terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

Antes louca que falsária


Uma mulher na China decidiu engolir uma cédula falsa quando um vendedor percebeu que o dinheiro que ela usara para pagar por um artigo era falsificado, de acordo com o jornal chinês, China Daily.

O incidente ocorreu em uma loja de brinquedos no centro do município de Chongqing, onde ela tentou comprar um revólver de brinquedo por 15 yuans (o equivalente a cerca de US$ 2,20).

Fonte: China Daily

 

É o diabo do dragão da crise, pensou consigo mesma Mei-Xing. Demitida da fábrica de bruzundangas vendidas para meio mundo, de lança perfume a enfeites de natal, viu-se com outras colegas no meio da rua, assim, sem mais. Na china comunista, vejam a ironia, não há lei de proteção ao trabalhador. Mei-Xing achou-se com os 800 iuanes na mão (R$263,00), o último salário, sem proporcional de férias, décimo terceiro, multa de fgts e nem em sonho podia contar com alguma ajuda de um seguro-desemprego.

Já sabia de cor. Aqueles iuanesinhos durariam até 20,25 do mês e depois? Viera do campo como milhões de outros operários, mas era esperta e ambiciosa. Haveria de dar a volta por cima. O problema é que o senhorio do aluguel já lhe acossava com cobranças e a todo tempo lembrava-se de um colega que resolvera uns probleminhas com dinheiro falso e se oferecera para lhe quebrar um galho, caso precisasse.

Temia, mas a necessidade é bicha falsa para dar conselho. O governo ofereceu recompensa para quem denunciasse um falsário e endureceu as penas. De campo forçado por dez anos, já havia um zunzunzum de que, dependendo da quantia, o desditoso meliante receberia uma bala na nuca para deixar de ser atrevido e conspurcar a gloriosa efígie de Mao estampada nas notas. A lei ali é brutal. Nos interregnos do campeonato de futebol nacional, o governo costuma realizar nos estádios, eventos de eliminação por atacado de velhacos, patifes, bandidos e outros que tais, com a simpática mania de enviar à família a fatura pela bala gasta com tão imprestável criatura. Muito embora, por último, os clamores de algumas partes do mundo os tenha deixado um tanto tímidos com a coisa toda.

Mei-Xing encheu-se de coragem e procurou o colega trapaceiro. Ele disse que um fornecedor conhecido lhe arrumaria quanto quisesse. Comprarei um pouco para experimentar, uns 50 iuans, disse. Receosa, foi a uma lojinha num shopping, que estava às moscas, e tentou comprar um revólver de brinquedo só para testar. Talvez a nota não fosse de boa qualidade, e ela lá entendia disso. O fato é que o vendedor, tão logo passou a mão no dinheiro, desconfiou. De chofre gritou: É falsa!

Mei-Xing ficou como que passada. A primeira imagem que lhe veio foi como um fotograma borrado. Ela de joelhos, olhos vendados e um policial logo atrás com o cano do rifle apontado para sua nuca. Acordou do transe e, de imediato, tomou a nota das mãos do homem e engoliu. O tumulto chamou a atenção de outros vendedores que acorreram ao lugar enquanto o outro gritava que ela engolira a nota falsa. Pelejaram para lhe abrir a boca à força e apesar da tentação, ela não mordeu ninguém, pois aí é que a coisa pioraria.

Quando a polícia chegou, ela estava imobilizada num quartinho dos fundos da loja. Estava humilhada, mas viva e até com algum orgulho de sua esperteza. O policial lhe olhou com desdém e disse: vamos logo que você vai tomar laxante na delegacia. Você já tomou laxante chinês? Sabe de alguém que tenha tomado?

Levaram Mei-Xing que estava resignada pelo que lhe esperava. Muito bem, sua trapaceira inimiga da gloriosa revolução de nosso insigne libertador Mao e da República Popular da China, onde você falsificou a nota? E eu sou isso tudo? Pensou ela. Eu não falsifiquei nada. O homem fingiu que não ouviu. Onde estão seus amigos falsários? Eu achei esta notinha na rua. Por que você quis comprar justo um revólver? Não sabia dizer. Fora uma enorme mancada. Que burrice, tentar comprar um revólver que se parecia tanto com um de verdade.

Senhor Chong-Lin, eu sou a maior falsária da China. O revólver era para me proteger e aos meus companheiros. Devo ter falsificado alguns milhões de iuanes e meu objetivo é derrubar o governo. Comi o dinheiro porque me deu fome, eu tenho uma larica terrível quando fico nervosa. Não por medo, mas pela irritação de ver aquele homem berrando. Não foi, repito, para me livrar de nada é que, falo aqui para o senhor, segredo do negócio, tem cliente que quer um sabor nas notas, e a que eu tinha era de morango. Soube que usam em joguinhos sexuais, nem me pergunte como. Mesmo que sua excelência me dê o laxante, que estou pronta para tomar, não vai adiantar, não haverá prova de nada porque uso um papel vagabundo para ganhar um pouquinho mais no negócio, mas o desenho, ah, o senhor precisa ver que primor...  Ding-Dong, berrou o delegado ao auxiliar, entre estupefato e irado. Põe esta mulher pra fora daqui. Isto é uma louca!

Este texto foi publicado na coluna Eudes Alencar no Jornal Pequeno de São Luís-MA

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