercício de escrita imparcial sobre as desavenças do casal, a ser realizado três vezes ao ano, pode ajudar a manter a satisfação em relação ao casamento.

Fonte: Veja (Comportamento 07/02/2013)

O casamento de Matilda estava por um fio. Nem boda de papel eles haviam completado. Aparentemente eles se gostavam, mas picuinhas, maus bofes e pirraças que trocavam de parte a parte estavam afundando o matrimônio. Peledrônio cutucava as unhas no sofá. Tirava meleca do nariz e grudava onde lhe desse na telha. Tinha também o péssimo hábito de cutucar os dentes com palito em qualquer lugar (como sinal de boa educação, ele colocava a mão em concha para esconder) e mastigava. Matilda deixava calcinha escorrendo no varal da toalha de rosto. Esmagava a pasta como se quisesse torturá-la e ainda deixava sem a tampa. Cada pequeno detalhe era motivo para desavença e dias sem se falar e sem mais nada, se me entendem.
A cama era um espaço de guerra particularmente acirrado. Disputavam o lado mais conveniente para cada qual. Roubavam o travesseiro de estimação do outro, se espalhavam de forma desembestada e os dois roncavam, mas culpavam um ao outro. Ele também falava mal da mãe dela e dos cunhados. Ela desancava a mãe dele como metida e excessivamente maternal com o filhinho da mainha. Nos dias de maior inspiração na maldade, ela sugeria até um suposto trejeito afeminado. Era o que mais tirava Peledrônio do sério, machista até a raiz dos cabelos e orgulhoso de sua macheza rocambolesca.
Matilda ficou sabendo de uma fórmula quase mágica para salvar aquele desastre ambulante no que se transformou seu casamento. Para sua surpresa, Pelé (apelido caseiro do indivíduo) topou. O especialista explicaria o que deveriam fazer numa reunião exploratória. Quer dizer, ali se estabeleceria o reconhecimento dos atritos, das querelas e o que mais fosse.
Diante do especialista, compenetrados, aguardavam as instruções. Havia quase um certo carinho entre eles. Muito bem, é tudo muito simples. A palavra “simples” despertou logo uma desconfiança nos dois, mas já que estavam ali... Basta uma folha de papel, uma caneta e vinte e um minutos... por ano. Sete minutos de cada vez. Cada um escreverá nesta folha sua visão, olhando como se fosse um estranho que quer o melhor para o casal. Pronto. O resultado deste exercício empático será a harmonia da família.
Descrever desavença era perigoso, no caso deles. Atiçava brigas velhas, algumas com cheiro de mofo, mas que Matilda sempre achava uma maneira de relembrar com a memória invejável que as mulheres têm para estes detalhes. Lembrem-se, alertou o especialista, descrevam como se fosse um casal amigo que querem ajudar.
Matilda começou a escrever com uma voracidade que dava medo. Pelé ficou olhando o papel e virando de um lado para o outro. A ansiedade começou porque o silêncio aumentava o barulho do cronômetro que tiquetaqueava como um cavalo trotando dentro de sua cabeça. Como um raio o tempo se fora, segundos diminuíam agora no mostrador. Matilda escrevia, escrevia. Rabiscava as últimas linhas do anverso da folha. Pelé, distraído, entregue a sua incapacidade de pensar qualquer coisa, rabiscou garatujas, escreveu o próprio nome, por fim, desenhou um bonequinho enforcado para retratar vividamente sua incapacidade.
Era hora de mostrar cada qual sua produção. Trocariam os papeis. Matilda, que estivera alheia ao drama do marido, tomou o papel dele nas mãos, ávida para ler. Antes que pensasse qualquer coisa, foi interpelada por Pelé que pedia os óculos para ler aquela letra horrível e minúscula, disse. Ela se voltou para o papel dele e nada vendo de significativo, deparou-se com o boneco enforcado. Ele espremia os olhos para ler. Ora afastava, ora aproximava da vista, já impaciente, mas entretido, pois esperava os óculos e resmungava que levaria três dias para ler aquilo tudo.
Ela explodiu. Que óculos? Sou tua mãe para andar te servindo? Tenho cara de ótica? E que desenho é este? Éééééé... Ele tentou explicar. Então é assim que tu te sentes em nosso casamento, enforcado? Rasgando o papel com ódio nos olhos. Pois olha aqui, estou cortando tua corda. Vai te assanhar com tuas galinhas no carnaval. Acabou a sessão.

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