Um cachorro foi aposentado de seu posto de cão de guarda depois de dormir durante o único assalto ao pub onde trabalhou por 12 anos.
Os marginais levaram milhares de libras em álcool e dinheiro vivo enquanto Taz, o cão, dormia num canto do bar.
Fonte: G1, em São Paulo 15/09/2010
Cheguei do culto às sete da noite. Ando devagar e faço o trajeto, ida e volta, a pé. Veja você, depois de anos e anos trabalhando não tenho direito a um transporte. Sinceramente não entendo esta mania das pessoas de mudarem os nomes das coisas para amenizar seus sentidos. A explicação é que dizer certas coisas de forma direta pode ferir suscetibilidades. A velhice, por exemplo, da qual faço parte, chamam de melhor idade. Como é que pode ser melhor idade se ninguém quer ficar velho? Fazem de tudo para parecerem jovens e aí querem nos enganar com palavrório inútil.
É a velhice, desculpem. Começo uma história e emendo uma coisa na outra e daqui a pouco nem sei do que falava. Onde estava mesmo? Ah, sim, que cheguei às sete da noite no bar. Não tinha dito que era no bar? Esqueci. Acho bom explicar esta história de alguém que sai da igreja e vai direto para um bar. My job, diriam os americanos. Eu vigio o estabelecimento. Ah, também esqueci de dizer meu nome. Eu me chamo Taz. Não, não sou um diabo da Tasmânia.
Sou cachorro, com muito orgulho. O que faz um cachorro num culto? E cachorro não tem direito a falar com o Criador? Tem direito, sim, senhor. Também sou criatura. O clérigo não é um cachorro, é uma pastora. Não, não, não, é pastora alemã, é humana. Ouvi dizer que a igreja estava meio em baixa. Que houve uma reclamação de alguns párocos. Que reivindicaram a presença de seus melhores amigos ou não iriam mais à celebração. A pastora não teve jeito, agora até latir pode, dizem que é um canto sacro. Como é que eles sabem? Eu mesmo mais reclamo da liturgia e da pregação do que outra coisa.
Meu chefe não gosta de igreja, nem com liberação para os cachorros. E olha que agora tem o culto semanal: “Celebração da pata do animal de estimação”. Nossa relação é, digamos, profissional, donde não há muito espaço paras estas afetividades: lambidas de mãos, saltitos ao redor. Não gosto de fazer nem uma nem outra coisa.
Outra vez desviei do tema. Permita-me que acabe a história toda, por favor. Sem mais perguntas. Trabalhei doze longos anos como vigia. Isso dá em idade humana 64 anos. Quando iniciei tinha dois anos, um jovem de 26 anos apenas, se fosse humano. O tempo cobra seu preço. Estou meio cego e surdo. Será que ele não via que eu precisava me aposentar? Viu, sim. Acontece que não queria despesas com funcionário novo. Come mais. Exige passeios para se manter em forma.
Quando dei por mim, estava despedido, no meio da rua. Então o que sei é que noite destas, entraram no bar reviraram tudo. Roubaram quase todas as garrafas. Uísque doze anos e mais não ficou um pra remédio. Vinhos. As melhores vodcas. Cachaças brasileiras das melhores. Um destrambelho só. De quebra, fizeram um raspa no caixa. Onde eu estava? No bar. Dormindo. Não tenho do que me envergonhar. Sou velho. Fui acordado por um cutucão do bico do sapato do dono do bar. Até hoje estou de costela dolorida.
A ingratidão humana não tem limite. E quantas vezes não defendi com perigo de vida aquela espelunca com a qual ele alimentou a família toda? Isso não conta? E não tinha essa de feriado, dia santo, pois justamente nestes dias havia mais gente no bar. Nunca saí da linha. Quer dizer, mordi um bêbado que me pisou o rabo. Em minha defesa digo. Ele o fez de propósito.
Acho que vou me candidatar para vigiar a igreja. Com minha experiência posso guardar até a porta do Éden. Ah, já tem? Tudo bem, eu acompanho o anjo.
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