O nome do artigo é “Idéias para um mundo pequeno”. O autor, articulista do The New York Times, avalia a tendência irreversível da diminuição do tamanho das coisas. A frase “menos é mais” tornou-se quase banal num mundo que se miniaturiza, desde que inventaram o transistor, há pouco mais de 60 anos. Não é estranho que a minimização dos aparatos eletrônicos atomizem todo o resto? Agora só se fala em nano-qualquer-coisa. Nano é um prefixo grego que significa excessiva pequenez, e no caso da tecnologia atual, dimensões moleculares.
Foi Mcluhan quem, em fins dos longínquos anos 60, vaticinou: o mundo havia se tornado uma aldeia global. Desde então, ele não para de encolher. Imagine que o sujeito espirra, atacado de gripe suína lá nos confins de Chiapas, no México, e em poucos dias a coisa ameaça virar pandemia. Efeito da facilidade e rapidez com que fazemos deslocamentos. Se o assunto são idéias, então, a coisa é ultra-rápida. A onipresente internete trata de, instantaneamente, espalhar o que for. Um efeito virulento, pode-se dizer.
Palavras estão ligadas a esta onda minimalista que se ampliou consideravelmente dos anos 90 para cá. Intuitivo. Quer dizer um equipamento qualquer que alguém pode usá-lo mesmo que não entenda bulhufas da tecnologia presente nele. Clean. Palavra inglesa que significa, entre outras coisas, limpo, enxuto, claro. Representa o lado estético desta nova forma de ser que abarca de comida a moradia; da fala a lojas; de carros a comunicação. A questão é que elas passam a definir também as pessoas e seu modo de vida.
No quesito comunicação, este fenômeno é evidente. O grande sucesso da rede é o facebook e o twitter. Microblogs, são chamados. Os textos não devem passar de 140 palavras. Mais que isso, simplesmente você não será lido. A comunicação pelo msn e assemelhados inventa novos idiomas, cuja marca é a supressão e transformação das palavras em não mais que três, quatro letras. Está nascendo o homo minimus.
Não discuto os efeitos benéficos da miniaturização, há muitos. Penso no que a filosofia por trás deste movimento está fazendo a nós, pessoas. A primeira coisa, é o que percebo, é a impaciência. Intrinsecamente ligado à pequenez está a instantaneidade. Ninguém quer perder tempo com o processo, logo, não à toa, o amadurecimento das pessoas está cada vez mais demorado, quando amadurecem. Estamos empanzinados de informações. Sabemos de tudo um pouco, mas sabemos pouquíssimo de cada parte do tudo. Não admira este permanente sentimento de deslocamento, um mundo fraturado em pedaços que não juntamos. De qual deles fazemos parte?
Por que uma das áreas econômicas que mais cresce no mundo é a área de prestação de serviços? Porque estamos sendo transformados em peças de engrenagens em um enorme sistema que nos consome. Terceirizamos para outros os cuidados e atenção para nós. Aqueles os entregarão prontos, supostamente personalizados. É um mundo delivery. Um paradigma administrativo desta nova era é que as empresas conheçam os hábitos do cliente para atendê-lo sob medida. Quer atender à norma da individualidade que supõe a qualidade daquele que é único, mas que se veste e come por atacado, conforme as marcas da moda se imponham.
Mas individualidade, como quer esta pós-modernidade, tem a ver com a estética de ser, que é tudo no que se resume um ser humano hoje, dividido em suas várias tribos urbanas. Já de pessoalidade, que tem a ver com valor, não se quer nem ouvir falar, pois esta evoca qualidades de ser que inclui a moralidade, a ética, o caráter. Nossa pessoalidade foi substituída pelos valores dados pelo meio: defender o meio-ambiente, ser politicamente correto nas relações, ser vegetariano conta pontos a mais, ser ambientalmente auto-sustentável, e abraçar uma árvore de vez em quando.
Não digo que estas coisas não tenham seu valor, mas apenas apelam para uma demanda da hora. Como valores que norteiem o mais íntimo do ser, são inócuas. Substituem aquilo que gritamos décadas atrás: contra a bomba H, as usinas atômicas, pelas revoluções socialistas. Cada qual, a seu modo, oferece um novo Éden. O que não se vê é que para chegar lá, construímos uma torre de Babel no caminho. A semente de nossa separação.
Quem é este homo mínimus? É acima de tudo um consumidor de produtos e idéias. Neste sentido, é um corpo-cérebro tatuado de etiquetas sejam das designer label (etiquetas de grife) ou de rótulos certificados. Ou se está num ou noutro. Este homem/mulher consome seu tempo em tornar-se útil para o sistema. Assim, ele vai cada vez mais longe na preparação acadêmica e ele mesmo se desconhece, é um inábil.
No resto do tempo que lhe resta, este homem/mulher é consumido pelas opções de lazer e distrações de toda sorte. Eis aqui a internete novamente como um imenso parque de diversões que cada dia fica mais virtual. Aliás, é neste mundo de bits que se pode projetar um avatar, não de si mesmo – às vezes por segurança, mas pode também ser por mau caratismo – porque como a maioria de nós está insatisfeita consigo mesma, a oferta é ser quem você quiser.
Perdeu-se, neste caminho, a idéia de caminhar, passo a passo, na construção de si mesmo. Isto é o que produz experiência e esta, amadurecimento e sabedoria. Faz parte o sofrimento – sem esta de pedir para afastar o cálice com um prozac –, a perda, o embate intra e inter-humano. Como cristão, não consigo ver onde se encaixa o novo homem, renascido pela fé – onde a perspectiva de um processo de desenvolvimento da salvação é parte natural –, pode ter lugar neste mundo. Se não tem, ele deve aceitar que é parte de um projeto de um reino de contracultura e deve aceitar as consequencias disso. Cabe lembrar Paulo e Fernando Pessoa (Ricardo Reis).
“Portanto, meus irmãos, por causa da grande misericórdia divina, peço que vocês se ofereçam completamente a Deus como um sacrifício vivo, dedicado ao seu serviço e agradável a ele. Esta é a verdadeira adoração que vocês devem oferecer a Deus. Não vivam como vivem as pessoas deste mundo, mas deixem que Deus os transforme por meio de uma completa mudança da mente de vocês. Assim, vocês conhecerão a vontade de Deus, isto é, aquilo que é bom, perfeito e agradável a ele.” (Rom. 12.1,2 – NTLH)
Para ser grande, sê inteiro: nada / Teu exagera ou exclui. / Sê todo em cada coisa. / Põe quanto és / No mínimo que fazes. / Assim em cada lago a lua / toda /Brilha, porque alta vive.
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