“Olha o viagra, olha o veneno de rato”, grita um ambulante. Um Renault
Clio estacionado ao lado ostenta a seguinte frase escrita a giz em seu
para-brisa: “R$ 5.500, tudo ok, sem dívida, licença 2015”. Um vendedor
bem-humorado brinca com a fama do lugar: “Aqui é o Shopping Tranqueira: na
compra de uma porcaria, você leva outra”.
Fonte: Rodrigo Bertolotto, do UOL, em
São Paulo (02/04/2015)
“Olha o
viagra, olha o veneno pra rato!” Ouvir os dois produtos numa mesma frase é pra
fazer pensar. Não consigo colocar os dois na mesma prateleira sem imaginar que
estamos num mundo alternativo, em que o caos é a regra. Esse lugar é a cara do
Brasil. Chama-se “feira do rolo” e é nossa história improvisada, não como farsa,
mas como a repetição da realidade mesma.
E nem bem se
ouviu o homem gritar pelo duvidoso turbinador de sexualidade e já ali ao lado,
uma espécie de pet shop de esquisitices, outro sujeito vende jabutis,
camaleões, passarinhos que o Ibama adoraria soltar, coelhos – os únicos que
seriam legais, talvez, se não tivessem sido afanados de algum criatório.
Sempre me
pergunto o que leva uma pessoa a comprar um réptil. Não abanam o rabo, não
demonstram qualquer emoção. Alguém consegue imaginar uma cobra sorrindo? Um
calango dando saltinhos de alegria ao ver seu dono? Sequer conseguem reproduzir
o ar de indiferença que todo gato tem. Que pelo menos ronronam, o que nos dá a
leve sugestão que sua respiração asmática é alguma coisa para nós.
Outro dia, o
rapa apareceu por lá e, no corre-corre, os bichos têm que ser escondidos em
algum lugar. O vendedor dos jabutis – só para esclarecer, eram filhotes – não
teve dúvida, colocou alguns nos bolsos. Este tipo de sobrevivente não tem lá
muito tempo para coser aqueles indefectíveis buracos nos bolsos, fato que
literaliza sua condição de liso. Ganhou uma ação da Petrobras quem adivinhou. Um
jabutizinho foi parar nas proximidades da virilidade do pobre empreendedor e,
acho que por vingança, sapecou-lhe uma boa mordida. Podia ser fome, naquela
escuridão não dava para diferençar uma folha de alface da coisa lá do sujeito.
Ele se autodelatou, por suposto, foi preso.
Ah, e se você
desejasse fazer um pequeno assalto, mas lhe faltasse o instrumento de trabalho?
Ali se encontram réplicas paraguaias de armas ao lado de todo tipo de tralha,
inclusive peças de carro. Se o assalto,
furto ou roubo fosse à moda do Petrolão, aí teria que se filiar ao PT, de
preferência, subir na hierarquia ou enganchar-se num grão-vizir do partido que lhe
abriria as portas da esperança.
A feira do
rolo é uma grande recicladora. Um quebra-galho com seus produtos “originais”, “legítimos”
e com boas quilometragens de uso, o que prova sua durabilidade. Mas também se
encontram coisas novas de grife falsificadas. Sim, há produtos suspeitos que
entram de novo no mercado depois de terem sido gentilmente retirados de alguém.
E há tvs de tubo catódico, vídeo cassetes, celulares de antena e quebrados,
radiolas, e uma fauna de gente que, com a globalização, misturou ralés em
vários idiomas. Sotaques, pois todo mundo fala algum tipo de português.
E se
levássemos os políticos para fazer rolo com eles? Imagino que a Dilma seria uma
panela de pressão com a válvula quebrada e sem a borracha. Seus ministros seriam
a bateria em que estariam pendurado e ariados para dar um ar de qualidade:
caçarolas sem tampa, bules furados, frigideiras sem cabo, papeiros igualmente
sem cabos e amassados.
Renan seria
como um produto roubado, receptado e vendido por ínfima quantia de seu preço
original, mas com garantia total do vendedor. O Cunha seria um camaleão
daqueles que vivem em aquário, mas que seria apresentado dentro de uma caixa de
sapatos, sem o rabo e cego de um olho. A Câmara inteira seria de aparelhos
velhos, sucata, a serem vendidas pelo preço que fosse, mas antes com boa
discussão para regatear. O vendedor pediria muito por cada peça, mas no final,
com medo do encalhe, estaria vendendo dez por um real.
O Senado seria
a xepa dos bichos, galinhas disfarçadas de pavões para cenários de casamento de
periferia. Teriam uma ou outra pena do pavão propriamente dito que sobraram do
último carnaval. Coelhos pintados de chinchila. E nós, o povo, seríamos os
feirantes do rolo.
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